Catarina olhava, perplexa, o marido dançando. Há muito não o via tão alegre. Só não entendia a razão dos pulos e o sorriso maroto no rosto. Nem bater à porta, como fazia sempre, ele teve essa preocupação. Segurando um papel na mão, Ezequiel rodopiava pelo quarto do casal. Curiosa, a mulher suspendeu a leitura do livro, indagando.
– Posso saber a razão de tamanha felicidade?
– Eu vivia dizendo, mas você não acreditava em mim.
– Dá pra ser mais explícito, criatura.
– Que peidar faz bem ao amor.
– Melhor parar por aí com essa besteira.
– Agora são os cientistas que estão afirmando, não eu.
– Como é que é?
– Que casais que peidam na frente um do outro são mais felizes.
A fim de convencê-la, Ezequiel fez questão de ler a matéria, em voz alta, para a esposa ouvir. O site MIC, de grande credibilidade no mundo, acabara de publicar uma pesquisa com essas informações. Incrédula, ela balançava a cabeça, em sinal de protesto, sem querer acreditar nos dados apresentados.
– E dizem mais, amore.
– Sou toda ouvidos.
– Que soltar pum torna mais duradouro os relacionamentos amorosos.
– Não vai querer que eu acredite nessa bobagem.
– Foram anos de pesquisa envolvendo milhares de casais.
– E eu com isso?
– Que tal gesto mostra intimidade, aceitação e verdade.
– Eguagens de quem não tem o que inventar.
Incomodada com o teor da conversa, Catarina sabia muito bem o que se passava pela cabeça do marido. A liberação dos gases, agora respaldada pela pesquisa, lhe permitia soltar flatulências à vontade, onde e na hora que bem desejasse. Entre outras, essa era uma das causas de briga frequente dos pombinhos, já casados há cinco anos.
– Tá querendo o que, seja sincero, ao trazer tal notícia?
– Que você deixe de implicar com meus peidos.
– Tudo bem, desde que os libere fora do apartamento.
– Mas os gases são livres, têm vida própria.
– Ou, então, quando eu não estiver por perto.
– Pelo visto, minha lindinha não entendeu o espírito da pesquisa.
– Não entendi e não quero entender.
– Custa deixar nosso amor ser embalado por esses ventos sagrados?
Nessa hora, Catarina quase perdeu a estribeira, mas achou prudente se conter. A vontade era dizer umas boas para ele, que tivesse educação e, acima de tudo, respeito à mulher que o escolheu como marido. Não bastasse isso, Ezequiel tinha o “fato” podre, empestando todos os cantos do ap., inclusive o quarto onde dormiam e ocorria o reboliço das ancas.
– Você não tem vergonha de peidar tanto?
– De forma nenhuma, até por ser um ato natural.
– Só se for pra você...
– Existe outra razão também, confesso.
– Desembucha, então.
– Por ser um autêntico revolucionário.
– Como assim?
– De não gostar de ver nada preso.
– Essa é boa, dá vontade de rir.
– Prezo muito a liberdade, incluindo a dos puns.
O caldo só entortou quando Ezequiel, na maior cara de pau, disse que não custava nada eles tentarem. Talvez os cientistas tivessem razão. Que sentir as bufas da mulher, caso ela topasse, era um dos seus fetiches sexuais. Quanto mais fedorentas, o tesão seria maior. De sua parte, havia saboreado no almoço, para noite tão especial com a patroa, uns deliciosos pequis. Ao ouvir o nome da fruta, Catarina disparou: “vai peidar longe daqui, carniça”.