
“Morreu quem não poderia ter morrido”. A frase foi dita em uma roda de amigos há 40 anos, na noite de 21 de abril de 1985, em uma praça na cidade de Felixlândia, município da região Central de Minas Gerais a 180 km de Belo Horizonte. O comentário foi ouvido por este repórter em sua pré-adolescência, mas poderia ter partido de qualquer lugar do Brasil naquele momento.
A morte era a do presidente eleito Tancredo Neves (PMDB), ocorrida após 39 dias de internação hospitalar, parte em Brasília, parte em São Paulo, decorrente do que acreditou-se inicialmente ser uma diverticulite, inflamação em pequenas bolsas, chamadas “divertículos”, que se formam no intestino grosso.
Em seguida, apurações mostraram que tratava de um leiomioma, um tumor benigno, mas infectado, no intestino. Vinte anos depois, em 2005, o corpo médico do Hospital de Base de Brasília, onde Tancredo foi internado inicialmente, afirmou não ter revelado, à época, o laudo correto do quadro do então presidente. Em São Paulo, onde morreu, foi tratado no Instituto do Coração. Em seu lugar assumiu José Sarney.
A comoção nacional causada pela morte de Tancredo deu-se – para além da questão dos problemas de saúde enfrentados por um senhor de 75 anos – pelo momento que o país atravessava. O Brasil teria, enfim, um presidente civil após 21 anos de ditadura militar. Tancredo havia sido eleito presidente em 15 de janeiro de 1985 em um eleição indireta, ou seja, na qual votaram apenas integrantes do Congresso Nacional à época e delegados eleitos nas Assembleias Legislativas dos Estados. Antes, um grande movimento pelas Diretas Já havia tomado conta do país, chegando a reunir 1,5 milhão de pessoas no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, no dia 16 de abril de 1984.
A pressão popular, no entanto, não fez efeito em meio aos militares, que articularam para evitar a aprovação da chamada “emenda constitucional Dante de Oliveira” na Câmara dos Deputados. O texto, apresentado pelo parlamentar que lhe dava o nome, restabelecia as eleições diretas no país. A emenda foi votada e derrotada em 24 de abril de 1984, uma semana, portanto, após o comício do 1,5 milhão.
A partir desse resultado, passou-se a articular a eleição indireta, que ao final teve Tancredo, candidato pelo PMDB, contra Paulo Maluf (PDS), empresário e ex-prefeito de São Paulo. À época, o país era governado pelo general João Baptista Figueiredo. Maluf era o candidato considerado do regime. Tancredo, apesar de integrar um partido refratário aos militares, tinha trânsito entre os generais.
O candidato do PMDB venceu a eleição com 480 votos, contra 180 de Maluf. Houve 26 abstenções. A posse estava marcada para 15 de março de 1985. O presidente eleito fez uma viagem internacional e, na volta, começou a anunciar seus ministros. Nesse período, começou a sentir dores abdominais e acabou sendo internado na véspera da posse, em 14 de março.
Tancredo Neves, o presidente que não tomou posse
Fonte: O Tempo/MG