Especiais

B-R-O-BRÓ: por que ocorre o fenômeno e o que fazer para conviver melhor com o calor

Segundo estudiosos do clima, Teresina é a segunda capital mais quente do país, ficando atrás somente Boa Vista, em Roraima

Equipe do Piauí Hoje

Domingo - 20/10/2019 às 15:00



Foto: Lucas Mota/Piauí Hoje Teresina enfrenta altas temperaturas no BR-O-BRÓ
Teresina enfrenta altas temperaturas no BR-O-BRÓ

B-R-O-BRÓ, a sigla faz menção aos quatro últimos meses do ano terminados em  "bro" (setembro, outubro, novembro e dezembro). Nesse período, a temperatura sobe, a sensação térmica aumenta, o sol castiga os piauienses, as queimadas deterioram as paisagens naturais e as oscilações nas redes de energia elétrica se tornam constantes com maior uso de ventiladores e ar-condicionado nas residências.

Para entendermos melhor esse fenômeno, a equipe do Piauihoje.com conversou com a doutora , Suzete Sousa, professora de Geografia da Universidade Estadual do Piauí. Ela é climatologista e explica que o Piauí possui uma sazonalidade que se altera entre maiores ocorrências de chuva e/ou maior elevação da temperatura.

Com isso, entende-se que é durante o B-R-O-BRÓ que uma massa de ar equatorial continental estaciona sobre a atmosfera do Piauí e, em decorrência desse fenômeno se observa a falta de chuvas no estado exatamente nesse período. “No Piauí temos dois regimes de condição climática, um está relacionado a ocorrência de chuva, o outro a elevação de temperatura ou ocorrência de um período mais seco, conhecido como B-R-O-BRÓ, em relação aos meses mais secos, ou seja, quando a umidade relativa do ar está mais baixa”, explica.

O período seco é uma condição da ‘tropicalidade’ do Piauí. “Essa época se estende por mais meses, o chuvoso que é o que está relacionado com o verão, ou seja, o recebimento de ventos úmidos que vem do atlântico sul e que vai ocasionar chuva no território piauiense devido a chegada desses ventos. Já no período seco, o sistema atmosférico não propicia a circulação de umidade exatamente porque a atmosfera está seca, então é o sistema de massa de ar que vai definir essa baixa umidade relativa do ar, causando efeitos na biodiversidade”, conta.

De acordo com a pesquisadora, a condição climática do segundo semestre provoca efeitos drásticos para a vida geral no Piauí, seja para a fauna, seja para a flora, seja para a população.  “Para os seres humanos, temos o desconforto térmico e essa baixa umidade do ar vai trazer efeitos para a saúde humana no sentido de ter problemas respiratórios e tantos outros”, avalia.

Conforme esclarece a professora Suzete, a atmosfera seca e árida é propícia para o alastramento de queimadas no Piauí. “Temos o fogo como resultado da própria combustão que ocorre na vegetação, contudo, o que a gente mais observa nas estatísticas são queimadas provocadas pelo homem que não se sensibiliza e que provoca incêndios de forma intencional”, analisa.

Sousa ainda relata uma curiosidade. “Na vegetação, a gente observa a perda de folhas das plantas, isso ocorre no cerrado piauiense, as plantas perdem parte das folhas, é uma característica da vegetação do tipo caducifólia e subcaducifólia, perde totalmente ou perde parte da folhagem, esse também é um efeito causado por conta dessa sazonalidade”, esclarece.

Quem também sofre com a baixa umidade do ar e o período seco no Piauí são os rios, em especial os rios Parnaíba e Poti. “O regime dos rios também traz uma consequência fluvial, ou seja, os cursos d’água tem o seu leito diminuído e a gente pode listar como consequência desse período de seca”, aponta.

Foto: Lucas Mota

A segunda capital mais quente do Brasil

Teresina está localizada em um território entre rios – Mesopotâmia brasileira –, isso contribui para a manutenção da umidade. A cidade também está em uma região próxima a linha do Equador, que é a faixa de maior insolação na superfície do planeta. Além disso, a região da capital do Piauí, que é conhecida também como Chapada do Corisco, está situada a uma altitude de 60 metros acima do nível do mar, uma situação de grande influência no ciclo dos ventos.

Teresina é a segunda capital mais quente do país, ficando atrás somente Boa Vista, em Roraima. Com o desmatamento a situação piora e o desenvolvimento da cidade também favorece o desequilíbrio climático. A presença de grandes estruturas de concreto, a poluição (queimadas), falta de conservação da vegetação nativa e dos rios, a expansão imobiliária e a falta de ações educativas para uma vida sustentável, são fatores de grande impacto na qualidade de vida da população, que a cada dia enfrenta períodos mais quentes e secos.

Sabe-se que as árvores são de grande utilidade para a manutenção de um ambiente saudável, além de dar sombra, elas conseguem baixar a temperatura em torno de quatro graus, ajudam no controle da umidade e dos ventos. É preciso ações para recuperar a arborização da cidade que possui o título de cidade verde. Teresina aparentemente não segue um desenvolvimento a partir de sua realidade climática, o que há são soluções inspiradas em outros locais que geralmente não dispõem de questões ligadas a altas temperaturas. Exemplo disso são as grandes estruturas metálicas e/ou concreto expostas, uso constante de asfalto e projetos que dificultam o uso de luz e ventilação naturais.

A modernização contribuiu para a grande presença de veículos automotores, há congestionamentos, poluição, a necessidade de reestruturar e abrir novas vias de acesso tirou o lugar da vegetação. E a tendência é piorar. Teresina não investe em redes de transporte público eficiente, cabe às pessoas agir como podem, ou seja, ter seu transporte próprio.

A cidade se transforma

Teresina vem sofrendo um processo de verticalização ao longo dos anos. Locais que abrigavam grandes residências, muitas com quintais cheios de árvores, deram lugar a prédios e condomínios. A expansão da cidade para zonas periféricas revela os problemas estruturais, de saneamento, serviços e do clima. Paisagens “carecas” estão se tornando comum; aparentemente não há preocupação com os efeitos negativos nas regiões a longo prazo, só lembram quando chega o período do B-R- O BRÓ. Segundo a arquiteta Flávia Lopes, “Problemas ambientais tais como: ilhas de calor, enchentes, inundações, impermeabilização dos solos, desmatamentos e problemas referentes ao saneamento básico, tem contribuído para a diminuição da qualidade de vida de boa parte dos habitantes”, revelou.

A arquiteta explica que a expansão urbana, que tem se caracterizado em Teresina nas últimas décadas, tem contribuído para o aumento dos seus problemas socioambientais urbanos, uma vez que o atendimento dos serviços urbanos nem sempre vem acompanhando esse crescimento. “Esse crescimento se caracteriza sob duas formas opostas: uma, pela expansão da periferia, incorporando o espaço urbano por uma população de baixa renda, que ocupa grandes áreas vazias; e a outra, pelo crescimento vertical em edifícios de alto padrão, nos bairros mais valorizados da cidade, dotados pelo poder público com equipamentos urbanos de qualidade, e quantidade, diferenciadas (iluminação, asfaltamento, rede de esgoto)”, explicou.

Foto: Lucas MotaFlávia ainda complementa; “A cidade, que já recebeu o título de ‘cidade verde’, hoje dizem que já não o merece mais. Apesar da quantidade de praças (nem sempre arborizadas) e parques públicos, o crescimento do espaço verde público não acompanhou o ritmo do crescimento urbano. Mas ainda nos restam lugares sob preservação, como a floresta fóssil, o zoobotânico, parque da cidade, as encostas dos rios, entre outros”, detalhou.

“Essa redução relativa do verde, associada a uma distribuição (crescimento) desenfreado de construções, certamente contribui para o aumento da temperatura na região que já possui um clima tropical. A presença da vegetação de forma planejada, isso envolve quantidade, variedade e distribuição espacial adequada em toda a cidade, provavelmente possibilitaria maior conforto térmico, redução da poluição do ar e do consumo de energia, além de proporcionar uma composição paisagística, eleva a autoestima da população”, finalizou Flávia Lopes.

Incidência de raios solares prejudicam a saúde

Os efeitos da alta incidência de raios solares são muito prejudiciais à saúde. Especialistas advertem a necessidade de proteção adequada. Há o risco de doenças de pele e de olhos, tipo queimaduras, câncer de pele, catarata, lesões nos olhos, problemas respiratórios, alergias, etc.

Devido a grande insolação desse período, as atividades ao ar livre só são recomendadas antes de 10 h e depois de 16 h. A temperatura diminui ao entardecer e as pessoas podem aproveitar ambiente com menos incômodos de calor. No dia a dia todo mundo se protege como pode, uso de roupas longas e leves para proteger a pele do sol e não ficar com tanto calor, usar a sombra dos postes e árvores (ou de qualquer objeto estático) enquanto aguarda a chegada do ônibus (que costuma demorar), estacionar debaixo de árvores, uso de “sombrinhas”, leques e óculos de sol.

Nesse período, as atividades realizadas ao ar livre devem ser feitas no horário de menor incidência solar, evitando a faixa de 10 h às 16 h. A radiação solar incide com mais intensidade sobre a Terra, aumentando o risco de queimaduras, câncer da pele e outros problemas. Por isso, não podemos deixar a fotoproteção de lado. Veja a seguir dicas para aproveitar a estação mais quente do ano sem colocar a saúde em risco.

Segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), é necessário o uso do filtro solar, além de chapéus e roupas de algodão nas atividades ao ar livre, pois eles bloqueiam a maior parte da radiação UV. Tecidos sintéticos, como o nylon, bloqueiam apenas 30%. Outro objeto que tem extrema importância são os óculos de sol, que previnem catarata e outras lesões nos olhos – porém cuidado com os óculos falsificados; eles são prejudiciais para os olhos.

A SDB enfatiza que o filtro solar deve ser aplicado diariamente, e não somente nos momentos de lazer. Os produtos com fator de proteção solar (FPS) 30, ou superior, são recomendados para uso diário e também para a exposição mais longa ao sol (praia, piscina, pesca etc.). Deve-se aplicar o produto 30 minutos antes da exposição solar, para que a pele o absorva, e reaplicá-lo a cada duas horas. Porém, atenção, esse tempo diminui se houver transpiração excessiva ou se entrar na água. E é importante também proteger as cicatrizes, especialmente as novas, que podem ficar escuras se expostas ao Sol.Final de tarde em Teresina/Foto: Alinny Maria

Presos sofrem com as altas temperaturas 

Trancados em um cubico com várias pessoas desconhecidas. O teto é de laje e não há ventiladores. O calor é excessivo e as condições de higiene são precárias. Essa é a vida de quem vive encarcerado no Piauí.

O Sistema Penitenciário do Brasil é um assunto bastante delicado por causa de suas deficiências. A superlotação das celas é o principal problema que acomete os presídios brasileiros. No Piauí, os presos sofrem ainda mais com o calor excessivo no período do B-R-O-BRÓ. Não há nenhum tipo de ação que ajude a amenizar o calor os detentos nesta época.

Os presos sob custódia ficam aglomerados em celas pequenas na Penitenciária Professor José Ribamar Leite, antiga Casa de Custódia de Teresina. De acordo com dados do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Piauí (Sinpoljuspi), a penitenciária tem capacidade para 330 presos e atualmente tem 1.200. O Pavilhão B tem capacidade para oito presos e abriga 30, segundo o sindicato.Lotação na Casa de Custódia de Teresina/Foto: Autoria desconhecida 

A situação da Penitenciária Mista de Parnaíba é ainda pior em relação a esses números. Ainda de acordo com o Sinpoljuspi, a penitenciária tem capacidade para 120 ou 130 presos e abriga mais de 600. A cela que seria para oito presos, abriga 40.  

“Os presídios são de laje, principalmente a Custódia. Se o calor já é insuportável para nós que estamos aqui fora e imagina para eles que estão lá dentro e aglomerados”, disse Jefferson Dias, diretor do Sinpoljuspi.

O sindicato ressaltou que esse número irá diminuir porque com a nova Cadeia Pública de Altos, está havendo a transferência de presos aos poucos.  A nova penitenciária tem capacidade para 603 detentos e as vagas são disponibilizadas para presos provisórios de todo o Piauí. O estado possui 5 mil detentos para 2.400 vagas e mesmo com o novo presídio, a superlotação vai continuar.

Como cuidar da saúde no BR-O-BRÓ

 Beber água já é de extrema importância para o ser humano, mas esta prática deve ser redobrada no período do BR-O-BRÓ. Isso porque a água ajuda a regular a temperatura corporal e no funcionamento dos órgãos, ela elimina toxinas, ajuda na lubrificação de mucosas e age como um veículo de transporte de nutrientes.

No BR-O-BRÓ, o calor aperta e é necessário caprichar na ingestão de água. Para completar a hidratação nestes dias quentes, vale um passeio ao ar livre, incluir no lanche frutas refrescantes como laranja, melancia, abacaxi, que tem alto teor de água. Sucos de fruta também é uma ótima opção, além do picolé caseiro.

O BR-O-BRÓ não é só calor, mas também é tempo seco e baixa umidade relativa do ar. Isso traz uma série de problemas que podem afetar a saúde de muita gente. Essa combinação associada ainda de fumaça proveniente das queimadas, deixa o corpo suscetível a doenças, principalmente, as que afetam o aparelho respiratório. Em Teresina, há um grande número de pacientes com asma, bronquite, gripes e resfriados, que são frequentes nessa época do ano.

O bom nisso é que existem medidas simples podem diminuir os efeitos adversos do clima árido no organismo. A autônoma Maria de Sousa conta que todos os anos é a mesma coisa: dificuldade para respirar, tosse seca e o nariz sangra. “Sempre que chega setembro eu passo por isso, ataca a sinusite, renite, tosse alérgica causada por fumaça. Para mim é um sofrimento, mas aprendi a conviver”, diz Maria.

Somente neste ano, Maria resolveu se consultar com um médico e está reagindo bem ao tratamento. “São coisas simples e que me ajudaram bastante. Eu estou usando um soro no nariz que é para hidratar a mucosa nasal e me ajuda a respirar melhor. Deixo os ambientes mais umidificados, principalmente na hora de dormir. Quem não puder ter um umidificador de ar, basta colocar um balde ou bacia com água dentro do quarto”.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a umidade do ar abaixo dos 30% traz riscos para saúde. O ideal é que ela fique entre 50% e 80%. No período do BR-O-BRÓ, a umidade do ar fica em torno de 20%.

Além dos problemas respiratórios, o coração também sofre porque há uma elevação da pressão arterial. Com isso, há uma possibilidade maior de ocorrência de infarto e acidente vascular cerebral (AVC).

De acordo com o Ministério da Saúde, alguns cuidados simples devem ser tomados para evitar complicações. Medidas como beber dois litros de água por dia, evitar atividades físicas das 9h às 17h e lavar o nariz com soro fisiológico são eficazes. Deixar um umidificador de ar ligado no ambiente ou uma bacia cheia de água ajuda o ar a ficar mais úmido, o que facilita a respiração.

Cuidados com a pele

A Sociedade Brasileira de Dermatologia deu dicas de como cuidar da pele no período quente. Em crianças, inicia-se o uso do filtro solar a partir dos seis meses de idade, utilizando um protetor adequado para a pele que é mais sensível. Recomenda-se buscar orientação com pediatra ou dermatologista sobre qual o melhor produto para cada caso. É preciso que crianças e jovens criem o hábito de usar o protetor solar diariamente.

Pessoas de pele negra têm uma proteção “natural”, pela maior quantidade de melanina produzida, mas não podem se esquecer da fotoproteção, pois também estão sujeitas a queimaduras, câncer da pele e outros problemas. Assim como as pessoas de pele mais clara, precisam usar filtro solar, roupas e acessórios apropriados diariamente.

As temperaturas mais quentes exigem hidratação redobrada, por dentro e por fora. Portanto, deve-se aumentar a ingestão de líquidos no verão e abusar da água, do suco de frutas e da água de coco. Todos os dias, aplicar um bom hidratante, que ajuda a manter a quantidade adequada de água na pele.

Alguns alimentos podem ajudar na prevenção aos danos que o sol causa à pele, como cenoura, abóbora, mamão, maçã e beterraba, pois contêm carotenoides, substância que se deposita na pele e tem importante ação antioxidante. Ela é encontrada em frutas e em legumes de cor alaranjada ou vermelha.

No verão estamos mais dispostos a comer de forma mais saudável, ingerindo carnes grelhadas, alimentos crus e cozidos; frutas e legumes com alto teor de água e fibras e baixo de carboidratos. Apostar nesses alimentos ajuda na hidratação do corpo, previne doenças e adia os sinais do envelhecimento.

No banho, recomenda-se usar sabonetes compatíveis com o tipo de pele, porém, sem excesso. A temperatura da água deve ser fria ou morna, para evitar o ressecamento.

Altas temperaturas

De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), nos próximos dias o Piauí continuará a sofrer com as altas temperaturas. A média é de 39ºC e a mínima de 21ºC. A Umidade do ar fica em torno de 20%. 

Print do site do INMET

Fonte: Valciãn Calixto, Lucas Mota e Alinny Maria

Siga nas redes sociais

Compartilhe essa notícia: