Os fazeres mais caseiros da sessentena me levaram ao contato com alguns episódios da série televisiva Malhação, nos fins de tarde, notabilizada por tematizar expressões da vida e Juventude.
Vi, nestas semanas, em alguns deles, uma discussão sobre concepções e práticas educativas, escolares, as quais me fizeram recordar uma escola em que estudei, na adolescência.
O tema é o do significado essencial do ato educativo escolar e até que ponto as escolas podem encaminhar a experiência pessoal de seus estudantes. Até que ponto os aprendendos são autônomos para exercer escolhas.
No caso em foco – questão central –, discute-se o sentido disciplinador da escola. Parte dos estudantes de uma delas – escola do que se chama de classe média –, rebela-se contra a colocação de catraca para controlar entradas e saídas deles.
A medida foi adotada porque alguns deles andaram “fugindo”, “matando” ou “gazeando” aulas... Pais reclamaram para a direção. Aliás, nessa ficção, uma líder anticatraquista é justamente a filha do dono e diretor da escola.
Agitação danada no ambiente escolar, apitaço e anúncio de possível “greve”. Tudo é abalado: logo vem a Assembleia de Pais e Mestres, que não faz consenso. Mulher do diretor-dono e mãe da líder estudantil quer se separar do marido-dono, que namora coordenadora.
Pois na cidade de Colinas, Maranhão, anos de 1960 – já tratamos disso aqui –, um padre educador, José Manuel de Macedo Costa, liderou processo de ruptura nas práticas educativas tradicionais e um dos pontos era justamente a liberação do portão controlador.
Macedo idealizou e levou à pratica uma experiência em que a “disciplina” no ambiente escolar assumira um modo de construção consciente do eu coletivo escolar. Para começar, abria-se o portão para estudantes acessarem na hora que escolhessem.
Hora que quisessem? Não, hora que escolhessem. A diferença? O estudante tinha que exercer, verdadeiramente, uma escolha, entre ingressar para aulas, ou não, sabendo que faltar a elas levaria a uma declaração certa de reprovação.
Os pais, a maioria gente trabalhadora, muitos da roça e afins – aristocracia colinense não era tão extensa –, ensaiou grande revolta. Diziam que aquela “liberdade” que o padre estava dando tirava-lhes a tranquilidade sobre o que faziam seus filhos.
Enorme foi o esforço de Macedo, e sua pedagogicamente preparada equipe, em convencer o coletivo de Pais e Mestres do acerto da mudança que reconheceu nos jovens o direito de fazer a referida escolha.
E o argumento deles era exatamente os dos pais, em Malhação: como vou confiar na escolha de meu filho jovem ir à escola ou fazer outra coisa no horário? Em Colinas era o pavor de que fossem tomar banho no rio; havia mais.
Com muita dificuldade, mas fora uma imensurável vitória do padre no projeto inovador: colocar pais e professores no Auditório escolar e passar horas e dias discutindo o problema e outros que eram parte do seu repertório de mudanças.
O fim das “provas”, na forma tradicional, e a adoção da auto-avaliação, fora outra inovação que assustou prontamente os pais, e até vários professores: “como é que um menino etc, vai dizer, ele mesmo, qual nota merece? Não vai funcionar!”. Funcionou.
Haja seminário, circulares, conversas diretas. E haja professor levado à requalificação para o trato didático-pedagógico. Inovações ainda hoje tão necessárias e capazes de requalificar o processo educativo brasileiro.
Entre a escola de Colinas, real, e a de Malhação, fictícia-real, há uma inversão na chave experimentada: Colinas os portões foram abertos; Malhação fecha-se as portas. Entre uma e outra o debate educacional de filhos e estudantes desde a Grécia, pelo menos.
Experiências que não prosperam no atrasado ambiente cultural-social brasileiro. Há três, o ministro da Educação, do Brasil, nazi sincero, fugiu do país correndo da Justiça, acusado de estupidez.
Em tudo, o viver humano entre a liberdade e os limites da liberdade. Vida privada e vida pública. E de como é feito o humano ser.
Dê sua opinião: