Morei no Recife e é com muita tristeza que tenho acompanhado os infaustos acontecimentos na cidade e em sua região metropolitana, onde, até o momento em que escrevi esse texto, havia o registro de 106 pessoas mortas. Penso que cada pessoa que perdeu a vida é uma história que se apaga e uma dor que atinge muitas outras pessoas, parentes, amigos ou qualquer criatura humana que se compadeça da dor alheia neste instante.
A tragédia causada pelas chuvas no Recife e região metropolitana é a segunda de maior dimensão no primeiro semestre deste ano, porque entre fevereiro e março, as fortes chuvas que se abateram sobre Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, deixaram 233 pessoas mortas. Somente em duas áreas do Brasil, 342 vidas foram perdidas.
Um olhar mais acurado sobre pessoas mortas em razão de eventos climáticos extremos em nosso país pode chegar facilmente a meio milhar de vidas desperdiçadas e esse é o ponto central de um debate que parece adequado o Brasil começar a ter: cada vez mais as mudanças climáticas tende a produzir esses eventos extremos e a produzir tragédias de dimensões diluvianas.
Governos estaduais e prefeituras pouco podem fazer contra mudanças climáticas globais, mas seguindo aquela sabedoria sobre a andorinha que tentava apagar o incêndio na floresta, podem, sim, fazer a sua parte. Cuidar melhor do lixo, ampliar arborização, proteger e conservar áreas de preservação permanente, nascentes e margens de rios, fazer campanhas de conscientização ambiental e ampliar o consumo de energias limpas são medidas que os governos locais têm condições de adotar.
Ocorre, no entanto, que as medidas de agora não devem alterar substancial e imediatamente as condições do clima em escala global, de tal sorte que os eventos climáticos extremos tendem a se tornar mais frequentes – e, sorte nossa, mais previsíveis pela ciência meteorológica.
No caso de já se saber que chuvas torrenciais e concentradas, assim como ondas de calor e frio, devem ser mais frequentes, aos governos cabe tomar medidas para, por exemplo, começar a tirar famílias de áreas de riscos, alocando-as em locais mais seguros e urbanisticamente mais equipados. Isso pode salvar milhões de vidas, do mesmo modo como vidas podem ser poupadas se, antevendo eventos climáticos extremos, se possam dar ordens de evacuação.
Se temos que conviver com mudanças climáticas, que façamos isso de modo a reduzir a dor que as perdas humanas causam.