É o que eu acho

Quando "Bundinha agachadinha" completar 50 anos

Quarta - 21/06/2017 às 13:06



Foto: Divulgação Inscrição suméria em argila 3500 a. C
Inscrição suméria em argila 3500 a. C

Escrever sobre comportamento é sempre um desafio, afinal, somos todos humanos e não devemos nos comportar de maneira igual. A diversidade é sempre bem-vinda.

Mas a caminhar por uma rua, um carro passou por mim tocando em alto volume algo que de alguma forma lembrava remotamente o que se aproximava de uma música e de cuja letra indecifrável somente consegui captar duas palavras: “bundinha agachadinha”.

Quando eu era jovem, meu pai dizia que a juventude de minha época estava perdida. Talvez. Talvez não.

Um sábio sumério deixou gravada em uma placa de argila uma inscrição em que se queixava da juventude de sua época que não respeitava os costumes dos antigos.

Mas o fato é que eu vivi os anos 60 e 70.

Essas décadas foram revolucionárias culturalmente em todos os sentidos. Na política, no comportamento e nas artes, principalmente na música.

Este mês, por ocasião da comemoração dos 50 anos do álbum dos Beatles, Sgt. Pepper's, lembramos que o disco levou impensáveis, para os dias de hoje, 8 meses para ser gravado! As músicas revolucionaram o rock e as letras eram primorosas.

Esse, entre outros discos, marcaram toda essa geração e as demais subsequentes.

Até hoje lembro-me das músicas e do conteúdo das letras.

A geração seguinte teve, por exemplo, o grupo Queen, encabeçado por Fred Mercury. Quem não se lembra do primor de Bohemian Rhapsody?

Infelizmente grande parte da juventude de hoje perde por não possuir ídolos como os que nós tínhamos, perde por não conhecer os do passado e perde ainda mais ao se recusar a ouví-los.

Mas essa é uma face menos perversa se comparada a que vemos hoje com relação ao comportamento como um todo da juventude atual.

A face mais preocupante é aquela que mostra o jovem cada vez mais egoísta, autoritário, egocêntrico, intolerante insensível e incapaz de empatia. Sem generalizar, é claro.

A busca hoje é por vencer uma competição em todos os sentidos. Não há tempo para reflexão, contemplação ou debate. Tudo muito prático como lhes ensinou o capitalismo.

Vimos recentemente o episódio  do jovem que foi tatuado na testa por outro jovem: SOU LADRÃO E VACILÃO!

As pessoas, na ausência do Estado, estão começando a fazer justiça com as próprias mãos, o que é tremendamente perigoso. Pior, o número de pessoas que apoiaram essa atitude é igualmente preocupante.

Há que se lembrar que torturas como essa aconteciam há 5 mil anos atrás entre os assírios e babilônios, justamente porque a civilização ainda era recente e o Estado ainda caminhava para sua ordenação jurídica.

Por que acontece isso em pleno século 21?

Hoje em dia, quando o estudante ingressa no Ensino Médio, o que lhe é passado é somente o conteúdo necessário a enfrentar um exame vestibular e mais nada.

Não há tempo nem espaço para reflexões, debates e argumentações que possam levar os alunos a uma mínima formação ética e moral.

Outra razão parece ser o exemplo que deve vir de cima para baixo, ou seja, do soberano (como insistiu Dante Alighieri), que no nosso caso é o presidente.

No Brasil, como se sabe, o presidente, os ministros, grande parte dos congressistas e até membros do judiciário estão envolvidos em denúncias de corrupção. Não deve se estranhar então que o jovem sinta desânimo, desalento e falta de perspectivas e de estímulo por seguir um caminho ético e legal em sua vida. Afinal, todos tendemos a nos espelhar pelos nossos pais, também, não?

Devo lembrar também que o Brasil nunca viveu antes um momento de tamanha confusão entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que devem ser separados justamente para haver independência, fiscalização e harmonia entre eles.

Vejam que o presidente hoje elabora projetos de lei, o que deveria ser função dos deputados e senadores; estes, por sua vez, desafiam decisões do Judiciário; e os juízes vivem desrespeitando a Constituição, arbitrando ao invés de julgar pelas leis e, não raro, atuando como advogados quando deveriam se manter equidistantes das partes envolvidas. Toda essa confusão entre os poderes acaba por deixar não só os jovens que estão se formando agora, mas todos os cidadãos, também confusos.

Corremos o risco de estarmos formando uma geração que reproduzirá o modelo antiético de nossos governantes. E o pior é que deles sairão aqueles que exercerão o poder no futuro.

Outra coisa que é preciso lembrar é que a maior parte dos eleitores daquele deputado que prega a volta do regime militar é composta de jovens que o chamam de mito.

São eles que cantam “bundinha agachadinha”, algo que diz muito sobre o machismo e a misoginia que eles pregam e que vai na contra mão do aperfeiçoamento da sociedade.

Mais uma vez, a saída é pela melhoria da educação, não só a pública, mas também a privada.

E da punidade pelo caminho da legalidade e nunca pelo caminho político.

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Fernando Castilho

Fernando Castilho

Arquiteto, Professor e Escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, A Sangria Estancada

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