Artefato

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Teresina aniversaria e esquece de convidar o seu centro histórico

Quarta - 17/08/2016 às 01:08



Foto: Samuel Brandão Praça Pedro II, o centro cultural de Teresina
Praça Pedro II, o centro cultural de Teresina

Teresina completa hoje 164 anos desde sua fundação, nesse ínterim, a cidade, palco de vida dos teresinenses, vem modificando sua paisagem urbana com novos espaços, fachadas e estruturas arquitetônicas, se enfeitando de modernidade, em contraposição, seu centro histórico envelhece nas tardes sendo aos poucos descaracterizado, subutilizado e esquecido. A cidade nova não se interessa mais em ouvir seus conselhos.

O centro de Teresina revela; através da paisagem de suas praças, logradouros públicos, fachadas de prédios e casas; a história e memória de vida do nosso povo, história essa incrustada em suas paredes pelo tempo e ambientada através de seus floreios arquitetônicos e artísticos como das escolas: barroco, rococó, helenístico, arte nouveau, árabe, eclético e neoclássico. As paredes e fachadas são como um livro aberto que remontam, através da memória visual de suas formas e detalhes, a história dos grupos humanos que aqui passaram e viveram.

Marco Zero de Teresina, na praça da BandeiraMarco Zero de Teresina, na praça da BandeiraFoto: Samuel Brandão

Com o tempo e a crescente urbanização, muito dessas fachadas e estruturas foram destruídas ou descaracterizadas, sem uma lei municipal efetiva que protegesse esses bens culturais, sem a fiscalização necessária e sem uma educação patrimonial e cultural aplicada à população. Os casarões antigos, com todos os seus detalhes arquitetônicos, deram lugar à prédios e comércios modernos, muitos com fachadas apáticas ou espelhadas, ou ainda foram transformados em estacionamentos, com vistas à um maior lucro por parte do proprietário, causando uma lacuna paisagística na memória dos citadinos.

Enquanto algumas cidades, mais antigas que Teresina, já colhem os louros da preservação de seu patrimônio material e imaterial através do turismo e da civilidade cultural, essa discussão ainda é bastante recorrente na cidade, tendo em vista a não definição legal, acerca das atribuições preservacionistas da cultura e da arquitetura, que se perdem numa exótica relação ambígua entre público e privado, onde a cultura, a memória e a história ainda não são uma pauta tão urgente. 

Casarão histórico na rua Felix Pacheco, palco do Viva MadalenaCasarão histórico na rua Felix Pacheco, palco do Viva MadalenaFoto: Jailson Soares / O Dia

Um exemplo dessa agressão aos símbolos históricos da cidade, ganhou visibilidade no movimento “Viva Madalena”. Em 2015, alguns jovens universitários, por iniciativa própria, ocuparam uma das últimas residências históricas da Rua Félix Pacheco, que se encontrava em ativo processo de destruição por parte dos seus proprietários. O caso gerou repercussão ao sensibilizar a sociedade a tomar atitudes mais representativas em defesa do patrimônio cultural e arquitetônico. Nessa rua, 80% das residências com fachadas antigas já foram destruídas ou descaracterizadas, dando lugar à entrepostos comerciais. Essas modificações, sutilmente invadem o coração do centro histórico da capital.

O centro de Teresina também sofre com a subutilização de suas praças. São vários os problemas como depredação, marginalização e esquecimento. A praça da Bandeira, onde a cidade começou a ser erguida e onde se encontra a esfera administrativa do município, é reduto de prostituição e de vendedores de mercadorias roubadas, possui o teatro de Arena que raramente é utilizado para alguma apresentação. A maioria do tempo a praça é subutilizada e não existe nenhuma política pública para a melhor utilização dos seus espaços e assim, uma apropriação por parte do teresinense. Assim seguem, com o mesmo problema, a Praça Da Costa e Silva, Saraiva, Liceu, Rio Branco, João Luís, todas bem estruturadas, limpas, mas subutilizadas e sem um conhecimento histórico por parte das novas gerações. Essas praças que foram o palco da história dos nossos antepassados, hoje são como sonhos do centro adormecido. 

Praça da Costa e Silva paciência e abandonoPraça da Costa e Silva paciência e abandonoFoto: Samuel Brandão

A praça Pedro II, a principal na cultura da cidade, sofre com a depredação, falta de policiamento e presença de viciados, sendo o cartão postal da nossa cultura marginalizada. Em seu entorno possuem vários prédios como o Centro de Artesanato Mestre Dezinho, O Teatro 4 de setembro e o espaço Osório Junior que estão em plena atividade, no resto, o Cine Rex não é aberto há anos, pontos comerciais e dois grandes estacionamentos, nas laterais da praça, inviabilizam sua utilização íntegra para fins culturais ou turísticos, e as elites teresinenses ou outras classes sociais lhe dão as costas, servindo somente para uma determinada classe consumidora da cultura genuína da cidade.

Praça Pedro IIPraça Pedro IIFoto: Samuel Brandão

A exemplo de outros centros históricos como o “Reviver” em São Luís ou o “Dragão do Mar” em Fortaleza, quão bom seria ver, a nossa Pedro II tomada por cafés, restaurantes, pizzarias, casas de show, locais de exposição de arte que atraíssem os turistas ou outras parcelas da sociedade teresinense para beber uma cajuína e poetizar o olhar sobre nossa cidade.

A prefeitura, positivamente, está construindo novos espaços públicos na Zona Leste como o Parque Potycabana e o Parque da Cidadania, para a melhoria de vida da nossa população, mas é preciso também que não dê as costas para o centro de Teresina, pois lá encontra-se a história e memória do nosso povo. Além de cuidar, é preciso preservar nosso patrimônio material e imaterial através de leis municipais eficientes e fiscalização mais rígida, através de uma educação patrimonial em seu sistema de educação público e privado que faça o teresinense conhecer e contextualizar a história da sua cidade e de seus monumentos. Outro ponto importante é incentivar a visitação desses espaços públicos (no centro) com práticas culturais, pois só sabe o valor quem realmente se apropria do lugar.

Parabéns pelos seus 164 anos, Teresina!

Por Samuel Brandão

Samuel

Samuel

Trabalha como DJ e proprietário do La Ville Ristobar
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