
A aprovação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e a taxação mínima sobre os super-ricos pode se tornar um marco importante na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A avaliação é do fundador e presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, em entrevista à Exame. De acordo com ele, a combinação dessas duas medidas econômicas tem um poder político muito maior do que simples ajustes tributários, representando uma clara ação de redistribuição de renda e a retomada da agenda de justiça social, característica dos governos do PT.
Meirelles destaca que, quando uma medida como essa é implementada em um momento de recuperação econômica, seu impacto político é ampliado. "Uma coisa é quando você aprova uma medida em um momento de queda, como o governo estava há quatro ou cinco meses. Quando a medida vem no processo de recuperação, ela ganha um impulso muito maior. Uma coisa é ela como um paraquedas, outra coisa é ela como mola", explicou.
Presidente do Grupo Locomotiva, Renato Meirelles
A proposta de isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil, uma das promessas de campanha de Lula, foi aprovada por unanimidade na Câmara dos Deputados e deve seguir ao Senado ainda neste ano. Para Meirelles, essa medida tem um peso político significativo, já que beneficia diretamente o público de trabalhadores formais com carteira assinada, especialmente homens, que historicamente apresentam maior resistência ao governo petista.
"Ele sinaliza para um público mais masculino, com carteira assinada, especialmente o público de CLT até R$ 5.000, que é mais crítico ao governo. Esse efeito prático vai se dar mais no ano que vem", apontou o especialista. Dados do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made/USP) mostram que cerca de 60% dos beneficiados nessa faixa de renda são homens. Para Meirelles, o impacto será duplo: "Quando o dinheiro começa a aparecer todo mês na conta, é como se houvesse um aumento real no salário", comentou.
Outra análise de Meirelles é sobre como o governo Lula conseguiu reposicionar o debate político, ao criar um antagonismo entre os "super-ricos" e a população trabalhadora. A introdução do discurso contra "bancos, bets e bilionários" (o "BBB") trouxe um inimigo simbólico para unificar a base e mobilizar o eleitorado. “Ele não vai ganhar um voto só porque reduziu o Imposto de Renda para os mais pobres, mas ele ganha ao defender que os super-ricos paguem mais impostos”, afirmou.
O pesquisador também destaca que essa estratégia ajudou o governo a recuperar uma identidade política clara. "A isenção do Imposto de Renda vem nesse cenário e restabelece, de forma mais clara, a diferença de visão de mundo entre um lado e o outro", disse.
Além disso, Meirelles observa que o governo também está avançando com pautas de grande apelo social, como a proposta de reduzir a jornada de trabalho para 6x1. Ele acredita que esse tema tem grande potencial de mobilização e pode colocar a oposição em uma posição desconfortável. "Essa pauta tem um enorme potencial de mobilização, colocando a oposição em uma posição difícil. Vamos ver como isso se desenvolve, mas pode ser um divisor de águas", completou.
O especialista também avalia que o contexto político favorece Lula, com a recuperação econômica e a fragmentação da oposição. "O governo Lula vai começar a entregar resultados ao mesmo tempo em que o bolsonarismo se divide entre a defesa da anistia e a tentativa de manter sua base radical", afirmou.
Meirelles acredita que a isenção do IR e a taxação dos super-ricos podem consolidar uma nova fase no governo, focada na entrega de resultados concretos e na reafirmação do compromisso com a justiça social. "Sem juízo de valor sobre ela, a medida leva aqueles eleitores que estão entre Ciro, Simone e outros a se inclinarem para o governo Lula — não por gostar tanto dele, mas por rejeitar o outro lado", concluiu.
Fonte: Exame, Brasil 247