O Globo de Ouro conquistado por Fernanda Torres destacou novamente o filme "Ainda Estou Aqui", que vem quebrando recordes de bilheteria no Brasil e no exterior. A premiação, por melhor atriz, aconteceu na semana em que os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 completam dois anos. Especialistas apontam que, enquanto o sucesso do filme demonstra o interesse pela memória da ditadura, os recentes ataques mostram que a democracia brasileira ainda é frágil.
A historiadora Gabrielle Abreu, mestre em História Comparada pela UFRJ e gestora de Memória no Instituto Marielle Franco, destacou que o filme oferece à sociedade a chance de discutir a ditadura militar por meio da arte. “O filme nos confronta coletivamente com essa temática e facilita o debate pela arte, pela cultura, e pela força de uma personalidade como Fernanda Torres”, afirma.
"Ainda Estou Aqui" narra a história da família Paiva, que, em 1971, enfrenta o desaparecimento e assassinato de Rubens Paiva, vítima do endurecimento da ditadura militar. A trama é contada sob a perspectiva de sua esposa, Eunice Paiva, vivida por Fernanda Torres. Para Gabrielle, o filme “nos transporta àquela época, fazendo com que rejeitemos a censura, autoritarismo e a limitação de direitos, inspirando o apreço pela democracia”.
Negação da Ditadura
Apesar do avanço nos debates, a negação da ditadura militar ainda é presente. A historiadora Renata Melo, diretora da ANPUH-DF, observa que uma parcela da população ainda enaltece o regime militar, o que se reflete em atos como os de 8 de janeiro de 2023. “Negar os impactos negativos da ditadura afeta não só a compreensão histórica, mas também a sociedade todo”, explica. Segundo ela, o filme relembra uma memória que parte da sociedade tenta esquecer ou negar, reforçando a importância de se debater os crimes cometidos na época.
Memória, Verdade e Justiça
O Brasil ainda carece de justiça de transição, segundo Leo Alves, integrante do coletivo Filhos e Netos Memória, Verdade e Justiça. Ele lembra que, apesar das mortes e desaparecimentos reconhecidos pela Comissão Nacional da Verdade, os responsáveis pelos crimes da ditadura nunca foram condenados. “A condenação dos violadores de direitos humanos é fundamental para a reparação e fortalecimento da democracia”, afirma Leo, neto de Mário Alves, desaparecido na ditadura.
A Força da Arte
O historiador Paulo Cesar Ribeiro, do Coletivo RJ por Memória, Verdade e Justiça, destaca que a arte tem um papel crucial na preservação da memória histórica. Segundo ele, o filme atinge emocionalmente onde trabalhos acadêmicos não chegam. “Artistas conseguem comover por meio de sentimentos, algo que os pesquisadores alcançam dificilmente com suas análises e dados técnicos.”
Com seu impacto, "Ainda Estou Aqui" mostra que o cinema pode ser uma ferramenta poderosa para reforçar a importância da democracia, combater a negação histórica e promover o debate sobre o passado autoritário do Brasil.
Fonte: Agência Brasil