Olhe Direito!

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Sobre festas, cultura e entretenimento

Tome-se o caso de festas promovidas por prefeituras de cidades pobres e nas quais todos sabem que faltam bons serviços de saúde, de educação, de saneamento

Alvaro

Quinta - 09/06/2022 às 18:59



Foto: Divulgação Show
Show

Uma disputa ideológica no show business brasileiro terminou por chamar a atenção para os meios pelos quais, para o bem ou para o mal, se promove no Brasil uma espécie de mecenato com dinheiro público.

De um lado, a pulverização de eventos nos mais de 5,5 mil municípios do país, na maioria dos quais, por falta de legalidade e transparência, termina-se criando espaços para uso inadequado ou desvio de finalidade de ativo públicos. De outro, o mal entendimento, proposital ou não, sobre como funciona o sistema de captação de recursos via renúncia fiscal por meio da Lei Rouanet.

É lamentável que se estejam criando problemas para duas situações em que conhecimento, transparência, legalidade e cumprimento de regras, são meios suficientes para garantir o bom uso dos recursos para produção de bom entretenimento, de lazer, de arte e cultura, bem assim da manutenção da economia criativa por todo o país – que gera ocupação e renda para milhões de pessoas.

Tome-se o caso de festas promovidas por prefeituras de cidades pobres e nas quais todos sabem que faltam bons serviços de saúde, de educação, de saneamento. Sim, é verdade que a maioria das cidades brasileiras não dispõe de serviços públicos em quantidade e qualidade para o conjunto de seus residentes. Mas é também verdade que cultura, lazer e entretenimento faltam na mesma medida, de tal sorte que podem e devem as prefeituras cuidar também destas demandas.

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Ora, então, chega-se ao ponto da legalidade e da transparência: devem as prefeituras, a cada ano, tanto na lei de diretrizes quanto na lei orçamentária anual, prever as despesas municipais com lazer, arte e cultura, de tal sorte que não se façam malabarismos carregados de ilicitude para bancar eventos que estão no calendário anual do município. Aliás, também deve haver lei estabelecendo o calendário de eventos, para que os que lá estejam possam merecer aporte oficial de recursos.

O que tem ocorrido, no entanto, é uma prática recorrente de desvio de finalidade de recursos municipais face à ausência de previsão legal para gastos com eventos – como o carnaval, por exemplo. Ora, se não tem no orçamento a previsão, termina-se fazendo uso de verbas de outras rubricas orçamentárias, o que forçosamente vai implicar em desvio de finalidade – e levará a decisões judiciais em desfavor das prefeituras sempre que o órgão ministerial ou qualquer cidadão acione o Judiciário em face de eventos sem cobertura financeira prevista no escopo de uma lei orçamentária municipal.

Bem, até aqui viu-se que, havendo uma previsão legal, que também determina a fonte do recurso para lazer, arte e cultura, configura-se a realização de tais eventos em algo transparente e sujeito ao olhar dos órgãos de fiscalização e controle. Isso não somente assegura que os eventos possam ser realizados, mas fiscalizados conforme se espera de qualquer ação que envolva o dinheiro público.

Mas e a Lei Rouanet, citada lá no começo? Bem, todos os projetos culturais e de entretenimento submetidos à aprovação da Secretaria Nacional de Cultura são avaliados com critérios objetivos e, uma vez autorizados, precisam prestar contas do dinheiro captado junto às empresas, mediante renúncia fiscal, o que pode mitigar riscos de desvios, ou seja, no âmbito da Lei Rouanet, já se pratica a legalidade, transparência e controle que faltam às ações culturais em boa parte dos municípios brasileiros.

Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Procurador do Estado. Ex-Presidente da OAB-PI. Mestre em Direito pela UFPE. Doutorando em Direito pela PUC-SP. Presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.

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Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.

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