
Livros? Melhor tê-los, por que se não, como sabê-los? Começo meu texto desta semana com uma “deturpação” ou leitura diferente da famosa assertiva de Vinícius de Moraes: “Filhos? Melhor não tê-los, mas não os temos, como sabê-los”, estrofe inicial do “Poema enjoadinho”. Faço-o porque convém lembrar sobre os livros não como filhos, já que somente assim o são para os que os escrevem, mas como guias, como professores que nos conduzem por suas páginas em aprendizado que se expande a cada palavra lida.
Os livros e os lugares em que estão guardados – a bibliotecas – podem compor mesmo uma versão própria do paraíso em terra. Ou podem compor o próprio universo, como sugere um dos mais conhecidos textos de Jorge Luís Borges, “A Biblioteca de Babel”, em que o grande escritor argentino afirma que “quando se proclamou que a Biblioteca abarcava todos os livros, a primeira impressão foi de extravagante felicidade. Todos os homens sentiram-se senhores de um tesouro intacto e secreto”.
O texto de Borges não nos deixa dúvidas quanto a importância do saber como uma consciência universal a ser partilhada, como algo que nos move para a resolubilidade dos nossos problemas. E isso tanto será mais fácil quanto mais acesso se tiver e livros – que seguem, em sua forma analógica de papel impresso, uma inesgotável fonte de saberes.
Eduardo Frieiro publicou um livro a indicar esse caminho: “Livros, nossos amigos”, aliás disponível a bom preço e sem frete na Livraria do Senado. O texto faz-nos entender que o gosto pela leitura deve ser a razão do crescimento humano, mais ainda se nosso interesse se volta para livros clássicos. Mas ele não deixa de lembrar de outras obras, que enumera como livros curiosos, ridículos, extravagantes e singulares;
Como já posto, o livro é um objeto analógico, que precisa ser preservado – mas que não depende, por exemplo, de fonte de energia para seu uso, como assim são dependentes os equipamentos para leitura dos e-books. Daí porque o livro de Frieiro traz-nos uma questão prática, que são os cuidados para evitar que pragas destruam um livro, de modo que a obra traz os cuidados e os remédios para prolongar a vida dos livros, e conselhos úteis para manutenção da uma biblioteca; livros para poucos e livros para muitos.
O ato de ler livros – em sua forma criada por Gutenberg mais de 500 anos atrás – causou mudanças sociais, econômicas, culturais e até mesmo pode ter sido combustível de muitas revoluções. Porém, é no que pode parecer uma rotina modorrenta de leitura que se produzem transformações permanentes via livros – como bem lembrou o novo imortal da Academia Brasileira de Letras, José Roberto de Castro Neves, em sua posse, dia 11 de julho.
No seu discurso, o autor de “Como os advogados salvaram o mundo”, propugnou que a literatura é uma alquimia, pois transforma “tinta no papel em ideias, sentimentos, alimento para a alma e motor para novas descobertas”. E seguindo em uma ideia de aproximar obras literárias às reações químicas, declarou que para ele “os livros funcionam como uma droga lícita, um ‘doping’ do bem”.
Sim, sendo um ‘doping’ do bem, têm os livros o poder de, nessa alquimia de que fala José Roberto, promover nas pessoas viagens e vidas outras, como, aliás, sugeriu o imortal em seu discurso de posse, usando as palavras do poeta e imortal Geraldo Carneiro: se ler é viver por empréstimo, pôde ele – e todos os que leram ou podem vir a ler – ser meninos de rua em “Capitães de Areia”, de Jorge Amado; andar pelas ruas conflagradas de Paris em “Os miseráveis”, de Victor Hugo; andar pela Rússia czarista com Tolstoi; estar em Macondo (“Cem anos de solidão”, de García Márquez) ou em Lilipute, a ilha fantástica de “As viagens de Gulliver”, de Jonathan Swift.
Então, livros, melhor tê-los e lê-los. Viagens fantásticas e vidas outros eles nos darão.
