Olhe Direito!

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O risco da irracionalidade eleitoral

Quinta - 06/09/2018 às 13:09



Por Álvaro Fernando Mota

A sociedade brasileira vive um momento de espíritos armados. Por nada ou coisa pouca, as pessoas tendem a partir para o campo da irracionalidade e das paixões, deixando de lado um processo adequado de argumentação. Não convém fulanizar a culpa pelo problema de polarização em que estamos enfiados, o qual resulta em passionalidade que funciona como pólvora para incendiar a nação.

Porém, se não se podem apontar nomes, convém lembrar que o país não pode sucumbir a discussões apaixonadas sobre tudo ou quase tudo. Há que se invocar a razão como a condutora de um processo de debates e de encaminhamento de soluções. Infelizmente, numa eleição como a brasileira, cada vez mais encerrada em prazos exíguos, o debate eleitoral é trocado pelo açodamento e a passionalidade.

O uso da razão, infelizmente, não será a tônica da campanha eleitoral em curso. Como não foi da anterior, quando as ferramentas de propaganda e marketing se dedicaram a explorar os medos dos eleitores, em vez de se concentrar em questões objetivas. Neste ano, nota-se um uso ainda maior da irracionalidade ou das emoções como ferramentas para convencimento do eleitor.

Não há ninguém tolo o bastante para imaginar que se vence uma eleição sem conquistar o eleitor pelo lado emocional. É lícito e legítimo que assim se proceda. Porém, é razoável que uma parte do esforço de convencimento se dê no campo das ideias. Ocorre é que as propostas são embaladas de modo a serem mostradas somente em sua superfície e assim, a escolha quase sempre se dará no terreno da emoção e não da razão.

Com uma polarização que arma os espíritos e joga a sociedade em clima de final de campeonato, o espaço da racionalidade se esvai. Corremos o risco de, ofuscados em nossa visão pela passionalidade da disputa, escolher para a grande partida os piores times ou pelo menos aqueles cuja qualificação não os permitiria ascender tanto.

Como, ao contrário do que se dá no futebol, as finais de campeonato política ocorrem somente a cada quatro anos, escolhas irracionais podem custar muito caro – porque recaem sobre agentes afeitos a soluções econômicas e políticas fora da curva, quando não populistas, antidemocrática ou das duas coisas juntas.

Temos no Brasil pelo menos três experiências em que o eleitorado foi movido por paixão e os presidentes eleitos entregaram o país em meio a uma crise. Jânio Quadros é o exemplo mais antigo. Ele fez campanha com a ideia primária e única de combater a corrupção – que vislumbrou no antecessor JK. Foi eleito com maioria esmagadora, mas em menos de sete meses após sua posse ele renunciou e lançou o país em uma crise que desembocou numa ditadura de 21 anos.

Os dois casos mais recentes, de Fernando Collor e Dilma Roussef, são exemplos de um uso ainda mais profissional da emoção como instrumento de conquista de votos. São dois presidentes que venceram pela ideia de medo do que o adversário faria se ganhasse a eleição. Os dois terminaram afastados do poder por impeachment. No caso de Dilma, com o agravante de uma crise econômica que persiste sobre a palidez de seu sucessor chamado de golpista, o presidente Michel Temer.

Há ainda que se lembrar sobre o risco do discurso moralista travestido de boas intenções. Com Jânio e Fernando Collor havia um palavreado sempre voltado para a moralidade pública como peça de resistência de uma campanha. No segundo caso, a moralidade era um castelo de cartas, confirmando, aliás, a famosa assertiva do poeta e romancista irlandês Oscar Wilde: há moralistas imoralíssimos.

Nessa pegada, com efeito, temos que estar precavidos quanto a um discurso que promete moralidade como regra a ser cumprida não por quem o faz, mas somente pelos outros. Assim, cabe indagar:  o que nos resta em uma campanha em que, mais uma vez, temos o debate de ideias esmaecido por um volume nunca antes visto do uso de emoções para convencimento do eleitor? Talvez rezar, porque na babel em que estamos metido, infelizmente confirma-se o dito popular de que uma andorinha só não faz verão.

Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Procurador do Estado. Ex-Presidente da OAB-PI. Mestre em Direito pela UFPE. Presidente do Instituto dos Advogados Piauienses. Atual Presidente do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil.

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Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.

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