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“Litigiosidade judicial epidêmica”

O Brasil, mostra o anuário, tem 91 tribunais e os juízes em todos os níveis de atuação chegam a 18.265 – mais que as populações da maioria dos cerca de 5,5 mil municípios brasileiros.

Alvaro o Mota

Quinta - 06/06/2024 às 16:31



Foto: © PixBay Judiciário
Judiciário

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, ministro Luís Roberto Barroso lanço nesta semana, na terça-feira, 28, um anuário chamado "Justiça em Números 2024", no qual estão estatísticas processuais, indicadores de desempenho e outros dados.

Mais do que impressionantes, como definiu o ministro Barroso, os números que estão no documento são impactantes e evidenciam o tamanho do desafio que não somente magistrados, mas todos os operadores do Direito têm com relação ao funcionamento do Judiciário no país.

O Brasil, mostra o anuário, tem 91 tribunais e os juízes em todos os níveis de atuação chegam a 18.265 – mais que as populações da maioria dos cerca de 5,5 mil municípios brasileiros.

Ainda assim, segundo pontuou o ministro, existe um déficit de 4.000 mil magistrados, o que certamente contribui para um represamento das ações judiciais.

Os servidores do Judiciário chegam a 275.581 pessoas, o que pode ajudar a compreender uma afirmativa do ministro Luís Roberto Barroso ao apresentar os dados em sessão do CNJ: ao lado das Forças Armadas, o Judiciário pode ser visto como a instituição com maior capilaridade no país.

Haveria, pelas palavras do ministro, 80% dos brasileiros vivendo em sedes de comarcas – ou seja, de cada 10 pessoas residentes no Brasil, 8 estão em cidades onde há uma repartição do Judiciário para qual pode haver um juiz encarregado de cuidar de administrar a justiça naquela área.

Mas é imperativo lembrar que 20% dos brasileiros ou um em cada cinco residentes no país estão fora de uma cidade com sede judicial – o que lhes dificulta fiscalmente o acesso à Justiça.

Ainda que se possam enxergar as dificuldades de acesso ao Judiciário, os números do anuário do CNJ mostram o que o ministro Barroso enxergou como uma espécie de “epidemia judicialização no Brasil”: os volumes de processos em 2023 foram de 83,8 milhões.

Este é um recorde na série histórica e no mundo, segundo o ministro Barroso, que vê aspectos bons e ruins nesse número gigantesco de processos.

O uso do termo epidemia pelo ministro evidencia uma leitura ruim da judicialização, posto que uma condição sanitária epidemia é uma condição deletéria à saúde humana e comunitária. Porém, ele vê uma positividade: se a população acorre como uma maré humana à Justiça, esse seria um sinal de que a instituição desperta confiança nas pessoas.

Mas como toda epidemia que causa um colapso nos sistemas sanitários, essa epidemia judicial, bem diz o ministro Luís Roberto Barroso, testa os limites da capacidade do Judiciário em atender “com celeridade desejável” esse volume de demanda processual. Mais dos que reduzir um déficit de juízes ou de ampliar a quantidade de servidores, é fundamental buscar saídas para o represamento das ações judiciais em face do que o ministro classificou como “epidemia judicialização no Brasil”.

Parece evidente buscar reduzir demandas que se possa evitar que cheguem ao Judiciário, mediantes ações já bastante conhecidas de medição e arbitragem, testadas e aprovadas em sua efetividade, eficiência e eficácia. Mas para o que está posto como realidade, uma quantidade recorde de ações, há que se verificar outros meios de solução.

O ministro apontou que haverá um mapeamento da litigiosidade “epidêmica” como mecanismo de enfrentamento de um represamento das ações. Se uma demanda fica anos parada, o aumento desses números tende a minar a confiança de que o presidente do STF e do CNJ fala quando as pessoas acorrem ao Judiciário demandando arbitragem de um interesse.

O mapeamento das ações pode criar um espaço para soluções no âmbito do Judiciário, com um amplo esforço de negociação judicial, mormente no âmbito dos processos contra o poder público – a maioria da litigiosidade e de que fala o ministro Barroso. Há, com efeito, caminhos que podem reduzir a gigantesca quantidade de ações, tornando mais efetiva e célere a ação da Justiça e favorecendo o trabalho de outros operadores do Direito.

Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.
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