Olhe Direito!

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Doenças e vacinas

Segunda - 23/07/2018 às 12:07



Por Álvaro Fernando Mota

Nas últimas duas semanas, tanto o Brasil quanto o mundo foram impactados pela volta ou risco de retorno de doenças imunopreveníveis. Sarampo e pólio encabeçam as listas das preocupações de organismos como a OMS. No Brasil, a Amazônia padece de um surto de sarampo porque crianças venezuelanas não vacinadas por longo tempo tiveram a doença em solo brasileiro, onde também a baixa cobertura vacinal favoreceu a expansão da doença.

São dias sombrios esses em que as pessoas adoecem porque, pelas mais variadas razões, não cuidaram de se prevenir com vacinas, um modo eficiente e barato de evitar moléstias transmitidas por vírus, conforme toda e qualquer pessoa com um pouco de informação sabe.

Há um sem número de razões pelas quais doenças preveníveis com vacinas estão ganhando força. Mas duas dessas possíveis causas são preocupantes: há um crescente grupo de pessoas que desacredita nas vacinas e até as culpa por outras patologias ou síndromes, como o autismo. E existem multidões de pais e de mães que simplesmente ignoram o risco das doenças porque não viveram os tempos em que elas eram recorrentes.

Isso tudo colocado, a gente conclui que vivemos em um mundo no qual o acesso super facilitado à informação não tem concorrido para diminuir a ignorância das pessoas. Pelo contrário, há uma expansão das trevas do não-saber ou do saber equivocado, das pseudociências. Há mais escuridão que luz num mundo cheio de informação.

Observemos que no Brasil a legislação sanitária e protetiva à criança (ECA) prescreve que vacinas devem ser obrigatoriamente vacinadas, porque são direito indisponível da criança e do adolescente, é muito preocupante que haja um declínio perigoso da cobertura vacinal, a ponto de termos o risco da volta da pólio, uma doença sem registro de casos no país há pelo menos um quarto de século.

O que dizer disso? É evidente que teremos de perceber esse problema como um retrocesso civilizatório num mundo em que há progressos sociais e econômicos estupendos. Isso sinaliza, infelizmente, para o fato de que o senso comum se deixa levar por credulidades perigosas, seja no aspecto sanitário, seja do ponto de vista social, econômico e político.

Sob os prismas social, econômico e político, aliás, também existem doenças ou síndromes ameaçadoras, não perceptíveis pelas pessoas, infelizmente. Se olharmos para o discurso de alguns dos mais relevantes candidatos a presidente e ao Congresso Nacional poderemos nos dar conta do risco que corre o edifício democrático do país.

Do mesmo modo como doenças  imunopreveníveis ameaçam a saúde coletiva, face à não vacinação da quase totalidade da população-alvo,  trazem graves riscos institucionais a sedução ao discurso autoritário e a regressão no processo civilizatórios. A democracia está sujeita às patologias autoritárias, que, como as moléstias humanas, tendem a ser transmitidas de modo sub-reptício.

É a informação, o conhecimento, a ciência precisa que formam as ferramentas mais eficazes de lidar com doenças, combatê-las, contê-las e até curá-las. Vale para a ciência médica, vale para a prática política.  Com informação, as pessoas tendem a se imunizar contra a demagogia, o populismo e o germe do autoritarismo tão presente no país, a despeito de a democracia estar entre nós desde 1985, ainda mais consolidada pela Carta de 1988. Porém, se persistirmos na cegueira da não-informação, corremos o risco de ver o sistema político democrático perecer ou ser posto para respirar por aparelhos. Surtos da doença autoritária costumam deixar muitos mortos , sofrimentos e sequelas. Melhor preveni-los, porque para eles o remédio é sempre muito mais difícil.

Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Procurador do Estado. Ex-Presidente da OAB-PI. Mestre em Direito pela UFPE. Atual Presidente do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil.

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Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.

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