Nesta semana, o governo do Piauí, por sua Secretaria de Meio Ambiente, anunciou a criação de mais uma unidade de conservação da natureza, a APA do Vale dos Buritis e Carnaubais, uma área de proteção ambiental de quase 26 mil hectares nos municípios de Brejo do Piauí, Canto do Buriti e Pajeú do Piauí.
O ato que cria a APA (Decreto Nº 23.563, de 30 de janeiro de 2025), embora não cite a Lei Estadual 5.178, de 2000, que estabeleceu a Política Florestal no Piauí, está, pelo menos em um dos dispositivos fixados naquela lei: o inciso VIII do art. 2º, que determina a execução de política pública florestal do Piauí por meio de facilitação e promoção da conservação, proteção e recuperação de recursos hídricos, edáficos (solo) e da biodiversidade.
Esse último ponto, também com base em outras normas legais, como a Leis estaduais 4.854/96 e 7.044/17, configura-se no Decreto certamente como um avanço no uso da lei por similaridade, posto que o inciso IV da norma estabeleceu a implementação de medidas para “promover a recuperação de ecossistemas degradados por espécies exóticas invasoras, como algaroba (“Prosopis juliflora”) e nim (“Azadirachta indica”), adotando medidas para controle e erradicação dessas espécies, além de restaurar a composição vegetal nativa.
Esse dispositivo contido em uma norma legal – o Decreto Nº 23.563, de 30 de janeiro de 2025 – pode ser lido como um avanço institucional realmente louvável sobre um ponto essencial em políticas públicas ambientais, notadamente no que concerne à flora nativa, qual seja, o que apontar o risco que espécies vegetais exóticas podem oferecer aos biomas do Piauí.
O decreto do governador, elaborado no âmbito da Secretaria de Meio Ambiente, em um dispositivo que passaria despercebido, lança luzes sobre a necessidade de controle do que estudiosos de biologia e meio ambiente têm feito sobre os efeitos deletérios das espécies exóticas e invasoras sobre os nossos extratos florestais nativos.
Segundo o Banco de Dados Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, mantido pela organização não governamental Instituto Hórus, existem pelo menos 210 espécies vegetais não-nativas que se espalharam por ecossistemas brasileiros, causando danos à flora local. E muitas delas a maioria de nós sequer sabe se tratar de plantas não-nativas do Brasil, como é o caso da amendoeiras-da-praia (“Terminalia catappa”) e da jaqueira (“Artocarpus heterophyllus”).
Estudos acadêmicos e científicos robustos evidenciam que as duas espécies citadas no decreto que criou a APA do Vale dos Buritis e Carnaubais – a algaroba e o nim indiano – têm sido perniciosas para os ecossistemas do Piauí, porque sem que haja controladores biológicos nativos para conter sua dispersão, essas duas plantas vão formando verdadeiras flores únicas – ou seja, somente delas – o que concorre para a extinção de outros estratos vegetais e de animais que fazem das plantas nativas as suas mais fundamentais fontes de sobrevivência.
Diante de um documento que traz a institucionalização do enfrentamento a uma política pública de enfrentamento à proliferação de espécies vegetais invasoras, é possível que se deva evoluir para além do uso de uma lei por similaridade. Talvez seja cabível no Piauí o que se fez em Santa Catarina, que desde 2009 tem em seu Código Florestal um dispositivo legal (Lei estadual nº 14.675/2009) a estabelecer que proprietários terra têm a responsabilidade de controlar a dispersão de espécies exóticas invasoras utilizadas, cabendo ao órgão ambiental do Estado a obrigação de manter um programa de espécies exóticas invasoras.
Santa Catarina desde 2010 mantém um cadastro de espécies animais e vegetais invasoras, que contém 16 vertebrados terrestres, 13 peixes, 10 invertebrados terrestres, sete invertebrados marinhos, três invertebrados de água doce, uma alga e 49 plantas, totalizando 99 espécies. A cada dois anos essa lista é revisada, o que indica que possivelmente o Piauí tem um longo caminho a percorrer no processo de criação de mecanismos legais e institucionais de conservação da natureza pelo combate, enfrentamento e controle das espécies vegetais e animais exóticas e invasoras.