Foi desenvolvida uma metodologia que combina modelos de previsão de expansão urbana e mudança do uso do solo, juntamente com modelos hidrodinâmicos. Essa abordagem aborda informações geográficas precisas para identificar áreas com alto risco de inundações urbanas, incluindo as causadas por eventos de chuvas extremas.
Este estudo teve como base dados da região metropolitana de São Paulo, especificamente, São Caetano do Sul, e é considerado um estudo pioneiro. O motivo da escolha desta cidade, foi justamente o fato de já ter sido alvo de eventos extremos de inundações.
Os técnicos afirmaram que o modelo pode ser utilizado como um instrumento para apoiar decisões relacionadas a ações de planejamento e emergências da Defesa Civil, bem como para obras de contenção de enchentes e inundações.
Segundo a pesquisadora Cláudia Maria de Almeida, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), responsável pela coordenação do Laboratório Cities, que se dedica a pesquisas teóricas e aplicadas em sensoriamento remoto urbano, era crucial que a cidade escolhida para o estudo pioneiro tivesse características favoráveis, como um tamanho limitado e condições de contorno estáveis. Além disso, era importante que houvesse disponibilidade de dados hidrometeorológicos e de documentações sobre inundações recentes, com acesso público.
Os pesquisadores contaram com a parceria UFPB (Universidades Federais da Paraíba), UFRGS (Universidades Federais do Rio Grande do Sul) e os órgãos locais. Os dados da defesa civil do município foram utilizados para que os pesquisadores testassem o modelo. A saber, eles consideraram a enchente que ocorreu 10 de março no ano de 2019. Na ocasião 3 pessoas foram vítimas fatais de afogamento, e várias ruas da cidade de São Caetano ficaram com praticamente 2 metros de altura de água.
O estudo, que é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), teve seus resultados preliminares divulgados na revista Water. A pesquisa é conduzida pelo doutorando Elton Vicente Escobar Silva, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que é o primeiro autor do artigo e orientado pela pesquisadora Claudia Maria de Almeida.
Sobre a modelagem hidrodinâmica
O software Hec-Ras (Hydrologic Engineering Center's River Analysis System, em inglês) foi utilizado pelo grupo de pesquisadores para a modelagem hidrodinâmica. Esse programa de computador é capaz de simular o fluxo e subir da superfície da água, bem como o transporte de sedimentos.
Dois modelos digitais de terrenos (DTM) foram utilizados para analisar a extensão de áreas inundáveis. Estes contavam com resoluções espaciais diferenciadas, sendo 0,5m e 5 metros.
A saber, o DTM, sigla em inglês para modelos digitais de terrenos, é uma representação matemática da superfície do solo. Esta pode ser manipulada por meio de programas de computadores, sua forma de representação, quase sempre é grade retangular, onde cada pixel representa o valor de elevação.
No processo de simulação, a vegetação, edifícios e outras características foram removidas digitalmente para permitir uma avaliação precisa das condições hidrodinâmicas. Além disso, quatro diferentes intervalos de tempo de computação (1, 15, 30 e 60 segundos) foram utilizados para avaliar o desempenho das saídas das simulações.
Os resultados foram alcançados através das simulações com resolução espacial de 5 metros, as quais produziram mapas de inundação com a maior cobertura de pontos alagados (278 de um total de 286 pontos, ou seja, 97,2%) em um tempo de cálculo mais curto. A pesquisa ainda identificou pontos de inundação que não foram detectados pela Defesa Civil, nem pelos moradores de São Caetano do Sul, durante a inundação que consumia a cidade.
O pesquisador Elton Vicente Escobar Silva explicou que a metodologia desenvolvida tem como objetivo fornecer suporte aos tomadores de decisão. O estudo simula como será a mudança do uso do solo nos próximos anos e como isso pode impactar a rede de escoamento fluvial. A partir dessas simulações, é possível criar cenários e projetar possíveis consequências, como a quantidade de chuva em determinado intervalo de tempo e suas possíveis consequências em áreas específicas da cidade. Com isso, os gestores podem tomar decisões mais dolorosas, visando evitar danos biológicos e perdas humanas.
A cidade de São Caetano, ligada com a capital e também cidades vizinhas como São Bernardo do Campo e Santo André, possuem um histórico de inundações, visto que só de 2000 a 2022 já houve 29 ocorrências.
Todavia, São Caetano é considerada uma cidade sustentável entre o ranking de 5.570 cidades brasileiras. Isso de acordo com o IDSC (Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades), sua população é estimada em 162 mil residentes e conta com 100% de casas com esgotamento sanitário em condições adequadas. 95,4% das residências urbanas estão localizadas em vias públicas com presença de árvores, enquanto apenas 37% das residências estão em vias com urbanização adequada, que inclui características como bueiros, calçadas, pavimentação e meio-fio, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Incentivo a construção de políticas públicas
Tal experimento pode servir como exemplo de ser utilizado por outras cidades na criação de políticas públicas, e tomadas de decisões para combater impactos como esses. Logo, por meio deste experimento e sua aplicação em demais municípios é possível evitar destruição de edifícios, morte de residentes, etc. Além disso, tal prevenção possui baixo custo.
Segundo a pesquisadora Cláudia Maria de Almeida, a viabilidade de aplicação do modelo dependerá da disponibilidade de dados para alimentação do mesmo, bem como da capacitação de pessoal para sua parametrização e calibração. A plataforma onde o modelo é executado é gratuita apenas para fins acadêmicos e instituições sem fins lucrativos. Já para instituições governamentais e empresas, é cobrado um valor módico de licença anual, considerado plenamente viável para a grande maioria das cidades brasileiras.
Assim, o investimento na plataforma e capacitação do pessoal envolvido é de baixo custo. Os investigadores Cláudia Maria de Almeida e Elton Vicente Escobar Silva explicaram que a captação de dados necessários para o modelo não implica necessariamente em investimento de recursos públicos, desde que esses dados estejam disponíveis. No entanto, caso sejam necessários dados que não estejam disponíveis, pode haver uma demanda de custos adicionais, os quais podem ser facilmente cobertos dependendo do tamanho da prefeitura em questão.
Cidades planejadas
Foto: Gabriel Correa/Agência Brasil
É lamentável que o planejamento das cidades não caminhe da mesma forma. Afinal, é notório a urbanização sem freios, que causa por exemplo alterações da hidrologia, mudanças no uso da cobertura do solo e aumento das áreas impermeáveis da superfície. Assim, estes fatores somados a mudanças climáticas como maior frequência de ventos extremos, faz com que as cidades fiquem vulneráveis a enchentes, deslizamentos em estações chuvosas, alagamentos, entupimento em residências e comércios, sendo necessário contratar uma desentupidora no abc, pelo fato de ser a região mais afetada.
Os pesquisadores destacam que a pesquisa leva em conta o crescimento desordenado das cidades, pois o modelo hidrodinâmico é alimentado por meio da saída de um modelo dinâmico espacial de previsão de expansão urbana e mudança de uso do solo urbano. A partir da concepção de diferentes cenários de alterações no uso do solo, o modelo hidrodinâmico fornecerá informações importantes para ações corretivas, como ações para impedir a ocupação urbana em áreas de várzeas de corpos d'água.
Este modelo foi destinado a realizar simulação de eventos pretéritos, para assim poder prever futuros eventos de inundações, em especial, aqueles extremos. Os técnicos afirmaram que o modelo pode ser utilizado como um instrumento para apoiar decisões relacionadas a ações de planejamento e emergências da Defesa Civil, bem como para obras de contenção de enchentes e inundações.
Smart Cities
Segundo Cláudia Almeida, o que diferencia este estudo é o uso dos dados reais usados para parametrizar e dar validade ao modelo, isso além do fato de utilizar modelagem hidrodinâmica aliada a complexa rede de drenagem subterrânea pluvial. De acordo com a pesquisadora, foram utilizadas imagens de alta resolução espacial e deep learning (aprendizado profundo), assuntos ligados à smart Cities e Big data.
Nos anos 2010, o conceito de smart cities surgiu como uma abordagem tecnológica, envolvendo soluções como semáforos integrados e pontos de ônibus com acesso à internet. Contudo, mais recentemente, o conceito passou a englobar também temas relacionados à sustentabilidade e à qualidade de vida dos moradores das cidades.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a população mundial atingiu a marca de oito bilhões de pessoas no ano passado, sendo que 56% desses indivíduos vivem em áreas urbanas. Estima-se que, até o ano de 2050, a população mundial chegará a 9,7 bilhões de pessoas, e que 6,6 bilhões permanecerão em cidades, o que representa cerca de 68% da população total.
Fonte: https://agenciabrasil.ebc.com.br/