
“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência?
Por quanto tempo ainda há de zombar de nós essa tua loucura?
A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio?
Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu perturbar-te?
Não sentes que os teus planos estão à vista de todos?
Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem?
Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações foram as tuas?”
Trecho de quatro discursos proferidos pelo cônsul e filósofo romano Cícero contra o senador Catilina, que tentava um golpe para derrubar a República romana.
Em novembro de 2013 um helicóptero carregado com 445 quilos de pasta de cocaína foi apreendido pela Polícia Federal. Nada de mais se a aeronave não pertencesse à Limeira Agropecuária, de propriedade do deputado estadual Gustavo Perrella (Solidariedade – MG), filho do senador Zezé Perrella, ligado ao também senador, Aécio Neves.
Após várias acrobacias internas da PF, a aeronave e seu piloto foram liberados, a mídia se calou e ninguém mais falou sobre o assunto.
Antes disso, pelos idos de 2009, a Polícia Militar apreendeu um tambor contendo 19 quilos de pasta de cocaína e meio quilo de crack, além de 13 cartuchos de pistola na fazenda de Aloísio Nunes, ministro das relações exteriores. O delegado, na ocasião, concluiu que o então senador foi vítima.
Domingo, 25, um avião bimotor, prefixo PT-IIJ, transportando 653 quilos de cocaína, foi interceptado pela Força Aérea Brasileira (FAB). Segundo o piloto, a aeronave decolou da fazenda Itamarati Norte com destino a Santo Antônio Leverger, no Mato Grosso.
Os veículos de informação logo divulgaram que a fazenda é uma propriedade arrendada pela empresa Amaggi, da família do ministro da agricultura, Blairo Maggi.
À noite, a FAB divulgou nota sobre o ocorrido, dando conta de que a palavra do piloto por si só não constituiria prova, o que é verdade. Porém, o que chama a atenção é o fato de que à FAB não competiria esse tipo de declaração, uma vez que cabe à Polícia Federal investigar o caso e só mais tarde, após a conclusão, divulgar os resultados. Soou como se a FAB, após ter percebido que mexeu com peixe grande, se arrependesse da apreensão.
Outro fato que chama a atenção é o fato de hoje, 27 de junho, enquanto escrevo, a notícia ter sumido da imprensa. Ninguém fala mais nisso!
Nestes tristes dias em que vivemos, quando um presidente é denunciado por corrupção, um senador da República que teve 51 milhões de votos na eleição presidencial recebeu propina e corre o risco de ser preso e grande parte do ministério e do congresso está sendo investigada na Operação Lava Jato, causa repulsa termos traficantes no Senado, justamente um dos poderes de maior relevância na estrutura política da Nação.
A PF acaba de concluir em tempo recorde a investigação sobre o local de decolagem do avião. Adivinhem: não foi da fazenda de Maggi. Causa indignação perceber a operação abafa que já está em curso.
E tenho que frisar veementemente que isso é um fato gravíssimo!
A República NÃO PODE ser entregue a bandidos e traficantes! Em qualquer país com um mínimo de decência e civilidade, o povo já teria saído às ruas e derrubado esse governo.
Não há dúvidas de que Blairo Maggi sequer será investigado, afinal, como já é a segunda vez que o poder é pego com a boca na botija, o caso será tratado como banalidade.
É este justamente o perigo que corremos. O de começarmos a encarar tudo como banalidades.
Até que nos tornemos indiferentes e tolerantes à corrupção.
