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HISTÓRIA DE LUTAS

PCdoB: 102 anos em defesa da democracia, dos direitos sociais e do Brasil

Por Dalton Macambira

Segunda - 29/04/2024 às 10:45



Foto: Site do PCdoB PCdoB festeja seus 102 anos de fundação
PCdoB festeja seus 102 anos de fundação

No início do século XX o mundo passava por grandes transformações. O sistema capitalista, sobretudo as grandes potências, em busca de mercados para expandir o comércio, como desdobramento da Revolução Industrial, e na busca por lucros cada vez maiores, no plano interno elevava ao máximo a exploração dos trabalhadores e, no plano externo, acelerava o acirramento das tensões diplomáticas que, uma vez fracassadas, conduziram à eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), catástrofe nunca vista na história.

Nesse contexto, de fragilidade das principais nações envolvidos no conflito e a luta dos trabalhadores por melhores condições de vida e trabalho, eclodiram movimentos revolucionários por toda parte, cujo destaque é o advento da Revolução Russa de 1917, cuja vitória influenciará de forma decisiva no surgimento de Partidos Comunistas em todo o mundo, inclusive no Brasil.

Nessa época, em que o desenvolvimento industrial ainda era bastante insipiente, em função da tardia medida que levou ao fim da escravidão (1888) e a conservadora transição da Monarquia para a República (1889), que havia reforçado oligarquias regionais e um poder central dominado pelas elites paulista (café) e mineira (pecuária), o jovem movimento operário sofria forte influência do anarquismo, incapaz de conduzir a luta dos trabalhadores para um patamar superior, mesmo após as importantes greves de 1917, não aceitava a criação de um partido político e reduzia a luta ao plano econômico, isto é, a pauta era basicamente pelo aumento salarial e por melhores condições de trabalho.

Foi nessa conjuntura, e em um ambiente de absoluta clandestinidade, que no dia 25 de março de 1922, há 102 anos, portanto, que foi fundado o Partido Comunista do Brasil (PCB), o primeiro partido de trabalhadores da história do país. Organizações políticas diversas, reunindo 73 lideranças operárias dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, elegeram 09 delegados para o Congresso de fundação do PCB, em Niterói: Astrojildo Pereira (jornalista), Cristiano Cordeiro (advogado), Joaquim Barbosa (alfaiate), Manuel Cendón (alfaiate), João da Costa Pimenta (gráfico), Luís Pérez (vassoureiro), Hemogêneo Fernandes da Silva (eletricista), Abílio Nequete (barbeiro) e José Elias da Silva (pedreiro).

O PCB nasce como uma organização muito pequena e com ideias bastante radicais, partindo do princípio de que capital e trabalho são inconciliáveis, defendia a revolução como única via de transformação da sociedade, inspirado no que ocorreu na Rússia em 1917 e na enorme agitação política e cultural da década de 1920 no país, como a Semana de Arte Moderna, a Revolta do 18 do Forte de Copacabana, o Tenentismo e a Coluna Prestes. Esse radicalismo levou o Partido a se ausentar da chamada “Revolução de 30”, processo que conduziu ao fim da República Velha, por entender, equivocadamente, que aquela luta era entre a aristocracia rural oligárquica e a burguesia industrial urbana.

Na verdade, o movimento armado de 1930 abriu caminho para o desenvolvimento do Brasil, sua industrialização e urbanização, permitindo o crescimento e o fortalecimento da classe operária, cujas lutas levaram a importantes conquistas trabalhistas e previdenciárias, como a lei do salário-mínimo, direito à férias e aposentadoria, regulamentação da jornada de trabalho e ao repouso semanal remunerado, entre outros, além da universalização do direito de voto, inclusive o das mulheres.

Na década de 1930, o Partido Comunista do Brasil (PCB) participou da construção da Aliança Nacional Libertadora (ANL), uma frente ampla que reunia a esquerda, democratas e progressistas, militares, operários e intelectuais, movimento caracterizado pela luta anti-imperialista, antifascista, em defesa da democracia, da soberania nacional e pela paz, em função das ameaças de mais uma guerra mundial. Os comunistas, sob a liderança de Luís Carlos Prestes, estiveram na linha de frente contra o golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo (1937-1945), que atingiu os principais quadros do Partido, muitos dos quais foram presos, torturados e mortos.

Com o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), mais catastrófica do que a primeira, a derrota do nazi-fascismo e a redemocratização do país, o PCB foi legalizado, chegando a lançar candidato a presidente da República, Iêdo Fiuza, que obteve 10% dos votos. Os comunistas também elegeram uma bancada para a Assembleia Nacional Constituinte (1946), elegendo 14 deputados e um senador, Luís Carlos Prestes (Rio de Janeiro – DF). A bancada de deputados comunistas era formada por operários, lideranças populares e sindicais, médicos e escritores, quais sejam: Carlos Marighela (Bahia); Agostinho de Oliveira, Alcedo Coutinho e Gregório Bezerra (Pernambuco); Batista Neto, João Amazonas e Maurício Grabois (RJ – DF); Alcides Sabença e Claudino Silva (Rio de Janeiro); Caires de Brito, Jorge Amado, José Maria Crispim e Osvaldo Pacheco (São Paulo); e Abílio Fernandes (Rio Grande do Sul).

A redemocratização no Brasil (1945–1964) enfrentaria várias limitações em função do caráter conservador do parlamento brasileiro e do governo Dutra e seu alinhamento subserviente aos interesses norte-americanos, bem como o clima de Guerra Fria que polarizou as relações internacionais entre os EUA e a União Soviética (1945–1989). Esse ambiente levou a cassação do registro do PCB e dos mandatos de toda a bancada comunista no Congresso Nacional e o Partido foi novamente para a clandestinidade.

No plano internacional, a expansão e a consolidação do bloco socialista e a vitória da revolução na China (1949) contrastava e ao mesmo tempo reforçava o processo que levou à ilegalidade do PCB. A divisão do movimento comunista internacional após a morte de Stálin (1956), líder comunista que derrotou Hitler e transformou a URSS em potência, capaz de rivalizar com os EUA nos planos econômico e militar, também provocou um racha no PCB. Em 1962, uma parte do Partido, sob a liderança de Prestes, alterou o nome para Partido Comunista Brasileiro e manteve a sigla (PCB) de fundação do Partido, enquanto a outra ala, sob o comando de João Amazonas, mudou a sigla partidária para PCdoB, mas manteve o nome original de 1922: Partido Comunista do Brasil.

Com o golpe militar de primeiro de abril de 1964, que completa 60 anos, de triste memória, depois de mais de 40 anos como a principal referência dos trabalhadores brasileiros, os comunistas são incansavelmente perseguidos e têm suas principais lideranças presas, torturadas e brutalmente assassinadas. Com a repressão atingindo principalmente as cidades, o PCdoB buscou se organizar no campo. A descoberta desse movimento daria origem a Guerrilha do Araguaia (1967–1974). Mesmo após a anistia (1979), e tendo uma participação importante na luta pela redemocratização, como as Diretas Já (1984–1985), não tiveram o direito de atuar na legalidade, o que somente ocorreria plenamente após a aprovação da Constituição de 1988.

O período de democracia mais duradouro da história do Brasil (1985–2016), período que o Partido cresceu e voltou a ter uma bancada com o seu nome no Congresso Nacional, coincide também com o tempo de atuação legal do PCdoB. Após ter participação destacada na luta pelo impeachment de Collor e estar na linha de frente contra a política neoliberal de FHC, os comunistas participaram dos governos democráticos e populares de Lula (2003-2010) e Dilma (2011-2016) e atuaram firmemente nos movimentos populares contra o golpe de 2016 e contra a prisão ilegal e sem provas da principal liderança popular da história do Brasil. Estivemos na linha de frente da luta contra o governo golpista de Temer e do fascista Bolsonaro, bem como na histórica vitória das forças democráticas e populares em 2022.

No Piauí, o PCdoB participou de forma decisiva do movimento que derrotou a oligarquia, nas décadas de 1980 e 1990, atuando em frente ampla com outras forças políticas e sociais, tendo destacada participação no movimento popular e sindical. No plano institucional, elegeu parlamentares e participou de diversos governos, contribuindo para a democratização da sociedade e na formulação de políticas públicas que visam à redução das desigualdades e o alargamento dos horizontes da cidadania.

A marca do PCdoB, nessa sua história centenária, tem sido a luta incansável pelos direitos do povo mais pobre, dos trabalhadores, a defesa intransigente da democracia e de um desenvolvimento livre, independente e soberano do Brasil. Parabéns, PCdoB! VIVA o PCdoB!

Fontes das fotografias:

Estadão

Jornal do Nassif

(*) Dalton Melo Macambira é professor do Departamento de História da Universidade Federal do Piauí – UFPI e presidente da Fundação Maurício Grabois – Seção Piauí.

Redação

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