
O podcast Mulher Mais, do Portal Piauí Hoje, trouxe um dos debates mais urgentes de nosso tempo: a ética do cuidado como caminho para desmontar estruturas de violência , especialmente as que atingem mulheres negras. A jornalista Michele Sâmia e a ex-vereadora Rosário Bezerra conversaram com a filósofa, pesquisadora e escritora Ozeli Oliveira dos Santos, que trouxe para a mesa conceitos acadêmicos e vivências sobre a forma como raça, classe e gênero se juntam para oprimir.
A pesquisadora, uma das fundadoras da Rede Brasil Ricoeur, explicou que o cuidado começa da porta para dentro, referindo-se à importância de as mulheres se reconhecerem como sujeitos de direitos mesmo dentro de casa, local onde muitas vezes a violência se inicia e se naturaliza.
Gravação do Podcast "Mulher Mais"
Ela citou pensadoras como Angela Davis, Bell Hooks e Lélia Gonzalez para sustentar que a mulher negra vive o que Gonzalez chamou de asfixia social, uma sobreposição de violências que vai do ambiente doméstico ao espaço público, do preconceito velado à agressão explícita. Para Ozeli, é justamente aí que o cuidado se apresenta como antídoto. “É uma revolução ética”, definiu.
Quando você olha para o outro com solidariedade e respeito, você está praticando um ato que nega a lógica da violência.
Ozeli explica que esse cuidado não se trata de romantizar o papel cuidador historicamente imposto às mulheres. Pelo contrário, é sobre redistribuir essa responsabilidade como valor social coletivo. É o cuidado que vai desde as pequenas ações cotidianas, como ouvir, acolher, não reproduzir estereótipos, até a exigência de políticas públicas que protejam efetivamente as mulheres. Ela ressalta que é também, o cuidado como prática de autoestima e preservação da própria saúde mental em um mundo que constantemente as desumaniza.
Para a pesquisadora, o papel das políticas públicas nesse processo é essencial. "Não adianta apenas mudar individualmente se o Estado não assume sua responsabilidade. Precisamos de políticas que protejam efetivamente as mulheres, especialmente as negras e periféricas, com a garantia de casas-abrigo e delegacias especializadas, além de programas de emprego e renda que ajudam que elas se libertem de ciclos de violência"
Ela lembrou que é dever do poder público criar redes de proteção integradas.
Assim como a violência é estrutural, a proteção tem que ser estrutural. Precisamos de saúde pública que acolha, escolas que eduquem para o respeito, e um judiciário que realmente funcione para todas.
Assista o podcast completo aqui.