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Taxa de desemprego entre jovens negras é três vezes maior que a dos homens brancos

Estudo da organização Ação Educativa revelou dados alarmantes da Pnad Contínua de 2023

Da Redação

Quarta - 08/05/2024 às 09:11



Foto: Foto- Tânia Regô/Agência Brasil
Foto- Tânia Regô/Agência Brasil

No ano de 2023, foi observado que as jovens negras brasileiras, entre 18 e 29 anos, enfrentaram uma taxa de desemprego três vezes maior do que a dos homens brancos. Essa comparação foi feita pela organização Ação Educativa, utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2023. Os resultados foram publicados no relatório Mude com Elas, divulgado nesta quarta-feira (8).

Quando empregadas, essas jovens recebem uma renda 47% inferior à média nacional e quase três vezes menor que a dos homens brancos. Além disso, as mulheres negras dessa faixa etária dedicam quase o dobro de horas aos trabalhos domésticos em comparação com a média dos homens, sejam eles negros ou brancos.

Pamela Gama, uma jovem negra de 26 anos, residente na zona leste de São Paulo, compartilhou sua experiência pessoal que reflete os dados da pesquisa. Ela decidiu remover de seu currículo o link para um perfil de rede social de empregos que continha sua foto, na esperança de ser chamada para mais entrevistas.

“Eu coloquei o link do meu perfil e depois tirei porque eu não estava recebendo tantos convites para fazer entrevistas. Então eu pensei se não era melhor eu tirar, sabe?”, revelou a jovem formada em relações públicas, acrescentando que melhorou “um pouco” a convocação para entrevistas depois da mudança.

O projeto Mude com Elas mostrou que, em 2023, a taxa de desemprego entre as jovens negras foi de 18,3%, enquanto a dos homens brancos foi de 5,1%. A taxa de desemprego geral do país em 2023 foi de 7,4%. O salário médio da população em 2023 foi de R$ 2.982, mas para as jovens negras foi de apenas R$ 1.582. Comparado com os homens brancos, cuja renda média foi de R$ 4.270 em 2023, a diferença salarial é ainda mais acentuada.

Pamela relatou que conhece pessoas de sua idade e com formação semelhante que recebem salários mais altos. Ela expressou a dificuldade que sente para se recolocar no mercado e buscar novas oportunidades.

A informalidade também é mais prevalente entre as jovens negras, com 44% delas possuindo carteira assinada, uma porcentagem semelhante à dos jovens negros (43,3%). Em contraste, cerca de 50% dos jovens brancos, tanto homens quanto mulheres, possuem carteira assinada.

Além de receberem salários menores e enfrentarem taxas de desemprego mais altas, as jovens negras também são sobrecarregadas com trabalho doméstico. Elas dedicam 22 horas por semana a essas tarefas, enquanto a média para homens negros e brancos é de 11,7 horas por semana.

Pamela, que ajuda nos afazeres domésticos desde a adolescência, compartilhou que se sente sobrecarregada agora que seu marido trabalha fora de casa e ela está em teletrabalho. Ela descreveu a situação como se tivesse dois empregos.

O estudo concluiu que, apesar de as condições de trabalho terem melhorado desde a pandemia, o Brasil ainda não possui políticas públicas específicas para as jovens negras. Além disso, as empresas não têm um foco direcionado a essas mulheres, que são frequentemente preteridas em processos seletivos.

O acesso ao ensino superior também é menor entre as jovens negras. Em 2023, enquanto 39,8% das jovens brancas estavam frequentando ou haviam concluído o ensino superior, apenas 23,4% das jovens negras estavam na mesma situação. 

Herança escravocrata

A pesquisadora Andreia Alves, advocacy do projeto Mude com Elas, destacou que existe uma cultura que coloca a juventude nos espaços mais precários do mercado de trabalho. Porém, há um agravamento desse quadro quando se considera raça e gênero.

“É muito comum mulheres jovens negras que conseguem chegar a ocupar esse mercado de trabalho formal estarem em áreas que, na verdade, não vão aproveitar toda a sua capacidade. Então, normalmente, ela vai ocupar as piores áreas, os piores cargos, diferentes de pessoas não negras”, destacou.

Andreia Alves acrescentou que há uma herança, que vem do período escravocrata, que costuma colocar as jovens mulheres negras fora do mercado de trabalho, ocupando-as com o trabalho doméstico.

JOVENS NEGRAS TRABALHO - Andréia Alves. Foto: Arquivo PessoalPesquisadora Andréia Alves afirma que existe uma cultura que coloca a juventude nos espaços mais precários do mercado de trabalho. Foto: Arquivo pessoal

“Normalmente, os lugares onde essas mulheres moram são lugares muito distantes dos locais de trabalho. Então, essas jovens mulheres negras acabam sendo obrigadas a submeter aos cuidados, a fazer da casa, cuidar da alimentação e cuidar dos irmãos menores, porque os adultos da casa são também desses lugares de trabalho distantes”, completou.

Para Alves, o fundamental é ouvir esse público antes de construir políticas que minimizem essa desigualdade no mercado de trabalho. A especialista acrescenta que o aumento da educação formal superior de mulheres negras nos últimos anos não tem se refletido em mais espaço no mercado de trabalho. 

“Nos últimos 10 anos as mulheres negras ocuparam as universidades e têm se formado, têm se demonstrado, têm se estruturado, mas isso não tem sido suficiente para fazer modificações significativas no mercado de trabalho. Principalmente quando a gente fala sobre ocupação de cargos de liderança”, completou.

Fonte: Agência Brasil

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