Proa & Prosa

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Passagem, 20 de janeiro de 1820

Era 20 de janeiro de 1820 e o festejo do Padroeiro da Passagem teve uma novidade

Fonseca Neto

Sábado - 25/01/2020 às 12:39



Foto: Divulgação Santo Guerreiro da boa causa São Sebastião
Santo Guerreiro da boa causa São Sebastião

Escrevo esta nota, justo neste dia, para puxar do fundo dos tempos uma história que parece uma fábula, ainda que bastante conhecido o sentido maior do protagonismo que revela: a origem de uma cidade, a cabeça de uma dada sociedade política. Quero extrair com essa escrita as suas particularidades.

Era 20 de janeiro de 1820 e o festejo do Padroeiro da Passagem teve uma novidade: os moradores e devotos do Santo do Dia, São Sebastião, resolveram então iniciar a construção de uma igreja-templo no lugar. Aqueles povoadores coloniais da Passagem, na Freguesia de São Bento dos Pastos Bons, certamente sabiam que o Santoral católico e os mais antigos registros do cristianismo indicam como sendo o dia 20 aquele em que Sebastião foi morto e já no ano de 354, a “Depositio Martyrum” aponta essa coma a data para se recordar o Mártir.  

Sebastião, membro da guarda imperial romana convertido em Cristo, teve sua morte determinada por acusação de servir a Jesus mais que ao Império e ao imperador. A exemplo de Sebastião, muitos convertidos foram então por isso condenados. A Igreja cristã os têm como santos mártires. E a própria cidade de Roma e o Império que encabeçava, a partir do século seguinte, assumiriam a religião inspirada na mensagem cristã.   

A Lusitânia, colônia romana da península atlântica, assim se tornará cristã, e um milênio depois, este continente de além Oceano Atlântico sul tropical, também conhecerá o cristianismo (ano de 1500), chegando ao vale do Inhumas, mais ou menos, desde 1740. Entre os santos do devocionário de algum sesmeiro de terras do lugar, provavelmente Francisco Pereira Franco, passou-se a festejar na Passagem exatamente o Mártir da Roma imperial, São Sebastião. Aliás, um santo popular não somente em Roma e Europa cristãs, mas em toda a América portuguesa. A cidade do Rio de Janeiro foi a ele dedicada ainda no primeiro século do domínio colonial do futuro Brasil.

Em 1820, a povoação da Passagem era ainda muito pequena, mas com uma evolução significativa: desde 1760 teve o seu vale original – do riacho Inhumas – cortado pela abertura de uma histórica estrada real que, no rumo Norte, a ligava a São Luís, pelas Aldeias Altas (depois Caxias) e nas outras direções, interligava a povoação nascente ao restante do Maranhão e Brasil. Estrada intencionalmente integradora, consoante a política do reinado do rei José I, de Portugal, e seu primeiro-ministro, conde de Oeiras (depois Marquês de Pombal). O nome desse conde? Sebastião José de Carvalho e Melo. Com efeito, nada improvável que os primeiros moradores da Passagem das Inhumas o tenham homenageado escolhendo como Padroeiro o Santo Sebastião.

Essa estrada permite então que sesmeiros de terra se apossem do vale do Inhumas mais rapidamente. Aliás, sua construção vem articulada numa política de regulação mais incisiva da vida dos grupos humanos ali existentes, a exemplo dos Aranhins, que seriam submetidos pela economia “branca” e muitos migrassem para as matas na outra margem do rio Itapecuru. Fato é que, entre Pastos Bons, Julgado e Vila, e São Luís, pela Passagem, estabeleceu-se uma via de muito uso, por pessoas e cargas, e também por boiadas, escoando em direção ao litoral norte, para a ilha-capital, e Parnaíba, no Piauí.

Sessenta anos depois da estrada real – exato em 1820 –, a Passagem crescera e seus moradores começaram a construir a referida capela do lugar, dedicada a Sebastião, o santo que já celebravam, como Padroeiro comum. E já pensavam em solicitar sua distritalização como Freguesia, separada da que pertenceram até então. Conseguem, sim, ser Freguesia separada da de São Bento, de Pastos Bons, porém, com sede numa feitoria recém fundada, na beira do Itapecuru, chamada de Almeida d’El-Rei. Freguesia que teria sua sede transferida para a povoação da Passagem, quinze anos depois, em 1835, já oficialmente chamada de Passagem Franca. Em 1829 os passagenses haviam peticionado nesse sentido ao Conselho Geral da Província.

Fato é que, naquele 1820, a povoação e futura cidade de Passagem Franca funda, erguendo sua igreja-templo, uma capela, e na prática instaura uma freguesia dando ao lugar sentido de vida comunitária. 

Esses episódios cívicos ocorreram há exatos duzentos anos, elaborados em décadas anteriores, e secundados nos dois séculos seguintes. Sede oficial de Freguesia em 1835, torna-se também município da Passagem Franca a partir de 1838.

Quando da fundação da primeira capela, 1820, o Brasil era um Reino Unido a Portugal e Algarves, rei João VI, e o Estado do Maranhão governado por Bernardo da Silveira Pinto da Fonseca.  

Fonte: Fonseca Neto, da APL.

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Fonseca Neto

FONSECA NETO, professor, articulista, advogado. Maranhense por natural e piauiense por querer de legítima lei. Formação acadêmica em História, Direito e Ciências Sociais. Doutorado em Políticas Públicas. Da Academia Piauiense de Letras, na Cadeira 1. Das Academias de Passagem Franca e Pastos Bons. Do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

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