Olhe Direito!

Olhe Direito!

RECURSOS NATURAIS

Vamos pensar nos peixes?

Alvaro o Mota

Segunda - 17/11/2025 às 19:17



Foto: Rio Parnaíba
Rio Parnaíba

O Brasil é o detentor das maiores reservas de água doce do mundo, ou seja, temos gigantescos sistemas hidrográficos que nos garante, por consequência, uma das mais diversas faunas fluvial e lacustre do planeta, ou mais diretamente, a gente tem uma quase infindável variedade de peixes de água doce. Olhando só para nosso pedaço de Brasil, o Piauí, com sua gigantesca bacia hidrográfica do Parnaíba, poderemos perceber uma variedade de peixes, de escama, de couro, herbívoros, carnívoras, grandes, médios, pequenos...

Com tantos peixes assim, espalhados nos seus biomas – amazônico, cerrado, caatinga, pampas – deveria o Brasil cuidar melhor desse tesouro natural e genômico, como se diz muito agora graças à pesquisa genética. Aparentemente, porém, o país cuida menos bem do que deveria dos peixes, sobretudo em ambientes naturais.

É certo que o país tenha legislação de biossegurança, que consiste em uma série de protocolos para impedir que avancem sobre fauna, flora, agricultura e pecuária os vetores de desequilíbrio que na natureza podem resultar em desequilíbrio e extinção de espécies e na agroeconomia, em perdas que podem ser medidas em bilhões de reais.

É de se imaginar, então, que o país tenha ao longo dos tempos se preocupado em colocar a biossegurança em prática – mas não é bem assim, infelizmente. Para peixes que os estudiosos chamam de endêmicos, ou seja, que somente existem em determinadas áreas ou regiões do país, há mesmo o risco de extinção. No Piauí, por exemplo, estão sob risco de desaparecer algumas espécies de peixes de couro da grande família dos bagres, como o matrinxã, o mandubé, o fidalgo e os mandis – dourado, gato, cabeça-de-cavalo –, bico-de-pato, branquinho, piratinga e surubim.

A afirmação sobre o risco de desaparecimento desses peixes de couro – bem como de outros, de escama – dos rios piauienses pode parecer alarmante e desarrazoada, posto que se existem estudos científicos que a corroborem, devo confessar desconhecimento quanto a ele. Porém, baseio tal assertiva na observação de quem, sendo morador de uma cidade banhada por dois rios, vi ao longo do tempo esses peixes se tornarem cada vez mais raras, na mesma medida em que se ampliava a oferta de espécies não nativas de nossa hidrografia, como a tilápia (africana), o tambaqui (amazônico) e o panga (asiático).

A proliferação da oferta de peixes não nativos produzidos em cativeiro é, em si, uma questão de biossegurança. A soltura dessas espécies em no habitat tem por resultado desequilíbrio ambiental, com risco à existência dos peixes nativos. Isso certamente justifica que existam menos peixes endêmicos da bacia do Parnaíba e que proliferam nela espécies não nativas como tilápia, tambaqui e até pirarucu, um peixe amazônico.

Se peixes não nativos nas diversas bacias hidrográficas brasileiras proliferam a ponto de ameaçar as espécies nativas ou endêmicas, fica evidente que problemas ambientais contribuíram para tanto – o que inclui além da devastação de matas ciliares e do assoreamento, uma continuada omissão quanto à biossegurança para conservação e preservação das faunas aquáticas de rios e lagos.

Neste cenário, cabe a gente lembrar que o milagre de Cristo na multiplicação dos peixes, citado nos Evangelhos de Mateus, Lucas e João, deve ser tomado na atualidade, com aval da ciência, não somente para que se produzam mais peixes, mas para que se preservem as espécies nativas, essenciais para equilíbrio ambiental e garantia de segurança alimentar para o futuro.

Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.
Siga nas redes sociais

Compartilhe essa notícia: