Pode certamente haver uma confusão sobre o modo de atuar do Judiciário no Brasil, em que decisões monocráticas ou colegiadas, por seu caráter inovador ou avançado, tendem a ser logo tomadas por ativismo jurídico. O entendimento de magistrados e, sobretudo, de cortes colegiadas sobre temas controversos pode e deve ser analisado com o devido vagar, sem o risco de uma visão enviesada ou precária que o fragor da hora pode causar.
O primeiro fato a ser considerado em uma decisão judicial que inova e pode criar uma jurisprudência, por exemplo, é que magistrados podem arbitrar não conforme as suas convicções, mas no roteiro constitucional que orienta as decisões – e nesse escopo, evidentemente que pode se valer do bom senso e de orientações institucionais até exógenas, desde que acolhidas pela institucionalidade presente no exercício da magistratura.
Imaginemos uma situação fática que se relacione a uma ação judicial que preveja a preservação de uma espécie animal ou vegetal em um dos biomas existentes no Piauí – são pelo menos quatro. Como lidar com algo ao mesmo tempo tão específico (a preservação de uma espécie de ser vivo) e ao mesmo tempo tão heterodoxo, já que envolve outras espécies de seres vivos, interesses de comunidades e de empresas e uma relação entre biomas locais e de outros espaços territoriais?
O fato é que na proposta fática posta, há intersecção e colisão de direitos, muitas vezes não possíveis de tratar de modo objetivo na letra da lei, o que leva o magistrado em sua decisão a considerar, sempre sob o manto constitucional, aquilo que vai causar menos danos à sociedade ou resultar em medida que garanta a menor perda possível a todos. Assim, se não tem o magistrado um diploma legal garantidor desse acordo social menos danoso às partes, a ele caberá decidir de tal modo, na conformidade da Constituição, orientado pelo bom senso e até mesmo por medidas legais similares tomadas em outras nações.
Ao atuar desta maneira, frise-se, um magistrado não estaria agindo no que se tem colocado como ativismo jurídico. Ser inovador é bem menos que isso, de acordo, aliás, com que prescreveu o próprio Conselho Nacional de Justiça ao propor Resolução nº. 395, de 07 de junho de 2021, que instituiu a política de gestão da inovação no âmbito do Poder Judiciário, que orienta para a “implementação de ideias que criam uma forma de atuação e geram valor para o Poder Judiciário, seja por meio de novos produtos, serviços, processos de trabalho, ou uma maneira diferente e eficaz de solucionar problemas complexos encontrados no desenvolvimento das atividades que lhe são afetas”.

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