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As vaias na política


Ulisses Guimarães

Ulisses Guimarães Foto: Folha uol

O inolvidável político Ulysses Guimarães do então combativo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) - mais conhecido na historiografia política brasileira como “senhor diretas”, que liderou a oposição ao regime militar no Brasil (1964-1985) - costumava dizer aos políticos recalcitrantes: “ouçam a voz rouca das ruas”, em referência aos movimentos de redemocratização do País nos estertores do regime militar e em favor da anistia do Brasil. Naquela época, o povo brasileiro inundava as praças públicas buscando a democracia para comandar os seus próprios destinos, conquistar os seus direitos e garantias fundamentais e também escolher de forma livre e consciente os seus legítimos representantes.

Os brasileiros conquistaram a sua cidadania a duras penas, daí o atual Estado Democrático de Direito que o País vive. Depois de quase trinta anos, a frase do “senhor diretas” continua vivendo, só que agora em sentido diferente de outrora, qual seja, o da cobrança da população aos governantes que, no exercício do mandato, não correspondem com o ideário que lhes foi confiado. Trocando em miúdos, como a democracia pátria está em constante evolução, ou seja, em maturação das suas instituições, ainda se apresentam nos pleitos eleitorais alguns “salvadores da pátria” que, bem apoiados partidariamente, assumem o lugar dos que verdadeiramente deveram lograr êxito pelos bons propósitos para com a coletividade.

Nesse claro-escuro, as vaias e protestos querem dizer nada mais nada menos que o governante está mal no seu governo, por não cumprir com a mínima expectativa gerada na campanha eleitoral, de forma que o povo não espera mais nada da sua administração. Por antecipação, rompeu-se, por parte do povo, a relação de confiança existente entre ambos. E a população sinaliza que o governo, na sua conduta administrativa, já se esgotou, apesar de ainda perdurar algum tempo para a conclusão do mandato. Tempo este que, no sistema parlamentarista, também deixaria de existir pelo fato de a governabilidade cair em desgraça perante as representatividades populares.

Mas estamos no Brasil e, no nosso sistema, tolera-se o resto do mandato dos maus governos. Restante que só faz piorar a situação, ou melhor, só o faz ganhar mais vaias. E assim desperta inconformismo ainda maior para se buscar o melhor caminho a ser trilhado. O lado bom é a massa crítica criada em certos segmentos sociais, que passará a exigir mais qualificativos dos governantes. E aqueles que tiverem a oportunidade consagrada pela população e brincarem no poder, vão ficar para trás - como exemplos a não serem seguidos - e mais cedo ou mais tarde sofrerão o ostracismo das urnas pelo tempo desperdiçado nos seus governos, por não realizarem as transformações que o Estado necessita para sair do marasmo que geralmente deixam submergir.

Daí a vantagem democrática. Democracia que está cada vez mais aprimorando no Brasil. Em que o povo descontente com os que prometem e não fazem sejam recebidos com vaias e protestos pela população em demonstração que não cabe mais a convivência política com manda-chuvas que acham que não devem dar satisfação da sua governança. Convém lembrar que ela nunca lhes pertenceu, pois pertence tão-somente ao povo, que deve livremente escolher seus representantes. Em não acontecendo assim, devem prestar contas à Justiça Eleitoral, como atualmente ocorre com denúncias de irregularidades praticadas por certos eleitos. Vaias são o sintoma do fracasso, da precariedade e/ou da ruindade do governo, qualquer governo.

Fonte: Deusval Lacerda

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Deusval Lacerda

Deusval Lacerda

Deusval Lacerda é natural de São João do Piauí. É economista e advogado.
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