Há duas semanas sem poder realizar a atividade de onde tiram o sustento de suas famílias, os pescadores do bairro Por Enquanto, localizado na zona Norte de Teresina, estimam prejuízo que varia de R$ 500 a mil reais para cada em função dos últimos 14 dias parados.
A informação foi confirmada na manhã deste sábado (09), por integrantes do Sindicato dos Pescadores do Estado, durante a ‘Poty Vivo’, ação em defesa do aquífero realizada pela Rede Ambiental do Piauí (Reapi), que reuniu além dos ribeirinhos, ambientalistas, artistas, representantes da sociedade civil, do Clube dos Remos, da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Piauí (OAB-PI), do Movimento Nacional pelos Direitos Humanos e a imprensa local, representada pela equipe do Piauihoje.com.
Segundo Rômulo Silvestre, para todo peixe pescado já há um cliente certo aguardando a encomenda. “Tem um rapaz que pega o peixe todo dia cinco horas da manhã, ele tem uns locais onde distribui, vende nas banquinhas das estradas”, diz.
Branquinha e Sambuda estão entre os mais conhecidos e rentáveis. “Os peixes aqui da área é a branquinha e a sambuda, que a gente chama de curimatã. De um [unidade] a gente vende a dez reais, mas no atacado a gente vende a R$ 6,50”, informa.
No entanto, a pausa na pescaria tem um motivo que é visível para toda a cidade. O rio Poti está tomado por aguapés, principalmente no trajeto urbano que vai do bairro Ilhotas, cercado por apartamentos, e Parque Floresta Fóssil, em frente ao Teresina Shopping, na zona Leste, passa pela Câmara Municipal de Teresina, Assembleia Legislativa do Piauí e vai até o Monumento ao motorista Gregório, nas proximidades do Shopping Rio Poty, localizado na Avenida Marechal Castelo Branco. O tapete verde formado pela vegetação impede a navegabilidade.
“Aguapés são nativos desse ecossistema, é esperado encontrá-los, contudo, o que a gente observa agora é que devido a mudança das características ambientais, principalmente pelo aporte irregular e exagerado de matéria orgânica no rio que vem do esgoto, isso está promovendo um crescimento desordenado da vegetação”, explica o biólogo e professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Davi Pantoja.
De uma ponta a outra do percurso citado acima, há três pontes interligando as regiões da cidade, sendo a Ponte Juscelino Kubitschek, a Ponte Estaiada e a Ponte da Primavera. Apenas embaixo desta, o tapete de aguapés não tomou conta do espelho d’água do rio Poti.
“Os aguapés, na verdade, fazem um trabalho muito importante de despoluição, mas eles também sinalizam uma situação crítica, a sua presença impacta nos organismos, consumindo oxigênio da água, todos os organismos aeróbicos, entre eles os peixes, sofrem muito e tendem a morrer em curto e médio prazo”, esclareceu.
SEGURO DEFESO
Não bastasse a preocupação com a poluição no rio e com a pescaria paralisada, os pescadores temem o atraso no repasse do Seguro Defeso com a aproximação da Piracema, período em que os peixes sobem o rio para desovar e reproduzir e a atividade da pesca fica proibida por lei.
Sem poder trabalhar em meio a reprodução dos peixes, o Governo Federal, através do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), paga um salário mínimo aos pescadores durante essa época.
“Piracema começa dia 15 de novembro e termina dia 15 de março, a gente tem que parar para que o peixe se reproduza, mas só que nesse meio tempo a gente devia receber certinho, ele [seguro] não é repassado certinho”, relata o pescador Edvaldo Pereira, que tem irmão e filho que também dependem do trabalho de pescaria e do benefício.
POTY VIVO
Dentro da programação da ação Poty Vivo, que teve por objetivo encarar as águas poluídas do rio Poti para conscientizar a sociedade e autoridades públicas, estava prevista a realização de um circuito saindo do Parque Floresta Fóssil até o Parque Meus Filhos, na Avenida Raul Lopes, com o uso de embarcações como canoas e caiaques. Contudo, a saída a partir da Floresta Fóssil foi inviabilizada devido a forte presença de aguapés na calha do rio.
“Aconteceu que os aguapés não permitiram a entrada das canoas de lá [da Floresta Fóssil], então os pescadores, com suas experiências e um plano B, nos indicaram sair do monumento ao [motorista] Gregório”, informou Tânia Martins, coordenadora da Reapi.
Mesmo sendo feita a adaptação no trajeto, a dificuldade para os canoeiros ainda se mostrou grande. A bordo das canoas, os passageiros que participaram da ação tiveram de tentar manobras arriscadas para empunhar faixas e cartazes com apelos de protesto a favor do Poti.
“A gente fez um percurso pelo rio junto com pescadores daqui da região e pôde vivenciar a dificuldade que é manejar as embarcações com essa enorme quantidade de aguapés, é um esforço anormal para a atividade da pesca na presença desses aguapés”, disse Davi.
Chegando ao Parque Meus Filhos, os presentes participaram de uma roda de conversas, onde discutiram ações e soluções para sensibilizar ainda mais a sociedade e o poder público no tocante à poluição do rio.
“É mais um chamado para a sociedade civil, para que ela se empodere da cidade, para que se empodere do rio que é nosso, pois precisamos dele para sobreviver. Ao longo da nossa história a gente sempre denunciou esse caso, existe ação civil pública no Ministério Público do Piauí, todos os anos a gente aproveita esse momento quando o rio não tem como respirar, não tem qualidade na água para que a gente grite novamente, já fizemos mais de dez protestos”, confessa Tânia.
“Nosso objetivo é provocar a Justiça Estadual e a Justiça Federal para que eles digam quem são as pessoas que estão poluindo o rio, pois o rio é para a gente nadar, banhar, se refrescar e não fazer plantio hidropônico, os nossos representantes políticos vão ter que cuidar dessa responsabilidade porque se não vamos pra justiça pedir indenizações milionárias para com o dinheiro a gente despoluir o rio, o meio ambiente saudável é um direito do cidadão”, considerou Conceição Araújo, articuladora do Movimento Nacional pelos Direitos Humanos no Piauí.
PARQUE MEUS FILHOS
Sérgio Araújo é proprietário do Parque Meus Filhos, espaço voltado ao lazer e ao meio ambiente. O espaço fica próximo à Universidade Federal do Piauí (UFPI). Para o empresário, o despejo de esgotos e matérias orgânicas provocando o surgimento desordenado dos aguapés é motivo de tristeza.
“A gente fica muito decepcionado, é triste porque a um tempo atrás a gente até mesmo tomava banho, era o lazer de muitas pessoas e hoje isso não é mais possível, sem contar os danos para o meio ambiente”, comentou.
No parque foi construído um píer que dá acesso direto ao Poti. “Desde o início desse espaço que o concebemos de uma forma que as pessoas pudessem ter uma vista do rio, fizemos formas de chegar e ver de perto, assim as pessoas podem perceber e denunciar o descaso com o rio”, disse.
OAB-PI
Presente ao ato, a presidente da Comissão de Proteção e Defesa dos Animais da OAB PI, Juliana Paz, considerou provocar via Ordem dos Advogados as pastas de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Prefeitura e Governo para obter informações sobre a fiscalização realizada por estes órgãos.
“Acredito que nesse momento podemos contatar as duas secretarias, tanto a Semar como a Semam, saber se já têm feito algum estudo para identificar o que está acontecendo com o rio, identificar o porquê de tanto aguapé e a partir daí, observar se está tendo omissão na fiscalização e propor alguma ação para que seja cumprida essa fiscalização”, afirmou.