Economia

BRICS

Dilma Rousseff alerta para o endividamento dos países em desenvolvimento

“Para os países em desenvolvimento, a dívida é um fardo excessivo”, apontou a presidente do Banco dos BRICS.

Da Redação

Sexta - 30/08/2024 às 10:49



Foto: Divulgação 9ª reunião anual do conselho de governadores do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD)
9ª reunião anual do conselho de governadores do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD)

No 9º Encontro Anual do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o Banco dos BRICS, a presidente da instituição, Dilma Rousseff, disse que as nações mais ricas concentram o fluxo de recursos disponíveis no mercado mundial, deixando o Sul Global em dificuldades para enfrentar a desigualdade, a pobreza, a infraestrutura inadequada e viabilizar o maior acesso à educação, saúde e habitação. “Para os países em desenvolvimento, a dívida é um fardo excessivo”, apontou.

A presidenta do Banco dos BRICS alertou para as dificuldades crescentes dos países do Sul Global, em discurso para autoridades financeiras do bloco dos países BRICS, realizado nesta sexta-feira (30), na Cidade do Cabo, na África do Sul. Ela disse que a maior parte dos países do mundo têm grandes dificuldades para assegurar um desenvolvimento sustentável e adequado. E declarou que isso ocorre justamente quando os recursos disponíveis no mercado global estão concentrados no financiamento das dívidas dos países ricos. “Parece improvável mobilizar mais investimentos para o desenvolvimento sustentável sem enfrentar a questão da dívida”, disse a ex-presidente do Brasil, durante abertura da 9ª reunião anual do conselho de governadores do Novo Banco de Desenvolvimento. O tema central do encontro do NBD, que reúne autoridades financeiras dos cinco países do BRICS e mais Bangladesh, Egito e Emirados Árabes Unidos este ano na África do Sul, é “Investindo em um Futuro Sustentável”.

Em seu discurso de abertura do encontro dos ministros das Finanças dos oito países, Dilma lembrou que as dez maiores economias desenvolvidas têm uma dívida combinada de US$ 87 trilhões, de acordo com estimativas do Banco Mundial. “Financiar tais dívidas públicas elevadas consome uma parte significativa da enorme liquidez disponível nos mercados internacionais”, ressaltou. “Essa liquidez poderia, de outra forma, ser canalizada para financiar a dívida de países em desenvolvimento e assegurar os investimentos para um desenvolvimento sustentado”. Segundo Dilma, para superar os grandes desafios — desigualdade, pobreza, infraestrutura inadequada e acesso escasso à educação, saúde e habitação — é necessário, em primeiro lugar, canalizar a liquidez internacional para os países em desenvolvimento e reduzir o peso das altas taxas de juros. E apontar alternativas como o financiamento em moeda local para ampliar o espaço fiscal para investir.

A presidente do Banco dos BRICS, criado em 2014, alertou para os imensos desafios das nações do Sul Global. “A dívida dos países em desenvolvimento está crescendo muito e muito rápido”, disse. “O espaço fiscal é essencial para garantir que os governos possam investir simultaneamente em ações de desenvolvimento, combater as mudanças climáticas e alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)". De acordo com Dilma, o investimento em um futuro sustentável está no cerne das atividades do Banco dos BRICS, cuja sede é em Xangai, na China, e é considerada uma das prioridades mais importantes para a comunidade internacional. “Isso está baseado na ideia de que o crescimento econômico, a inclusão social e a proteção ambiental estão interconectados e devem ser perseguidos simultaneamente”, lembrou.

“Mercados emergentes e países em desenvolvimento enfrentam desafios significativos para alcançar o desenvolvimento sustentável. Para nós, a transição justa exige um enorme volume de recursos e financiamento de longo prazo”, disse. Ela lembrou no discurso que os pagamentos de juros nos países em desenvolvimento aumentaram mais rapidamente do que os gastos públicos com infraestrutura, saúde, educação e habitação na última década. “Choques externos, como o aumento das taxas de juros nos mercados internacionais e as desvalorizações excessivas de suas moedas, acabam alimentando um ciclo vicioso de endividamento”, ressaltou. “O desajuste entre a dívida em moeda forte e a receita gerada pelos projetos cria uma barreira para o investimento nas economias em desenvolvimento”.

Dilma declarou ainda que o NBD tem atuado para diversificar as fontes de financiamento e usar uma cesta de moedas para financiar projetos nos países membros. “O uso de moeda local é uma opção estratégica. A disponibilidade de crédito em moeda local e/ou swaps de moeda ajuda a enfrentar a exposição aos riscos cambiais e de taxa de juros”, disse. A presidente declarou que o banco está implementando plataformas orientadas para o desenvolvimento sustentável em moeda local e reconhece a urgência de tornar o financiamento verde disponível para os países membros. “Queremos fornecer 30% do financiamento total em moedas locais dos membros tomadores”, disse Dilma. “Nesta reunião anual, os desafios da transição justa e do financiamento para o desenvolvimento estão em destaque”, concluiu.

Leia a íntegra do discurso de Dilma Rousseff:

9ª REUNIÃO ANUAL DO CONSELHO DE GOVERNADORES DO NOVO BANCO DE DESENVOLVIMENTO

"Em nome do Novo Banco de Desenvolvimento, gostaria de agradecer calorosamente ao Vice-Presidente Paul Mashatile e ao Governo da África do Sul por nos receber na bela cidade de Cabo.Também gostaria de cumprimentar todas as autoridades, representantes dos nossos países-membros, organizações internacionais, bancos multilaterais de desenvolvimento e líderes empresariais presentes nesta sessão de abertura da 9ª Reunião Anual do NDB.

O tema central desta reunião — “Investindo em um Futuro Sustentável” — está no cerne das atividades do Banco e é uma das prioridades mais importantes para a comunidade internacional. Isso está baseado na ideia de que o crescimento econômico, a inclusão social e a proteção ambiental estão interconectados e devem ser perseguidos simultaneamente. Esse é o significado do desenvolvimento sustentável. Essa visão foi cristalizada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas de 2015, que fornecem um quadro abrangente para enfrentar esse desafio global.

Para nossos países, o desenvolvimento econômico sustentável também exige uma base industrial e capacidade em ciência, tecnologia e inovação que contribua para a expansão da produtividade e a criação de melhores empregos. Também requer colaboração entre governos, empresas e indivíduos para criar sistemas que sejam economicamente viáveis e ambientalmente amigáveis. Por outro lado, mudanças sistêmicas, especialmente na arquitetura financeira internacional, são urgentemente necessárias.

Como sabemos, mercados emergentes e países em desenvolvimento enfrentam desafios significativos para alcançar o desenvolvimento sustentável, como desigualdade, pobreza extrema, infraestrutura inadequada e acesso insuficiente à educação, saúde e habitação. Para nós, a transição justa exige um enorme volume de recursos e financiamento de longo prazo.

No entanto, parece improvável mobilizar mais investimentos para o desenvolvimento sustentável sem enfrentar a questão da dívida. De acordo com estimativas do Banco Mundial, as dez economias desenvolvidas do planeta têm uma dívida combinada de cerca de US$ 87 trilhões. Financiar tais dívidas públicas elevadas consome uma parte significativa da enorme liquidez disponível nos mercados internacionais. Essa liquidez poderia, de outra forma, ser canalizada para financiar a dívida de países em desenvolvimento e, assegurar os investimentos necessários para um desenvolvimento sustentado.

Para os países em desenvolvimento, a dívida torna-se um fardo excessivo. Como sabemos, o espaço fiscal é essencial para garantir que os governos possam investir simultaneamente em ações de desenvolvimento, combater as mudanças climáticas e alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). No entanto, a dívida dos países em desenvolvimento está crescendo muito e muito rápido.

Por exemplo, os pagamentos de juros nos países em desenvolvimento aumentaram mais rapidamente do que os gastos públicos com infraestrutura, saúde, educação e habitação na última década. Choques externos, como o aumento das taxas de juros nos mercados internacionais e as desvalorizações excessivas de suas moedas, acabam alimentando um ciclo vicioso de endividamento. O desajuste entre a dívida em moeda forte e a receita gerada pelos projetos cria uma barreira para o investimento soberano e não soberano nas economias em desenvolvimento.

Para isso, precisamos implementar duas ações: Em primeiro lugar, é necessário canalizar a liquidez internacional para os países em desenvolvimento e reduzir o peso das altas taxas de juros; Em segundo lugar, desenvolver alternativas como o financiamento em moeda local para ampliar o espaço fiscal para investir. Portanto, novas soluções financeiras são necessárias para mercados emergentes e países em desenvolvimento. Diversificar as fontes de financiamento e usar uma cesta de moedas mais ampla melhora a resiliência econômica contra choques associados às decisões de política monetária. Isso pode fortalecer a situação fiscal, possibilitando o financiamento de logística, infraestrutura social e digital, habitação, água e saneamento, educação e saúde.

O uso de moeda local é, portanto, uma opção estratégica. A disponibilidade de crédito em moeda local e/ou swaps de moeda ajuda a enfrentar a exposição aos riscos cambiais e de taxa de juros. O fato é que a moeda hegemônica tem dois papéis: um internacional e um doméstico. Quando os EUA enfrentam inflação, a política monetária é usada para aumentar as taxas de juros, criando muitos problemas para os mercados emergentes e países em desenvolvimento. Se a economia dos EUA precisar, eles podem usar um dólar forte, o que pode provocar um aumento da dívida nos países em desenvolvimento. A volatilidade é a regra, não a exceção. Ao promover transações em moedas locais, também facilitamos o crescimento do investimento, ajudando governos e o setor privado a superar o desajuste de fluxo de caixa entre projetos e financiamento. Essa abordagem proporciona maior previsibilidade e reduz os altos custos associados às necessidades de hedge. Essa é a razão pela qual expandir o uso de moedas locais é um dos principais objetivos estratégicos do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) para o período de 2022-2026. O banco está implementando plataformas orientadas para o desenvolvimento sustentável em moeda local e reconhece a urgência de tornar o financiamento verde disponível para os países membros. Portanto, busca fornecer 30% do financiamento total em moedas locais dos membros tomadores.

Nesta reunião anual, os desafios da transição justa e do financiamento para o desenvolvimento estão em destaque. Discussões e apresentações sobre sistemas financeiros inovadores para o desenvolvimento sustentável, perspectivas para investimentos sustentáveis e estratégias de financiamento em moeda local ocorrerão, bem como painéis de discussão instigantes e discursos de figuras proeminentes. Estou confiante de que teremos discussões particularmente frutíferas sobre esses temas e avançaremos tanto na compreensão quanto na prática do financiamento para o desenvolvimento sustentável.

Gostaria de agradecer a todos novamente por estarem aqui com a equipe do NDB em nosso nono ano de existência. Tenho certeza de que o evento será um sucesso. Muito obrigada.

Fonte: Brasil 247

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