Proa & Prosa

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Itinerários da excelsa mestria

Dele, não há porque chorar a falta; há muito a realçar o legado. Realçar as marcas de seus diversos

Fonseca Neto

Segunda - 24/07/2023 às 21:26



Foto: Divulgação Coruja
Coruja

Celso Barros Coelho se despede dos eitos terrenos e ascende às itinerâncias cósmicas insondáveis. Por aqui, um mestre no sentido pleno. Lá, uma espécie de menestrel roçando estrelas, cruzando rabo de cometa, errante, e de entre os planetas já sai daqui envolto nas artes de Vênus.

Ele inscreve sua presença física por 1 século, 1 ano, 2 meses e mais uma bonificação de 25 dias bissextos por força da calendarização gregoriana.

Dele, não há porque chorar a falta; há muito a realçar o legado. Realçar as marcas de seus diversos itinerários.

Anos passados, voltando à aldeia-seu-berço, Pastos Bons, testemunhei ser ele presenteado por uma obra que o pintava, na primeira idade, a tanger um carro de bois carregando madeira de construção. Um itinerário que é Celso saindo da zona rural e chegando na cidade já secular dos Pastos Bons. Também Itinerário que o conduz ao colo de sua tia Maria de Lourdes, que o apresenta as letras do alfabeto.

Letras são desde então o sinal indicador dos seus itinerários pelo século seguinte. Aos 9 anos – 1931 – sai de Pastos Bons rumo a Picos (hj. Colinas), itinerância com o pai, que ali conseguira um emprego de vareiro no rio Itapecuru; Picos, pequena meca, e Celso-estudante inaugura, ali, a escola “João Pessoa”. Aprende muito e não mais se apaga de sua mente, tal Heloísa de Gusmão, em Pastos Bons, a beleza apaixonante da professora.

Outra reviravolta em sua vida e seu itinerário, o leva, de novo e sob os auspícios parentais, a deixar Pastos Bons, e deslocar-se para Benedito Leite, ninho de Coelho’s e município vizinho a Uruçuí, PI. Um emprego em balcão de quitanda enseja-lhe o engajamento no mundo do trabalho organizado, e ainda mais, o contato com papeis, livros e ideias. Entre B. Leite e Uruçuí, o Parnaíba era avenida principal com balsas e barcos a vapor, mercadorias e gente de longe, “rio abaixo, rio arriba”.

Dessas cidades ribeirinhas, as cortinas se abrem para o itinerário luminoso de Celso, já um adolescente. Uma tia o embarca rumo a Teresina, em balsa e vapor de cargas, já conseguida para ele uma vaga no curso do seminário diocesano da capital do Piauí, onde ingressa, em fevereiro de 1938. A experiência do Seminário o faz um intelectual. Aprende latim deixando-se impactar pela imersão em seu sistema e linguagem, além da apropriação da forma vocabular, a própria tessitura histórica que conduz e asperge a heleno-latinidade. Aproximando-se o tempo das ordenações sacramentais e canônicas, manifesta ao bispo que concluiu pela desistência: “vou seguir outro caminho...”, disse ao prelado, que de pronto aceitou as ponderações, observando: “se não será padre, volta como professor” já no ano seguinte.

Estava, assim, iniciado, o longo e fecundo itinerário do Celso no magistério: professor Celso Barros. Ficara para trás o projeto do Coelho padreco e abertas outras possibilidades em sua vida.

O caminho da formatura em Direito e Ciências Sociais foi o passo seguinte, significando apenas a titulação formal-graduada para o intelectual, já um homem destacado em Teresina pelo debate público e escritos que fazia.

Desde 1953, longo e auspicioso é o seu itinerário profissional como advogado. Posicionado como filósofo e professor catedrático de Direito, é acatado como verdadeiro jurista, com obra publicada e reconhecida no debate e jurisprudência brasileira. Partilho seu legado letivo.

Tanta proeminência intelectual e convocações da cidadania ativa, engolfam o professor no itinerário da política partidária. É um liberal, moldado pelo civilista no sentido mais puro, daí não fechar com a tibieza falsária e golpista do udenismo. Com mandato popular em 1964, a ditadura cassa-lhe, por ter percebido nele um propenso a certa radicalidade no horizonte da Justo. 

Esquerda? Compreendia a posição, historicamente, pois um tolerante por convicção. Ao golpe militar que feriu seu mandato, chamava de “revolução”. “Por que, querido mestre”? Muitas pesquisas se se façam para iluminar suas orientações.  

Na idade, o mais longevo membro da Academia Piauiense de Letras, que presidiu. Por último, o “vice decano”. Engajava-se nessas entidades por querê-las estudiosas e socialmente apreensíveis. Assim, reimergindo nos pagos da nascença interiorana, integrou as Academias de Pastos Bons, e de Passagem Franca, campos do coelhado de sua inspiração.

 

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Fonseca Neto

Fonseca Neto

FONSECA NETO, professor, articulista, advogado. Maranhense por natural e piauiense por querer de legítima lei. Formação acadêmica em História, Direito e Ciências Sociais. Doutorado em Políticas Públicas. Da Academia Piauiense de Letras, na Cadeira 1. Das Academias de Passagem Franca e Pastos Bons. Do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

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