Um país não se forma apenas pela territorialidade, pela materialidade econômica construída e robustecida. Faz-se o país, talvez até mais que pelo aspecto geofísico, por razões bem mais subjetivas, as quais o advogado e escritor José Roberto de Castro Neves resume na alma nacional – cuja feitura, no caso brasileiro, eivou-se da participação dos advogados.
Castro Neves traz à luz essa ideia de juristas construtores do país e da identidade nacional ao organizar um livro, “Os juristas que formaram o Brasil”, uma série de 47 textos em que são elencados os perfis de 56 dos mais influentes juristas brasileiros – desde o Império até a Nova República, incluindo nomes que vão de José Bonifácio a Sepúlveda Pertence e Paulo Brossard.
O livro nos dá ele mesmo alguns bons exemplos de advogados que estiveram na faina de pensar o Brasil e, com suas ideias, amoldar o país à sua realidade, projetá-lo para o futuro. Exemplos não são poucos: Raymundo Faoro, Tobias Barreto, Teixeira de Freitas, San Tiago Dantas, Clóvis Beviláqua, Pontes de Miranda, Paulo Bonavides, Francisco Acayaba Gê de Montezuma– além dos imprescindíveis Rui Barbosa e Sobral Pinto.
Trata-se de um livro que nos leva a recordar que o Brasil foi pensado por advogados como José Bonifácio de Andrada, cujo trabalho alinhavou a institucionalidade inicial do país, no processo da independência e da instalação do governo imperial, trabalho que também se deve reputar, no início da República, a Rui Barbosa e a Venceslau Braz, que derrotou o próprio Rui na disputa pela Presidência da República, em 1914.
O Brasil foi pensado por juristas como Joaquim Nabuco, um dos nomes com perfil no livro, que não descuidou de lançar-se sobre a importância das mulheres juristas, como a primeira a exercer a Advocacia no país, Myrthes de Gomes Campos, e Esther de Figueiredo Ferraz que, devemos rememorar, foi a primeira brasileira a ocupar cargo de ministra, no MEC.
Duas mulheres juristas pioneiras evidenciam que o campo político estendido foi o grande espaço de batalha e de afirmação de advogados na formação do Brasil tal e qual o temos. Getúlio Vargas, também citado no livro, era advogado que estabelece a moldura do país sobre a ruína da Velha República, enquanto Bernardo Cabral, como o relator-geral da Constituinte de 1988, deu forma à Constituição democrática mais longeva na era republicana.
O livro organizado por José Roberto de Castro Neves, em que se tem um perfil do jurista piauiense Evandro Lins e Silva, reveste-se de importância ainda maior porque os textos retratam desde nomes facilmente criticáveis por suas posições, como Francisco Campos, até nomes cujo reconhecimento é fundamental para maior representatividade dos afro-brasileiros, como Luís Gama.
Tem-se, na lista de juristas escolhidos para traçar o olhar sobre a construção do país, uma boa oportunidade de leitura. E convém que se lembre de quão adequado é um estudo panorâmico como esse para a celebração, no domingo vindouro, do Dia do Advogado – também Dia do Estudante – em memória à fundação dos cursos jurídicos no país.
Diante de obras como essa, é imperioso perceber que 11 de agosto não pode meramente ser vista como dia de celebrar os advogados e as advogadas enquanto profissionais imprescindíveis à administração da Justiça, conforme prescreve o texto constitucional costurado por Bernardo Cabral com a participação de tantos outros juristas. Pode-se dizer que a partir da criação dos cursos jurídicos em 11 de agosto de 1827 iniciou o processo de independência cultural e intelectual em nosso país.
Tanto 56 juristas perfilados no livro organizado por José Roberto de Castro Neves quanto outros tantos que deram suas imprescindíveis contribuições para a construção nacional, são oriundos ou tributários do ensino jurídico instituído no país há 197 anos – ou seja, temos dois séculos de contribuição dos advogados e demais operadores do Direito para a formação do país. Nosso desafio é o de seguir nessa construção, preferencialmente escolhendo os melhores projetos e materiais para obtermos uma nação mais justa.