Blog do Brandão

Blog do Brandão

DESPERDÍCIO

A falta de fiscalização, o Corema e o péssimo material usado na construção das estradas

Os governos precisam estancar o desperdício do dinheiro público na construção das chamadas "estradas sonrisal"

Por Luiz Brandão

Domingo - 14/07/2024 às 20:08



Foto: Luiz Brandão Congestionamento na BR-343 por causa das obras de restauração
Congestionamento na BR-343 por causa das obras de restauração

O asfalto de vários trechos da BR-343, que liga Teresina a Parnaíba, no Piauí, está sendo refeito outra vez em menos de três anos. As obras estão gerando congestionamentos e atraso na viagem da capital ao litotal do estado. Esse é um dos indícios de que o COREMA continua em pleno funcionamento no Brasil. 

Há obras em trechos entre Teresina e Altos, entre Campo Maior e Piripiri e entre Piracuruca e Parnaíba. Em todos, o asfalto está sendo arrancado e substituído. É o mesmo serviço feito pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) entre 2020 e 2022.

As obras são necessárias porque o serviço anterior, como os outros, foi mal feito. Mas elas causam transtornos e reclamações, a maioria de caminhoneiros. Eles falam do atraso e prejuízos em suas viagem. E culpam as "estradas sonrisal", que desmancham com pouco tempo uso e estão por todo lugar no Brasil.

Em 2021, na gestão do então ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas, atual governador de São Paulo, vários trechos de rodovias federais foram refeitos no Norte e no Sul do Piauí. A BR-343 passou por uma reforma em vários trechos entre Teresina e Parnaíba. O mesmo serviço está sendo feito naquela mesma rodovia menos de três anos depois.

Trecho da BR-316 recuperado em 2021. A situação da estrada é mesma da BR-343O Corema

Trata-se de um ciclo que inclui as etapas Construção, Recuperação e Manutenção (COREMA) das estradas federais e estaduais em todo o Brasil. Ele é antigo. Foi criado no âmbito do Congresso e do Governo Federal ainda durante a Ditadura Militar e persiste até os dias atuais.

Para especialistas, o COREMA só existe por causa de uma relação promíscua entre agentes públicos e o setor privado, notadamente da área de empreiteiras. Esse "esquema" é muito conhecidos nos corredores da Câmara dos Deputados, do Senado e de órgãos do governo federal.

Um estudo encomendado pela CNT - Confederação Nacional do Transportes, publicado em 2017, revelou os principais problemas da malhar rodoviária do Brasil. Os resultado do estudo continuam atualíssimos. A falta de fiscalização é um dos problemas.

De acordo com a CNT, buracos, ondulações, fissuras e trincas são alguns dos defeitos encontrados em mais da metade das rodovias pavimentadas do Brasil. O pavimento com asfalto, mais comum no país, tem vida útil estimada entre 8 e 12 anos. Mas, na prática, os problemas estruturais começam a aparecer bem antes, em alguns casos, apenas sete meses após a conclusão da rodovia.

Estradas sonrisal

E por que os pavimentos das rodovias do Brasil não duram? Em busca de respostas para essa questão, a equipe técnica da CNT analisou o estado de conservação dos pavimentos das rodovias nos últimos 13 anos (antes de 2017), pesquisou métodos e normas que regem as obras rodoviárias no Brasil e em outros países; levantou resultados de auditorias realizadas por órgãos de controle; e ouviu a opinião de especialistas dos setores público, privado e da academia.

A conclusão é que, quando se trata de pavimentação de rodovias, o Brasil utiliza metodologias ultrapassadas para o planejamento de obras, apresenta deficiências técnicas na execução, investe pouco e falha no gerenciamento de obras, na fiscalização e na manutenção das pistas.

Nesse trecho, entre Piracuruca e Parnaíba, o asfalto é novo, mas já está desmanchandoOs principais problemas

O estudo divulgado divulgado em 2017 pela CNT mostrou que a metodologia utilizada no Brasil para projetar rodovias tem uma defasagem de quase 40 anos em relação a países como Estados Unidos, Japão e Portugal.

"Para citar apenas um exemplo: enquanto Portugal, país do tamanho do Estado de Pernambuco, utiliza três zonas para calcular o impacto das variações climáticas sobre as técnicas e os materiais utilizados na construção de rodovias, o método empregado no Brasil não faz essa diferenciação importante para dar mais precisão ao projeto", diz trecho do estudo.

De acordo com CNT, a falta de fiscalização é outro problema. Muitas obras são entregues fora dos padrões mínimos de qualidade, exigindo novos gastos para correção de defeitos que podem corresponder a até 24% do valor total da obra.

O técnicos garantem que, com poucas balanças em operação e sem fiscalização adequada, também cresce o problema do sobrepeso no transporte de cargas, cujo impacto reduz a vida útil do asfalto.

O estudo da CNT está atualizado. A mesma situação encontrada entre 2004 e 2017 se mantém nos dias atuais. A qualidade do material e as técnicas usadas para pavimentação nas rodovias do Brasil deveriam ser objeto de uma investigação mais profunda.

Luiz Brandão

Luiz Brandão

Luiz Brandão é jornalista formado pela Universidade Federal do Piauí. Está na profissão há 40 anos. Já trabalhou em rádios, TVs e jornais. Foi repórter das rádios Difusora, Poty e das TVs Timon, Antares e Meio Norte. Também foi repórter dos jornais O Dia, Jornal da Manhã, O Estado, Diário do Povo e Correio do Piauí. Foi editor chefe dos jornais Correio do Piauí, O Estado e Diário do Povo. Também foi colunista do Jornal Meio Norte. Atualmente é diretor de jornalismo e colunista do portal www.piauihoje.com.
Siga nas redes sociais

Compartilhe essa notícia: