Ao acusar os ex-comandantes do Exército, general Marco Antonio Freire Gomes, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Carlos Baptista Junior, de prevaricação, o senador Ciro Nogueira (PP/PI), pode ter entrado no radar dos investidores da tentiva de golpe de estado planejado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, no final de 2022.
O senador foi ousado e demonstrou lealdade ao ex-chefe. Mas a questão agora seria esclarecer quem teria prevaricado primeiro em não denunciar o plano do golpe: Ciro Nogueira, então chefe da Casa Civil e um dos ministros mais próximos de Bolsonaro e mais poderosos do governo, ou o general e o tenente-brigadeiro do ar?
Ao mexer com os militares Ciro pode entrar na mira da PF porque ninguém acredita que um ministro tão poderoso e importante como era, não tenha visto nada e nem tenha ouvido falar nada sobre o planejamento de golpe de estado bem próximo ao gabinete dele. E, se soube, porque não tomou nenhuma providência?
A Constituição Federal diz que prevaricação é um dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral e consiste em retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
Sigilo aberto
No final da semana passada, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, derrubou o sigilo dos depoimentos dados à Polícia Federal por militares de alta patente que teriam testemunhado a pretensão de Jair Bolsonaro de dar um golpe de estado para evitar a posse do presidente Lula e se manter do cargo.
Diante do que disseram as testemunhas, Ciro Nogueira, presidente nacional do PP, usou sua conta no "X", para insinuar que os ex-chefes do Exército e da FAB teriam prevaricado. Na visão de Ciro, se os militares não adotaram nenhuma providência contra a tentativa de golpe, no mínimo, cometeram crime de prevaricação.
Na verdade, o senador quis desqualificar os depoimentos ao questionar o fato de só agora, depois de Lula ter assumido, os ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica terem dito que testemunharam ações para perpetrar um golpe. Ele também insinuou que os dois militares "batem continência" para quem está no poder.
O outro lado
Ocorre que, na mesma época da intentona golpista, Ciro Nogueira era um dos ministros mais próximos de Bolsonaro e mais poderosos do governo. E nestas condições, é estranho que ele, vivendo ali, bem no meio das decisões, não tenho tomado conhecimento de nada do que está sendo dito à PF por ex-assessores de Bolsonaro, como o ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid, e os ex-chefes do Exército e Aeronáutica.
Se realmente não soube de nada sobre o golpe, então Ciro Nogueira não era assim tão próximo do ex-presidente Jair Bolsonaro e tão poderoso como mostrava ser. O gabinete do ministro da Casa Civil é um dos mais próximo da sala de despechos do presidente da República e o titular da pasta sempre tem livre acesso ao chefe da Nação.
O gabinete do ministro da Casa Cilvil também fica próximo ao grande salão onde ocorreram algumas reuniões do presidente com ministros, incluindo a que houve tratativas sobre o golpe e que foi filmada e da qual participaram quase todos os ministros importantes do governo. Ciro não foi convidado para a reunião? E nem soube do que foi tratado nela?
O outro lado
Na segunda-feira (18), ao rebater as insinuações de Ciro, o tenente-brigadeiro do ar Baptista Júnior também usou as redes sociais e disse que o senador atacou as instituições, principalmente as militares, ao colocar sob suspeitas as informações dadas pelos ex-chefes das forças à Polícia Federal.
As investigações sobre a intentona golpista estão longe de acabar. E muita gente ainda vai ser intimado a dizer o que sabe, inclusive detentores do tal do "foro privilegiado". Como Ciro Nogueira, outros poderosos ministros de era Bolsonaro, dentre eles Paulo Guedes, da Economia, ainda não deram explicações à PF sobre o que viram e estavam fazendo entre a primavera e verão de 2022.