A divulgação de que o WhatsApp passou a obrigar seus usuários a compartilhar dados pessoais com o Facebook — empresa que é dona do serviço de mensagens desde 2014 — levou milhões de pessoas no mundo a buscar outras alternativas de aplicativos de conversas, como Signal e Telegram, nos últimos dias.
Com a reação negativa, o WhatsApp se manifestou reforçando que o teor das mensagens e ligações trocadas dentro do aplicativo continua sendo criptografado, ou seja, o conteúdo não pode ser acessado pelo próprio WhatsApp.
A empresa também disse em posicionamento à imprensa que "esta atualização não muda as práticas de compartilhamento de dados entre o WhatsApp e o Facebook, e não impacta como as pessoas se comunicam de forma privada com seus amigos e familiares em qualquer lugar do mundo".
Mas se nada muda, por que a política de privacidade foi atualizada? A BBC News Brasil conversou com especialistas em segurança de dados para explicar essas e outras dúvidas sobre a nova política de privacidade.
Por trás das alterações está o lançamento de um novo serviço pelo Facebook para gerenciar conversas de empresas com consumidores pelo WhatsApp, mensagens que tem sua transmissão criptografadas, mas cuja privacidade não tem proteção absoluta como em uma conversa privada com amigos.
O WhatsApp passou a notificar seus usuários na semana passada que a atualização dos seus termos de serviço e de sua política de privacidade entrará em vigor dia 8 de fevereiro e que só poderá continuar usando o aplicativo quem aceitar as mudanças. A notificação indica como o usuário pode deletar sua conta, caso discorde da atualização.
Essa mensagem diz ainda que as mudanças envolvem atualizações importantes sobre "como tratamos seus dados", "como as empresas podem usar os serviços de hospedagem do Facebook para armazenar e gerenciar suas conversas no WhatsApp" e "como a nossa (do WhatsApp) parceria com o Facebook possibilita a oferta de integrações entre os Produtos das Empresas do Facebook".
Segundo a especialista em segurança de dados Mariana Rielli, líder de projeto do Data Privacy Brasil, a mudança de fato não significa uma grande atualização na política de privacidade do WhatsApp. Ela explica que, na verdade, boa parte dos usuários do WhatsApp já compartilham seus dados com as outras empresas do Facebook, mas possivelmente não estão conscientes disso.
Em sua plataforma, o WhatsApp detalha a gama de informações que podem ser disponibilizadas a outras empresas do grupo, como número de telefone e outros dados que constem no registro (como o nome); informações sobre o telefone, incluindo a marca, modelo e a empresa de telefonia móvel; o número de IP, que indica a localização da conexão à internet; qualquer pagamento ou transação financeira realizada através do WhatsApp.
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Após ser comprado em 2014 pelo Facebook, lembra Mariana Rielli, o WhatsApp fez em agosto de 2016 uma atualização global de sua política de privacidade que permitia ao usuário escolher se aceitava ou não compartilhar seus dados com a rede social fundada por Mark Zuckerberg e outras empresas do grupo, como o Instagram.
Naquela ocasião, porém, foi dado um período de apenas 30 dias para o usuário tomar essa decisão e fazer a mudança nas suas configurações de conta. Quem não fez a alteração naquela "janela de oportunidade" ou entrou depois de 2016 no WhatsApp não teve mais a opção de decidir entre compartilhar ou não seus dados.
O que aconteceu agora é que o Facebook quer intensificar sua integração com o WhatsApp para que empresas que vendem serviços e produtos em suas redes sociais possam cada vez mais usar suas contas comerciais no aplicativo de conversa para interagir e fazer negócios com os usuários, inclusive viabilizando pagamentos e compras diretamente nesse canal. Além disso, a rede social vai passar a vender um serviço para empresas com grande volume de mensagens gerenciarem as conversas realizadas com os consumidores pelo WhatsApp.
Com isso, foi pedido um novo consentimento dos usuários para permitir que seus dados sejam compartilhados também nesses novos modos de uso do WhatsApp, por meio de contas comerciais (WhatsApp Business).
"Essa atualização da política de privacidade não chega a ser uma mudança de fato (nas regras de compartilhamento de dados). O que muda, na verdade, agora é que as pessoas perceberam que elas não tinham o direito de se opor ao compartilhamento dos seus dados enquanto elas estavam usando os serviços de WhatsApp", afirma Rielli.
"Houve apenas essa janela de 30 dias em 2016 e depois não houve mais nenhuma oportunidade para os usuários novos, ou mesmo os antigos, se manifestarem e se oporem ao compartilhamento de dados do WhatsApp com as empresas do Facebook. A única grande diferença com a atualização é que eles explicitaram a questão do WhatsApp Business porque eles querem integrar as contas comerciais (do WhatsApp) com as funcionalidades do Facebook", reforça.
A assessoria do WhatsApp confirmou a explicação de Rielli e disse que a mudança atual atinge conversas de empresas que usam o Facebook para armazenar e gerenciar esse diálogo com clientes no WhatsApp. A assessoria disse ainda à reportagem que, mesmo com essa mudança, continua respeitando a escolha dos usuários que decidiram não compartilhar seus dados em 2016.
O comunicado à imprensa do aplicativo de mensagens disse ainda o seguinte: "Para aumentar a transparência, o WhatsApp atualizou suas Políticas de Privacidade para que descrevam que, daqui para a frente, as empresas podem optar pelos serviços seguros de hospedagem do Facebook para ajudar no gerenciamento das comunicações com seus clientes no WhatsApp. Embora, é claro, continue sendo uma decisão do usuário se ele gostaria ou não de se comunicar com uma empresa no WhatsApp".
Fonte: BBC