
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou, na terça-feira (18 de março de 2025), uma nota dura em que critica as propostas em tramitação no Congresso Nacional para alterar a Lei da Ficha Limpa. A entidade, que foi uma das principais articuladoras da aprovação da lei em 2010, classificou as mudanças como um ataque aos mecanismos de proteção contra a corrupção e um risco à democracia brasileira.
Em seu comunicado, a CNBB expressou "perplexidade e indignação" com os Projetos de Lei Complementar (PLPs) que visam reduzir os prazos de inelegibilidade para políticos condenados por crimes graves. Segundo a entidade, as alterações propostas beneficiam especialmente aqueles que cometeram abusos de poder político e econômico, além de enfraquecer o combate às práticas corruptas.
A Lei da Ficha Limpa, aprovada por unanimidade pelo Congresso em 2010, é considerada pela CNBB como "uma das mais importantes conquistas democráticas da sociedade brasileira, um patrimônio do povo e uma vitória da ética na política". A entidade destacou que a lei é um marco na luta contra a corrupção e um símbolo da mobilização popular, fruto do esforço de milhões de brasileiros e dezenas de organizações sociais e religiosas.
Propostas em debate no Congresso
A CNBB citou especificamente os PLPs 192/2023, 112/2021, 141/2023 e 316/2016, que estão em tramitação no Senado e na Câmara dos Deputados. O PLP 192/2023, que altera os prazos de inelegibilidade, foi incluído na pauta do plenário do Senado na terça-feira (18/3), mas sua votação foi adiada a pedido do relator, senador Weverton Rocha (PDT-MA), que solicitou mais tempo para negociar um acordo sobre o texto.
O projeto, de autoria da deputada federal Dani Cunha (União-RJ), propõe mudanças na Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar 64/1990). Atualmente, o impedimento para candidaturas é de oito anos, somado ao tempo restante do mandato do condenado. A proposta estabelece um período único de oito anos, contado a partir de datas como a decisão judicial que decreta a perda do mandato ou a condenação por órgão colegiado. Dani é filha do ex-deputado Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara condenado e preso por corrupção.
Se aprovado sem modificações, o PLP 192/2023 poderá ser aplicado imediatamente após a sanção presidencial e até mesmo afetar condenações em andamento. O relator, senador Weverton, defende que o texto busca corrigir distorções e garantir "isonomia" no sistema eleitoral.
Impactos das mudanças
A CNBB alertou que as alterações propostas desfiguram os mecanismos de proteção da Lei da Ficha Limpa, permitindo que políticos condenados por crimes graves tenham sua inelegibilidade reduzida ou anulada antes do cumprimento total das penas. Além disso, as mudanças isentariam aqueles que praticaram abusos de poder político e econômico, fragilizando a luta contra a corrupção.
A entidade reforçou seu compromisso com a ética e a justiça, defendendo a Lei da Ficha Limpa como um valor fundamental para a construção de um Brasil mais justo, democrático e solidário. A CNBB também convocou a sociedade e os parlamentares a se mobilizarem contra qualquer alteração que possa comprometer a eficácia da lei e, consequentemente, a democracia brasileira.
Posicionamento do Papa Francisco
A nota da CNBB citou ainda a encíclica "Fratelli Tutti", do Papa Francisco, que defende uma política voltada para o bem comum. "É necessário uma política melhor, a política colocada ao serviço do verdadeiro bem comum", destacou o texto, reforçando a importância da ética na vida pública.
A CNBB encerrou o comunicado com um apelo à consciência dos parlamentares e um chamado à sociedade para defender a Lei da Ficha Limpa. "Renovamos nosso compromisso com a ética e defendemos que a Lei da Ficha Limpa é um valor fundamental para a construção de um Brasil mais justo, democrático e solidário", afirmou a entidade.
Veja o pronunciamento do presidente da CNBB, Dom Jaime Spengler
Veja a integra da nota
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, por meio de seu Conselho Permanente, reunido em Brasília-DF, na data de 18 de março de 2025, expressa a sua perplexidade e indignação diante das propostas de mudanças da Lei da Ficha Limpa no Congresso Nacional. Ela é uma das mais importantes conquistas democráticas da sociedade brasileira, um patrimônio do povo e importante conquista da ética na política. Esta Lei, fruto da mobilização de milhões de brasileiros e brasileiras convidados à participação por dezenas de organizações sociais e Igrejas, foi aprovada por unanimidade pelas duas Casas Legislativas em 2010. Conhecida em todo o país, representa um marco na luta contra a corrupção. “É necessário uma política melhor, a política colocada ao serviço do verdadeiro bem comum” (Papa Francisco, Fratelli Tutti, n. 154).
As propostas de alterações na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135, de 2010) no Congresso Nacional são: o Projeto de Lei Complementar (PLP) 192/2023, “que altera os prazos de inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa”, o PLP 112/2021, o “novo código eleitoral”, ambos no Senado Federal; o PLP 141/2023, que “altera prazo de inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa”, de 8 para 2 anos, e o PLP 316/2016, “que altera casos de inelegibilidade”, na Câmara dos Deputados. É de se destacar que o PLP 192/2023 está na pauta do plenário do Senado neste período, sem um debate necessário com a sociedade.
As mudanças contidas nesses PLPs desfiguram os principais mecanismos de proteção da Lei da Ficha Limpa ao beneficiar especialmente aqueles condenados por crimes graves, cuja inelegibilidade poderá ser reduzida ou mesmo anulada antes do cumprimento total das penas. Além disso, as mudanças pretendidas isentam quem praticou os abusos de poder político e econômico, e enfraquecem o combate às práticas corruptas que comprometem a democracia brasileira.
Neste momento da vida política nacional, a CNBB posiciona-se em defesa da Lei da Ficha Limpa, denuncia os ataques perpetrados pelas propostas legislativas em curso, renova o seu compromisso com a ética e defende que a Lei da Ficha Limpa é um valor fundamental para a construção de um Brasil mais justo, democrático e solidário, em que a vida seja sinal de justiça e honra. Apelamos à consciência dos parlamentares e convocamos toda a sociedade a lutar contra qualquer alteração na Lei da Ficha Limpa que possa destruir a democracia, conquista de todos e do bem comum.
