Um estudo inédito da ONG WWF Brasil apontou que quatro bacias da Amazônia apresentam grande risco de contaminação por mercúrio acima dos níveis considerados seguros. Esses rios abrigam territórios indígenas que vivem sob a ameaça do garimpo ilegal.
A partir de uma modelagem que projeta a distribuição e bioacumulação de mercúrio nos rios, os resultados indicaram que em mais da metade (51,77%) das sub-bacias dos Rios Tapajós, Xingu, Mucajaí e Uraricoera, há um "risco extremamente alto" de contaminação, principalmente para comunidades indígenas e ribeirinhas que vivem perto desses locais.
As subunidades da Bacia do Baixo Teles Pires, Rio Apiacás e Alto e Médio Teles Pires, a partir de uma análise mais detalhada, apresentaram os maiores níveis de contaminação, acima de 59% do previsto na legislação ambiental. O estudo destacou que os homens tendem a consumir mais peixes do que mulheres e, por isso, as áreas de risco são muito altas para eles (49,4%). Esse percentual é ainda maior para populações indígenas, que têm nos peixes a principal fonte de ingestão de proteína: para eles, 49,6% das sub-bacias são consideradas territórios de risco muito alto.
Para Vitor Domingues, analista ambiental e um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, um dos grandes desafios de se estudar a Amazônia é a escassez de dados amostrais. "O estudo de modelagem ajuda a enfrentar esse desafio, contribuindo com o entendimento da dinâmica do mercúrio em um bioma tão complexo e sensível através de outras fontes de informação", diz à WWF Brasil.
Além de apontar os índices de contaminação pelo metal, o estudo oferece bases científicas para planejar e implementar intervenções eficazes nas regiões afetadas. “A pesquisa ressalta a importância de uma abordagem integrada para monitorar e mitigar os impactos do garimpo de ouro e de outras atividades que afetam a qualidade da água na Amazônia. É essencial considerar as complexidades dos ecossistemas e das populações locais e avaliar cuidadosamente as implicações ambientais e sociais desses projetos, especialmente em regiões já afetadas pela poluição por mercúrio”, afirma Marcelo Oliveira, especialista em Conservação do WWF-Brasil.
Oliveira ainda acrescenta que o estudo evidencia como a poluição por mercúrio está intrinsecamente ligada tanto às atividades de mineração quanto às características dos ecossistemas aquáticos. "As áreas alagáveis e outros elementos desempenham papéis cruciais na ampliação dos níveis de metilmercúrio. Assim, a crescente construção de infraestruturas, como reservatórios para hidrelétricas, pode potencialmente intensificar o problema, uma vez que essas estruturas podem aumentar a área de ambientes favoráveis à metilação do mercúrio”, completa.
Riscos do mercúrio
O mercúrio é um metal altamente perigoso para a saúde humana e para o meio ambiente. Se ingerido, ele provoca danos aos sistemas nervoso, gastrointestinal, respiratório, ocular e renal; problemas de aprendizagem e desenvolvimento cognitivo em crianças expostas durante a gestação e distúrbios cardiovasculares e imunológicos.
Em abril de 2024, a Fiocruz identificou a presença de mercúrio em amostras de cabelo de cerca de 300 indígenas Yanomami de nove aldeias em Roraima. O território sofre com a intensa presença de garimpeiros na região, que provocaram a maior crise humanitária no território nos últimos anos.
Fonte: Revista Fórum