O compositor brasileiro Gonzaguinha diz em uma de suas mais conhecidas canções (O que é o que é) que a vida é um sopro do Criador numa atitude repleta de amor. Falo disso pouco menos de uma semana da partida de um amigo Carlos Washington Cronemberger Coelho porque, sim, quando alguém nos falta em definitivo no plano material é porque se foi mais que uma vida, uma história, uma pessoa amada, admirada e respeitada. Apaga-se um sopro de Deus.
Penso que devo me referir exatamente assim a Carlos Washington, cuja existência física encerrada não põe fim a à existência de nossa amizade, surgida quando estudamos na mesma época em Recife, ele na Universidade Católica, eu, na Universidade Federal. Tempos idos e bem vividos, período de construção de imorríveis memórias e da solidificação de uma amizade.
Por isso mesmo, com tristeza, menciono a morte dele como um episódio que me encheu de tristeza e esvaziou parte de meu coração do afeto que ele sempre me dedicou, desde quando iniciamos jornadas de estudos na biblioteca da Universidade Católica, ele com mais experiência de vida a me mostrar os melhores caminhos a seguir, as mais sensatas decisões a tomar.
Em 1984, quando nos conhecemos, eu estava deixando a adolescência. Mantive com ele uma amizade que surgiu nos estudos universitários e se fortaleceu na intensa convivência na vasta comunidade de estudantes piauienses na capital pernambucana. Foi em uma roda de amigos que conheci Carlinhos, na confluência das ruas Fernandes Vieira e Padre Inglês, num encontro que se repetiu por muitas ocasiões.
Essa convivência nos levou a ir frequentar juntos a praia, as partidas de futebol entre Náutico e o Santa Cruz, aos bares em Olinda e Recife como a “Mansão do Fera”, o “Buraco de Otília”, o Maxime e botecos do centro do Recife e do bairro do Recife. Muitos bares e muitos carnavais nos uniram.
Diversão, muita, estudo mais ainda e por isso mantivemos uma rotina de estudos frequentes na biblioteca da Universidade católica de Pernambuco – também frequentada peloCláucio Mendes de Carvalho, de Oeiras. Também frequentávamos museus, como o Memorial de Manuel Bandeira, a Fundação Joaquim Nabuco. Naquela época, 40 anos atrás, o Carlinhos evidenciava de modo intenso seu caráter e compromisso com a ética e com a cultura, ao mesmo tempo em que valorizava suas raízes.
Posso dizer que era um homem apaixonado pelo Sul do Piauí – que a gente sabe ser uma realidade sociocultural, econômica e ambiental diversa e rica. Ele sabia muito disso e tinha em Canto do Buriti a personificação telúrica desse amor. É lá que jaz seu corpo – já que seu espírito altruísta pode estar em todos os lugares, como o sopro do Criador.
Decano entre os conselheiros da Seccional Piauiense da OAB, era um homem de muito caráter, espírito ético, vontade de ser advogado e alegria incomum e contagiante de viver. Alegrava todas as rodas em que chegava – o que fazia dele a pessoa que se pode definir como bom fazer amizades e mais ainda de conservá-las.
A virtude de conservar e fortalecer amizades nos manteve próximos, apesar dos desencontros da vida. Em 1989, formado, fui para o Rio. Ele, formado um ano antes, veio para o Piauí, onde atuou ao lado do grande Celso Barros, o que nos deu a oportunidade de longas e boas conversas, algumas com as ilustres presenças dos imortais Herculano Moraes e João Rennor Carvalho.
Era um discípulo e fiel escudeiro de Celso Barros Coelho, na advocacia, na vida e na cultura. E nos passos em favor da Advocacia, que dele fizeram conselheiro por três mandatos da OAB-PI, onde fez grande esforço com o fito de criar a subsecção de sua natal e amada Canto do Buriti, inaugurada em 7 junho último. No ato, ele discursou naquele que seria o último grande gesto público de preocupação com a Advocacia e com o interesse público.
A morte desse homem tão cheio de vida e de bons propósitos, com quem tive a sorte e o privilégio de conviver e de obter dele muita sabedoria, deixa um vazio em tantos quantos o conheceram. Mas como exemplos e lições são eternas, seguem vivos em todos nós seu exemplo de coragem, alegria, determinação, alegria, ética e companheirismo – valores de que se devem revestir os verdadeiros advogados. Devemos todos nos devemos nos orgulhar dos exemplos e nos espelhar no seu legado.