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INOVAÇÃO AGRÍCOLA

Bactéria descoberta no Ceará dá origem à tecnologia que ajuda lavouras a resistirem à seca

Pesquisadores da Embrapa transformaram a bactéria da Caatinga em bioinsumo inovador que ajuda aumentar a produtividade agrícola

Da Redação

Sexta - 19/09/2025 às 09:31



Foto: Sandra Brito/Embrapa O Hydratus foi formulado para proteger as plantas em condições de escassez hídrica e ainda estimular seu crescimento
O Hydratus foi formulado para proteger as plantas em condições de escassez hídrica e ainda estimular seu crescimento

Uma bactéria retirada de solos áridos do Ceará está no centro de uma inovação agrícola que promete transformar o cultivo de grãos no Brasil. O microrganismo serviu de base para o desenvolvimento do Hydratus, um inoculante biológico criado pela Embrapa Milho e Sorgo (MG) em parceria com a empresa Bioma. O produto já possui registro no Ministério da Agricultura e Pecuária para uso na soja e está em fase de avaliação em outras culturas estratégicas.

O Hydratus é formulado com a bactéria Bacillus subtilis e atua tanto na proteção das plantas em períodos de seca quanto no estímulo ao crescimento radicular. Testes demonstraram que o inoculante também pode melhorar o desempenho em áreas irrigadas, oferecendo benefícios em diferentes sistemas de produção. Em experimentos comerciais, foram observados ganhos de produtividade de até 7,7 sacas por hectare no milho e 4,8 sacas por hectare na soja.

Formulação diferenciada e longa duração

O grande diferencial do Hydratus está na alta concentração de células vivas do Bacillus subtilis, combinada a agentes protetores que aumentam a resistência da bactéria no solo e prolongam a vida útil do produto nas prateleiras.

Essa tecnologia nasceu a partir do projeto “Seleção e caracterização de microrganismos para mitigação dos efeitos da seca e promoção do crescimento de plantas”, conduzido pela pesquisadora Eliane Aparecida Gomes e sua equipe na Embrapa.

Nos testes de laboratório, a bactéria demonstrou capacidade de produzir fitohormônios capazes de modificar a morfologia das raízes, tornando-as mais longas e eficientes na absorção de água. Essa característica foi essencial para garantir maior adaptação das plantas a ambientes de déficit hídrico.

Resultados de campo e impacto no agronegócio

A aplicação do inoculante foi avaliada em diferentes condições de solo e clima. Na média de 30 áreas comerciais, a cepa B. subtilis 1A11 elevou significativamente a produtividade de soja e milho. A pesquisa contou com o trabalho conjunto da equipe da Bioma, sob coordenação do diretor de pesquisa Artur Soares, e do pesquisador Geraldo Magela de Almeida Cançado, da Embrapa Agricultura Digital (SP).

O lançamento do Hydratus ocorre em um contexto marcado pelos efeitos das mudanças climáticas, que têm reduzido a previsibilidade das chuvas e aumentado a ocorrência de secas severas. 

Segundo a pesquisadora Eliane Gomes, a falta de água compromete o transporte de nutrientes, favorece a formação de radicais livres que danificam estruturas celulares e inibe o desenvolvimento das plantas.

“A seca afeta a disponibilidade e o transporte de nutrientes do solo para as raízes, induz o aparecimento de radicais livres que, em altas concentrações, causam danos a várias estruturas celulares, além inibir o crescimento das plantas”, conta a cientista da Embrapa.

Biodiversidade brasileira como ponto de partida

O estudo que deu origem ao Hydratus começou em 2017. Pesquisadores coletaram amostras de solo em áreas de baixa precipitação no Ceará. Das 414 estirpes bacterianas isoladas, apenas 28 se mostraram resistentes a ambientes com pouca disponibilidade de água. Entre elas, a estirpe 1A11 destacou-se por sua produção de exopolissacarídeos (EPS), substâncias que formam uma espécie de barreira protetora ao redor das células, reduzindo a perda de água das plantas.

A eficiência dessa bactéria em se associar às raízes também foi comprovada em experimentos de hidroponia. Neles, sementes de milho inoculadas apresentaram maior crescimento radicular, aumento da biomassa e melhora na taxa fotossintética, mesmo em condições de estresse osmótico.

O sequenciamento genômico da cepa confirmou sua identidade e revelou genes ligados à promoção de crescimento vegetal, à tolerância ao estresse hídrico e à produção de compostos voláteis com potencial para aumentar a resiliência das plantas à seca.

Da pesquisa ao campo

Em 2021, a bactéria foi transferida da Embrapa para a Bioma, que trabalhou na formulação ideal e conduziu os testes de validação em larga escala. A parceria culminou no produto Hydratus, agora disponível para agricultores.

De acordo com Alexandre Ferreira da Silva, chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Milho e Sorgo, a inovação chega em um momento crucial:

“Essa tecnologia chega como um grande suporte para os agricultores que lidam com os desafios crescentes das mudanças climáticas Com um olhar atento ao estresse hídrico, uma realidade que impacta cada vez mais as lavouras, essa inovação promete otimizar a produtividade e tornar a agricultura ainda mais sustentável. É uma contribuição que vai além das fazendas, conectando-se diretamente às discussões mundiais sobre como tornar nossa produção agrícola mais resiliente frente ao cenário de mudanças climáticas e garantir a alimentação de todos”, diz Alexandre Ferreira da Silva. 

Já o diretor de pesquisa da Bioma, Artur Soares, destaca que a tecnologia também aumenta a eficiência no uso da água nas propriedades. 

"O Hydratus reduz os efeitos negativos da escassez de água sobre as plantas, ou seja, mantém a produtividade mesmo em condições ambientais desfavoráveis, quando não chove ou quando chove além do esperado”, afirma Artur Soares, que também chama a atenção para a sustentabilidade promovida pelo bioinsumo: "o Hydratus aumenta a eficácia do uso da água na propriedade".

O Hydratus se insere no movimento crescente pelo uso de bioinsumos, que reforça a agricultura sustentável no Brasil. Além de reduzir perdas decorrentes da irregularidade climática, o produto abre caminho para ampliar o potencial produtivo em diferentes regiões e culturas.

 A equipe de desenvolvimento do Hydratus é composta pelos pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo, Eliane Aparecida Gomes, coordenadora, Christiane Abreu de Oliveira Paiva, Flávia Cristina dos Santos, Ivanildo Evódio Marriel, Maycon Campos Oliveira, Paulo César Magalhães, Sylvia Morais de Sousa e Ubiraci G. P. Lana, e pelos pesquisadores da Embrapa Agricultura Digital Geraldo Cançado, João Francisco Antunes e Eduardo Antonio Speranza e seus bolsistas Julio Cezar Souza Vasconcelos e Caio Simplício Arantes.

Fonte: Embrapa

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