Economia

Como privatização da Eletrobras deve encarecer cerveja, carne e leite

O governo contesta as estimativas dos especialistas e afirma que a desestatização da gigante do setor elétrico pode reduzir a conta de luz entre 5% e 7% já a partir do próximo ano

Da Redação

Quarta - 23/06/2021 às 14:46



Foto: Gazeta do Povo Cerveja
Cerveja

Cerveja, carne, leite e material de construção mais caros. E além de tudo isso, uma conta de luz ainda mais salgada do que a atual. Segundo representantes da indústria e de entidades de defesa do consumidor, esses podem ser alguns dos efeitos da MP (medida provisória) de privatização da Eletrobras, aprovada na segunda-feira (21/06) pelo Congresso e que agora aguarda sanção presidencial — o que deve acontecer num prazo de até 15 dias, que vence em 6 de julho.

O governo contesta as estimativas dos especialistas e afirma que a desestatização da gigante do setor elétrico pode reduzir a conta de luz entre 5% e 7% já a partir do próximo ano.

Segundo o secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, a economia seria possível com a destinação de R$ 48 bilhões para atenuar as tarifas dos consumidores por meio da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético). O dinheiro seria aportado ao longo dos anos, após a privatização da empresa. O Ministério da Economia estima que a desestatização pode gerar R$ 100 bilhões aos cofres públicos, sendo R$ 20 bilhões numa oferta primária de ações e outros R$ 80 bilhões em potenciais ofertas secundárias, que aproveitariam o aumento de valor de mercado da empresa. Segundo Mac Cord, o valor faria da operação a "maior privatização já vista no país".

A expectativa é de que essa oferta primária — que representará a privatização da empresa, ao reduzir a parcela do governo no capital dos atuais 61% para 45% — seja concluída até fevereiro de 2022. Para os representantes da indústria e dos consumidores, no entanto, os potenciais benefícios da arrecadação de recursos com a venda das ações serão mais do que compensados pela alta de custos resultantes de quatro pontos problemáticos da MP de privatização. Entenda esses quatro pontos e como isso vai chegar no seu bolso.

1. Venda de energia mais cara após a privatização 

A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) estima que a MP de privatização da Eletrobras, da forma como foi aprovada pelo Congresso, deve gerar um custo adicional de R$ 400 bilhões aos consumidores ao longo dos próximos 30 anos. A maior parcela desse custo, de R$ 300 bilhões nos cálculos da entidade, será resultado da venda a preços de mercado de uma energia comercializada atualmente mais barata pela Eletrobras, devido ao fato de ser produzida por usinas hidrelétricas antigas, cujos investimentos já foram amortizados ao longo dos anos de operação. 

"O projeto de capitalização da Eletrobras foi apresentado em 2017, , ainda no governo Michel Temer [MDB]", lembra Carlos Cavalcanti, diretor do departamento de Infraestrutura da Fiesp. "Nesse projeto, a atratividade para o novo investidor - o bônus, o prêmio que está prometido para ele - é a chamada 'descotização' das usinas que tiveram seu preço de geração reduzido em 2013", explica o representante do setor industrial. No ano anterior àquele, a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sancionou uma medida provisória (MP 579) que causou grandes desequilíbrios no setor elétrico. Por outro lado, essa MP resultou na redução do custo de produção de energia de um grupo de hidrelétricas da Eletrobras para cerca de R$ 100 por MWh (megawatt-hora), comparado a R$ 200 por MWh das usinas que vendem energia a preços de mercado. "A 'descotização' significa vender essa energia a preços de mercado, então ela vai passar de R$ 100, para R$ 200", diz Cavalcanti. "Estão tentando convencer o consumidor de que a hora que você aumenta o preço de R$ 100 para R$ 200, vai abaixar o valor da energia elétrica. Não há matemática no mundo que sustente isso."

2. Obrigação de construir termelétricas a gás onde não há oferta do combustível 

Um segundo fator que deve gerar custos adicionais para os consumidores foi uma obrigação criada pelos parlamentares na tramitação da MP de contratação pelo governo de 8 GW (gigawatts) em termelétricas a gás natural, que devem ser instaladas em sua maioria em Estados das regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste. É o que se chama em política de "jabuti" - uma norma incluída na tramitação de um projeto de lei ou medida provisória que não tem relação com o tema em discussão. O termo tem origem no ditado popular "jabuti não sobe em árvore", que se refere a fatos que não acontecem de forma natural. "Houve uma interferência direta do Legislativo no planejamento energético", avalia Clauber Leite, coordenador do programa de Energia e Sustentabilidade do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). 

"No planejamento, técnicos fazem estudos para atender a demanda com o menor preço possível, usando mecanismos como leilões, que consideram as vocações de cada região do país. Isso é feito através da EPE, a Empresa de Pesquisa Energética", explica. "O que aconteceu na MP foi uma reserva de mercado que desconsidera qualquer planejamento." Pela MP aprovada, as novas termelétricas vão operar na base do sistema, isto é, de forma permanente e não apenas quando as demais fontes estiverem gerando de forma insuficiente. E com uma inflexibilidade de 70%, o que significa que elas vão operar obrigatoriamente 70% do tempo, mesmo que outras fontes mais baratas e limpas possam atender a demanda num determinado momento.

Além disso, como a produção de gás natural do Brasil vem principalmente do pré-sal, em alto mar, será necessário construir gasodutos e linhas de transmissão para integrar essas usinas ao sistema. A Fiesp estima que a construção dessa infraestrutura pode gerar um custo adicional de R$ 50 bilhões aos consumidores em 20 anos. Na terça-feira (22/06), o secretário Diogo Mac Cord argumentou que o preço de geração da energia nessas usinas é mais barato do que o da conta de luz.

Fonte: UOL Notícias

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