Um copo com gelo na mão, camiseta de super-heróis e um conceito em mente. É assim que Gabriela Ramos Leal, 34, começa o vídeo de inscrição para a competição de comunicação científica FameLab Brasil. “O Capitão América é ficção mesmo, mas o poder do gelo é ciência!”, enfatiza a pesquisadora ao explicar sobre a importância da criopreservação de embriões. Na época, Gabriela nem imaginava que seria anunciada a primeira mulher negra vencedora do concurso em um programa especial transmitido em rede nacional pela TV Cultura no dia 15/11.
A competição conta com três fases: o período de inscrição, que seleciona os 30 participantes da edição; a semifinal, onde apenas 10 trabalhos são escolhidos para, por fim, concorrer à final nacional. O vencedor se classifica para o FameLab Internacional, onde irá disputar com competidores de outros 31 países. O evento é realizado pelo British Council e todas as etapas podem ser assistidas pelo canal da organização no YouTube.
Mestre e Doutora em Clínica e Reprodução Animal pela Universidade Federal Fluminense e docente da Universidade Castelo Branco (UCB) na área de embriologia veterinária, a jovem conquistou os jurados com um conceito científico de muita relevância para a atualidade e pouco mencionado: o desenvolvimento de soro para tratar a Covid-19 a partir de testes em cavalos (clique aqui para assistir).
Gabriela revelou que a escolha de temas para apresentar durante as fases do concurso buscou mostrar um lado da medicina veterinária que não é conhecido pela sociedade. “As pessoas pensam que se você não tem um pet, o médico veterinário não é necessário. E isso na verdade é uma necessidade de comunicação para que elas entendam qual é a importância da medicina veterinária num contexto de saúde pública”, afirma.
Tradicionalmente no concurso, os jovens recebem um treinamento em comunicação científica com a especialista britânica Wendy Sadler e o especialista brasileiro Ronaldo Christofoletti. O desafio é apresentar um conceito científico de forma clara e carismárica em três minutos. Este ano, a migração da inciativa para o não presencial trouxe um novo obstáculo. “O palco foi uma câmera. Então, existiram algumas adequações necessárias durante o treinamento, para desenvolver suas habilidades de contar em frente a uma câmera.”, ressalta o treinador Christofoletti.
Na visão da vencedora, a pandemia ainda trouxe uma outra importância para o programa. “Sempre houve necessidade de uma comunicação científica melhor para combater as fake news que aparecem por aí. E a pandemia se tornou um momento propício para isso porque até quem não se interessa ou até mesmo não acredita em ciência está esperando o que os pesquisadores têm a dizer nos próximos meses.”
A pesquisadora carioca apaixonada por cinema conheceu o FameLab em 2017 e desde então sempre quis participar, mas só criou coragem para se inscrever em 2020. Ela, que torcia muito para seus colegas na competição, nunca imaginou que poderia ganhar. “Eu acho que foi uma das melhores coisas que eu já ganhei e que eu vou levar para vida é conseguir ressaltar aquilo que é principal dentro daquilo que eu preciso trazer para me fazer entender. Os treinamentos me ajudaram a reconhecer aquilo que de fato é essencial na minha comunicação.”
No meio acadêmico, a jovem conta que não teve dificuldade de inserção, mas o ambiente abriu sua percepção para questões raciais. “Hoje inclusive eu faço parte de um coletivo de médicos-veterinários negros porque a gente percebe essa necessidade inclusive de representatividade. Por exemplo, eu não tive um professor preto na faculdade”, afirma. De acordo com a plataforma Open Box da Ciência, iniciativa da organização Gênero e Número, as mulheres representam 46% das docentes de ensino superior, mas apenas 23% delas são pretas e pardas.
Com base em dados do CNPq 2015, o levantamento ainda observou que apenas 25% dos pesquisadores sênior A1 (nível mais elevado) eram mulheres. De acordo com a jovem, apesar de ainda ter um longo caminho pela frente, a representatividade feminina na ciência está aumentando. Ela ainda destaca positivamente o FameLab Brasil e o fato de entre os 10 finalistas, 7 serem do gênero feminino. “Até mesmo por um problema de comunicação, as pessoas têm essa ideia de que o cientista é sempre um homem, de jaleco, geralmente mais velho e meio emburrado. Poder mostrar que a ciência tem todas as caras, todas as cores e todos os gêneros foi bem especial.”, conclui.
Sobre o FameLab
Criada em 2005 pelo Festival de Ciência de Cheltenham, a competição é realizada pelo British Council em 32 países com o objetivo de promover a aproximação entre cientistas e público em geral, por meio da contextualização e abordagem de temas científicos no dia a dia da sociedade, além de incentivar o desenvolvimento de competências em comunicação, em especial a habilidade oral.
No Brasil, a 4ª edição conta ainda com a parceria do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e da TV Cultura.
Além do FameLab, o British Council se consolida como fomentador da ciência no país por meio dos programas Universidades para o Mundo, Mulheres na Ciência e Newton Fund. Clique aqui para saber mais.
Fonte: Bruna Scavuzzi