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Entidades repudiam artigo de professor publicado em jornal

O artigo polêmico foi escrito pelo professor aposentado José Maria Vasconcelos

Sexta - 25/01/2019 às 20:01



Foto: Facebook Professor José Maria Vasconcelos
Professor José Maria Vasconcelos

O texto “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, veiculado no Jornal Diário do Povo, edição desta sexta-feira (25), assinado pelo professor aposentado do Instituto Federal do Piauí (Ifpi), José Maria Vasconcelos, gerou grande repercussão negativa.

No texto opinativo, o autor narra que toda sexta-feira, no Teresina Shopping, ele se reúne com amigos em frente ao restaurante Magia de Minas e denominam o local de  ‘contemplatório’, pois de lá ficam observando as mulheres.  “Belas mulheres desfilam, destilando colírio nos olhos masculinos devido à ousadia dos trajes”, diz trecho do artigo.

Logo o texto passou a ser compartilhado nas redes sociais, principalmente no WhatsApp. O colunista sugere a figura da mulher ideal, perfeita! “Homens, em geral, não avançam na mulher pudorosa, reservada e decentemente ajuizada, que não expõe a sua intimidade emocional e física. Em outras palavras, a mulher ideal não precisa exibir as nádegas para seduzir os homens”.

Outro ponto do texto que chamou a atenção é quando o autor recomenda o fechamento das delegacias da mulher. “Fechem as delegacias da mulher, providenciem condutas de pudor feminino, vergonhas mais escondidas. Homens, comumente, só avançam se elas abrirem as pernas [...] Ao torna-se público aquilo que é íntimo perde todo o seu valor. Acho que as mulheres devem voltar às origens de sua decadência”, diz o colunista.

Após a repercussão, um grupo de mulheres piauienses criaram uma petição online para repudiar o artigo. As autoras do documento solicitam a retratação do professor José Maria e ao Jornal Diário do Povo.

O Departamento Estadual de Proteção à Mulher do Piauí também repudiou o artigo de José Maria Vasconcelos. O Departamento classificou as declarações como demasiadamente sexista, intolerantes e preconceituosas  veiculadas na edição supramencionada.

“Tais discursos não podem mais serem aceitos e encarados como “naturais”, pois maximizam as diferenças e exuberam a violência travestida no ódio. E, nós, como mulheres e detentoras de prerrogativas dadas pelo Estado Democrático de Direito continuaremos vigilantes, além de buscar consolidar e robustecer as políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulher em nosso Estado”, diz trecho da nota assinada pela delegada Anamelka Cadena, diretora do Departamento Estadual de Proteção à Mulher.

A delegada Eugênia Nogueira do Rêgo Monteiro Villa, diretora de gestão interna da Secretaria de Segurança do Piauí (SSP-PI), também emitiu nota para repudiar o texto polêmico. Segundo a delegada, o ‘alfabeto violento’ se instala no artigo.  “Qual seria o slogan mais apropriado para representar esse ato ilocucionário? Qual seria a propriedade semântica, ou seja, qual foi a intencionalidade imposta pelo falante? Quais seriam os sons e as marcas das enunciações? Respondemos: a precariedade de um ser humano como CORPO DESCARTÁVEL, destituído de significado social, político e histórico, passível de descarte, VIDA QUE NÃO PODE SER VIVIDA, do mesmo modo como ocorre nos assassinatos de mulheres no Piauí”, diz a delegada.

O Núcleo de Defesa da Mulher em Situação de Violência da Defensoria Pública do Estado do Piauí foi outro órgão importante que divulgou nota de repúdio. “O texto, repleto de sexismo e machismo, procura justificar, sem qualquer base empírica, o comportamento criminoso de agressores de mulheres, tentando condicionar essas agressões ao comportamento da vítima, no caso, pelas vestimentas”.

Artigo polêmico publicado no Jornal Diário do PovoArtigo de opinão do professor José Maria Vasconcelos/Foto: Reprodução-Redes sociais

Vejas as notas de repúdio abaixo:

  • Departamento Estadual de Proteção à Mulher do Piauí vêm  a público repudiar o artigo publicado no jornal impresso "Diário do Povo" de hoje,  dia 25/01/2019, intitulado “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, em tempo que solicitamos a respectiva retratação por parte do autor do artigo, José Maria Vasconcelos, pelas declarações demasiadamente sexista, intolerantes e preconceituosas  veiculadas na edição supramencionada.

    Dado que o texto apresenta a performance de um discurso de ódio que fomenta ainda mais a violência em nosso Estado que é permeado de casos com práticas diárias de violência contra a mulher que muitas vezes culminam em feminicídio.

    E, um discurso como tal, que se pauta nessas bases repercute de forma danosa à população, fortificando velhos paradigmas sociais que deveriam ser desconstruídos.

    A idealização de uma mulher sublime, perfeita e a exigência de que ela se adeque a determinados padrões físicos e comportamentais são resquícios do famigerado machismo que robustece a violência de gênero tão odiosamente combatida pelas sociedade civil e instituições formalmente constituídas.

    Apesar dos inúmeros avanços, principalmente no que tange aos alcances legislativos de proteção a mulher e nas políticas públicas desenvolvidas com o escopo de tanger a violência, é lamentável nos deparamos com um conteúdo de uma matéria veiculada em um meio de comunicação, portanto formador de opiniões, eivado de conservadorismo e preconceito, incompatível com o mundo tão desenvolvido no qual nos inserimos e queremos fortalecer.

    O machismo naturalmente pode ser identificado como uma violência contra a mulher, pois se destaca pela diferenciação extrema dos direitos e deveres entre homens e mulheres, arrebatando ao preconceito e à violência mais latentes, golpeando a liberdade feminina de se expressar e se portar de forma livre e sem ser importunada, sem riscos ou comprometimento em face de sua integridade física, moral, psicológica, sem risco a sua VIDA.

    Tais discursos não podem mais serem aceitos e encarados como “naturais”, pois maximizam as diferenças e exuberam a violência travestida no ódio. E, nós, como mulheres e detentoras de prerrogativas dadas pelo Estado Democrático de Direito continuaremos vigilantes, além de buscar consolidar e robustecer as políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulher em nosso Estado.

    ANAMELKA ALBUQUERQUE CADENA

    DIRETORA DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTEÇÃO À MULHER  

NOTA DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO PIAUÍ - DELEGADA EUGÊNIA VILLA

  • Não somos descartáveis!
  • No DIA LARANJA, instituído pela ONU como sendo um dia destinado à prevenção e enfrentamento à violência contra a mulher, o POVO piauiense acordou com publicação “devoradora” de conquistas democráticas decorrentes do “sangue” esparramado das 110 mulheres assassinadas no Piauí desde a vigência da Lei do Feminicídio e do de tantas mulheres que diuturnamente se encontram em situação de violência no nosso Estado. O ALFABETO VIOLENTO se instala no artigo e indagamos: qual seria o slogan mais apropriado para representar esse ato ilocucionário? Qual seria a propriedade semântica, ou seja, qual foi a intencionalidade imposta pelo falante? Quais seriam os sons e as marcas das enunciações? Respondemos: a precariedade de um ser humano como CORPO DESCARTÁVEL, destituído de significado social, político e histórico, passível de descarte, VIDA QUE NÃO PODE SER VIVIDA, do mesmo modo como ocorre nos assassinatos de mulheres no Piauí. Nossa anatomia, colocada em uma estrutura de poder, condiciona o status da masculinidade à apropriação do corpo feminino. O background (som de fundo) da escrita é “A PELE QUE HABITA NOSSO CORPO”, mensurada no plano do biopoder, no poder de apropriação e controle do corpo feminino. A macabra reunião das sextas feiras pode ser comparada a ritual em que a vítima do sacrifício é eleita por sua anatomia feminina, destinada ao consumo canibalístico a cargo de uma determinada “confraria masculina” “bem intencionada”, “de bem” e “pais de família” cuja masculinidade se vê testada pela roupa de uma de mulher.
  • SIGAMOS EM PAZ E EM FRATERNIDADE, MULHERES E HOMENS PIAUIENSES! NÃO BORREMOS NOSSAS MENTES COM O SANGUE DO SACRIFÍCIO DAS MULHERES!
  • Eugênia Nogueira do Rêgo Monteiro Villa
  • Margarete de Castro Coelho  

NOTA da Defensoria Pública do Estado do Piauí 

  • O Núcleo de Defesa da Mulher em Situação de Violência da Defensoria Pública do Estado do Piauí vem se manifestar sobre o “artigo” veiculado no Jornal Diário do Povo intitulado  “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, de autoria de José Maria Vasconcelos. O texto, repleto de sexismo e machismo, procura justificar, sem qualquer base empírica, o comportamento criminoso de agressores de mulheres, tentando condicionar essas agressões ao comportamento da vítima, no caso, pelas vestimentas. É lamentável que num estado como o nosso, com elevados números de feminicídios, um meio de comunicação preste tamanho desserviço à população e em especial às mulheres, contribuindo para a disseminação da cultura do estupro, da desigualdade de gênero e da violência contra a mulher. Desnaturalizar a cultura da desigualdade de gênero é uma necessidade que só fará bem aos homens  e às mulheres desse município, desse estado e desse país.

  • Francisca Hildeth leal Evangelista Nunes
  • Defensora Pública Geral do Estado do Piauí

  • Lia Medeiros do Carmo Ivo

  • Verônica Acioly de Vasconcelos

  • Armano Carvalho Barbosa
  • Defensores do Núcleo da Mulher da DPE-PI

NOTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PIAUÍ

  • Em nome do Núcleo de Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar (NUPEVID), do Ministério Público do Piauí (MPPI), venho a público REPUDIAR de forma veemente o Artigo com o título “O Pudor atrai o respeito do homem”, publicado, nesta sexta-feira (25), no Jornal Diário do Povo, de autoria do Sr. José Maria Vasconcelos.
  • Nós lamentamos este fato e registramos nossa preocupação com o reiterado desrespeito aos Direitos Humanos das Mulheres, principalmente, quando vem ao caso de expor a nós, mulheres, fatores de culpabilização por causa de sua vestimenta, por meio de atos desrespeitosos, violentos e injustificáveis, diante dos inúmeros preconceitos que a cultura machista e a cultura do estupro impõe à imagem feminina, e, pior, pensamentos que podem levar aos atos de violência e assédio sexual ocorridos contra milhares de mulheres.
  • Esse conceito de culpar a mulher é cultural e lamentável. Tabu totalmente errôneo de que roupas e mulheres são culpadas pelos assédios que sofrem diariamente ou até mesmo pela falta de interesse de um homem por uma mulher "sem pudor". Da mesma forma que alertamos sempre para o fato de que o estupro também está atrelado à cultura não significa diminuir a culpa dos estupradores para saírem impunes. Pois, mulheres são estupradas independente de vestimentas. Roupas não podem interferir em nada na liberdade feminina, muito menos impor sentimento de culpa na vítima. A culpa é sempre do agressor!
  • Encerramos nosso repúdio a esse artigo, dizendo que PUDOR se resume ao respeito entre ambos os sexos, que homens não devem em possibilidade alguma “avançar” em mulher nenhuma e sim tratar TODAS com respeito e respeitando seus direitos e escolhas. A vida ou roupa de uma mulher não se resumem à intenção de conquistar ou exibir-se para um homem. Devemos entender que a mulher usa a roupa que ela quiser! Isso não define seu caráter e muito menos ela está pedindo para ser abusada ou assediada por ninguém!
  • Amparo Paz – titular da 10ª Promotoria de Justiça e Coordenadora do NUPEVID

Fonte: Alinny Maria

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