Foto: Facebook
Professor José Maria Vasconcelos
O texto “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, veiculado no Jornal Diário do Povo, edição desta sexta-feira (25), assinado pelo professor aposentado do Instituto Federal do Piauí (Ifpi), José Maria Vasconcelos, gerou grande repercussão negativa.
No texto opinativo, o autor narra que toda sexta-feira, no Teresina Shopping, ele se reúne com amigos em frente ao restaurante Magia de Minas e denominam o local de ‘contemplatório’, pois de lá ficam observando as mulheres. “Belas mulheres desfilam, destilando colírio nos olhos masculinos devido à ousadia dos trajes”, diz trecho do artigo.
Logo o texto passou a ser compartilhado nas redes sociais, principalmente no WhatsApp. O colunista sugere a figura da mulher ideal, perfeita! “Homens, em geral, não avançam na mulher pudorosa, reservada e decentemente ajuizada, que não expõe a sua intimidade emocional e física. Em outras palavras, a mulher ideal não precisa exibir as nádegas para seduzir os homens”.
Outro ponto do texto que chamou a atenção é quando o autor recomenda o fechamento das delegacias da mulher. “Fechem as delegacias da mulher, providenciem condutas de pudor feminino, vergonhas mais escondidas. Homens, comumente, só avançam se elas abrirem as pernas [...] Ao torna-se público aquilo que é íntimo perde todo o seu valor. Acho que as mulheres devem voltar às origens de sua decadência”, diz o colunista.
Após a repercussão, um grupo de mulheres piauienses criaram uma petição online para repudiar o artigo. As autoras do documento solicitam a retratação do professor José Maria e ao Jornal Diário do Povo.
O Departamento Estadual de Proteção à Mulher do Piauí também repudiou o artigo de José Maria Vasconcelos. O Departamento classificou as declarações como demasiadamente sexista, intolerantes e preconceituosas veiculadas na edição supramencionada.
“Tais discursos não podem mais serem aceitos e encarados como “naturais”, pois maximizam as diferenças e exuberam a violência travestida no ódio. E, nós, como mulheres e detentoras de prerrogativas dadas pelo Estado Democrático de Direito continuaremos vigilantes, além de buscar consolidar e robustecer as políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulher em nosso Estado”, diz trecho da nota assinada pela delegada Anamelka Cadena, diretora do Departamento Estadual de Proteção à Mulher.
A delegada Eugênia Nogueira do Rêgo Monteiro Villa, diretora de gestão interna da Secretaria de Segurança do Piauí (SSP-PI), também emitiu nota para repudiar o texto polêmico. Segundo a delegada, o ‘alfabeto violento’ se instala no artigo. “Qual seria o slogan mais apropriado para representar esse ato ilocucionário? Qual seria a propriedade semântica, ou seja, qual foi a intencionalidade imposta pelo falante? Quais seriam os sons e as marcas das enunciações? Respondemos: a precariedade de um ser humano como CORPO DESCARTÁVEL, destituído de significado social, político e histórico, passível de descarte, VIDA QUE NÃO PODE SER VIVIDA, do mesmo modo como ocorre nos assassinatos de mulheres no Piauí”, diz a delegada.
O Núcleo de Defesa da Mulher em Situação de Violência da Defensoria Pública do Estado do Piauí foi outro órgão importante que divulgou nota de repúdio. “O texto, repleto de sexismo e machismo, procura justificar, sem qualquer base empírica, o comportamento criminoso de agressores de mulheres, tentando condicionar essas agressões ao comportamento da vítima, no caso, pelas vestimentas”.
Artigo de opinão do professor José Maria Vasconcelos/Foto: Reprodução-Redes sociais
Vejas as notas de repúdio abaixo:
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Departamento Estadual de Proteção à Mulher do Piauí vêm a público repudiar o artigo publicado no jornal impresso "Diário do Povo" de hoje, dia 25/01/2019, intitulado “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, em tempo que solicitamos a respectiva retratação por parte do autor do artigo, José Maria Vasconcelos, pelas declarações demasiadamente sexista, intolerantes e preconceituosas veiculadas na edição supramencionada.
Dado que o texto apresenta a performance de um discurso de ódio que fomenta ainda mais a violência em nosso Estado que é permeado de casos com práticas diárias de violência contra a mulher que muitas vezes culminam em feminicídio.
E, um discurso como tal, que se pauta nessas bases repercute de forma danosa à população, fortificando velhos paradigmas sociais que deveriam ser desconstruídos.
A idealização de uma mulher sublime, perfeita e a exigência de que ela se adeque a determinados padrões físicos e comportamentais são resquícios do famigerado machismo que robustece a violência de gênero tão odiosamente combatida pelas sociedade civil e instituições formalmente constituídas.
Apesar dos inúmeros avanços, principalmente no que tange aos alcances legislativos de proteção a mulher e nas políticas públicas desenvolvidas com o escopo de tanger a violência, é lamentável nos deparamos com um conteúdo de uma matéria veiculada em um meio de comunicação, portanto formador de opiniões, eivado de conservadorismo e preconceito, incompatível com o mundo tão desenvolvido no qual nos inserimos e queremos fortalecer.
O machismo naturalmente pode ser identificado como uma violência contra a mulher, pois se destaca pela diferenciação extrema dos direitos e deveres entre homens e mulheres, arrebatando ao preconceito e à violência mais latentes, golpeando a liberdade feminina de se expressar e se portar de forma livre e sem ser importunada, sem riscos ou comprometimento em face de sua integridade física, moral, psicológica, sem risco a sua VIDA.
Tais discursos não podem mais serem aceitos e encarados como “naturais”, pois maximizam as diferenças e exuberam a violência travestida no ódio. E, nós, como mulheres e detentoras de prerrogativas dadas pelo Estado Democrático de Direito continuaremos vigilantes, além de buscar consolidar e robustecer as políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulher em nosso Estado.
ANAMELKA ALBUQUERQUE CADENA
DIRETORA DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTEÇÃO À MULHER
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NOTA DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO PIAUÍ - DELEGADA EUGÊNIA VILLA
- Não somos descartáveis!
- No DIA LARANJA, instituído pela ONU como sendo um dia destinado à prevenção e enfrentamento à violência contra a mulher, o POVO piauiense acordou com publicação “devoradora” de conquistas democráticas decorrentes do “sangue” esparramado das 110 mulheres assassinadas no Piauí desde a vigência da Lei do Feminicídio e do de tantas mulheres que diuturnamente se encontram em situação de violência no nosso Estado. O ALFABETO VIOLENTO se instala no artigo e indagamos: qual seria o slogan mais apropriado para representar esse ato ilocucionário? Qual seria a propriedade semântica, ou seja, qual foi a intencionalidade imposta pelo falante? Quais seriam os sons e as marcas das enunciações? Respondemos: a precariedade de um ser humano como CORPO DESCARTÁVEL, destituído de significado social, político e histórico, passível de descarte, VIDA QUE NÃO PODE SER VIVIDA, do mesmo modo como ocorre nos assassinatos de mulheres no Piauí. Nossa anatomia, colocada em uma estrutura de poder, condiciona o status da masculinidade à apropriação do corpo feminino. O background (som de fundo) da escrita é “A PELE QUE HABITA NOSSO CORPO”, mensurada no plano do biopoder, no poder de apropriação e controle do corpo feminino. A macabra reunião das sextas feiras pode ser comparada a ritual em que a vítima do sacrifício é eleita por sua anatomia feminina, destinada ao consumo canibalístico a cargo de uma determinada “confraria masculina” “bem intencionada”, “de bem” e “pais de família” cuja masculinidade se vê testada pela roupa de uma de mulher.
- SIGAMOS EM PAZ E EM FRATERNIDADE, MULHERES E HOMENS PIAUIENSES! NÃO BORREMOS NOSSAS MENTES COM O SANGUE DO SACRIFÍCIO DAS MULHERES!
- Eugênia Nogueira do Rêgo Monteiro Villa
- Margarete de Castro Coelho
NOTA da Defensoria Pública do Estado do Piauí
- O Núcleo de Defesa da Mulher em Situação de Violência da Defensoria Pública do Estado do Piauí vem se manifestar sobre o “artigo” veiculado no Jornal Diário do Povo intitulado “O pudor da mulher atrai o respeito do homem”, de autoria de José Maria Vasconcelos. O texto, repleto de sexismo e machismo, procura justificar, sem qualquer base empírica, o comportamento criminoso de agressores de mulheres, tentando condicionar essas agressões ao comportamento da vítima, no caso, pelas vestimentas. É lamentável que num estado como o nosso, com elevados números de feminicídios, um meio de comunicação preste tamanho desserviço à população e em especial às mulheres, contribuindo para a disseminação da cultura do estupro, da desigualdade de gênero e da violência contra a mulher. Desnaturalizar a cultura da desigualdade de gênero é uma necessidade que só fará bem aos homens e às mulheres desse município, desse estado e desse país.
Francisca Hildeth leal Evangelista Nunes
- Defensora Pública Geral do Estado do Piauí
Lia Medeiros do Carmo Ivo
Verônica Acioly de Vasconcelos
Armano Carvalho Barbosa
- Defensores do Núcleo da Mulher da DPE-PI
NOTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PIAUÍ
- Em nome do Núcleo de Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar (NUPEVID), do Ministério Público do Piauí (MPPI), venho a público REPUDIAR de forma veemente o Artigo com o título “O Pudor atrai o respeito do homem”, publicado, nesta sexta-feira (25), no Jornal Diário do Povo, de autoria do Sr. José Maria Vasconcelos.
- Nós lamentamos este fato e registramos nossa preocupação com o reiterado desrespeito aos Direitos Humanos das Mulheres, principalmente, quando vem ao caso de expor a nós, mulheres, fatores de culpabilização por causa de sua vestimenta, por meio de atos desrespeitosos, violentos e injustificáveis, diante dos inúmeros preconceitos que a cultura machista e a cultura do estupro impõe à imagem feminina, e, pior, pensamentos que podem levar aos atos de violência e assédio sexual ocorridos contra milhares de mulheres.
- Esse conceito de culpar a mulher é cultural e lamentável. Tabu totalmente errôneo de que roupas e mulheres são culpadas pelos assédios que sofrem diariamente ou até mesmo pela falta de interesse de um homem por uma mulher "sem pudor". Da mesma forma que alertamos sempre para o fato de que o estupro também está atrelado à cultura não significa diminuir a culpa dos estupradores para saírem impunes. Pois, mulheres são estupradas independente de vestimentas. Roupas não podem interferir em nada na liberdade feminina, muito menos impor sentimento de culpa na vítima. A culpa é sempre do agressor!
- Encerramos nosso repúdio a esse artigo, dizendo que PUDOR se resume ao respeito entre ambos os sexos, que homens não devem em possibilidade alguma “avançar” em mulher nenhuma e sim tratar TODAS com respeito e respeitando seus direitos e escolhas. A vida ou roupa de uma mulher não se resumem à intenção de conquistar ou exibir-se para um homem. Devemos entender que a mulher usa a roupa que ela quiser! Isso não define seu caráter e muito menos ela está pedindo para ser abusada ou assediada por ninguém!
- Amparo Paz – titular da 10ª Promotoria de Justiça e Coordenadora do NUPEVID
Fonte: Alinny Maria
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