Proa & Prosa

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A paixão pela pesquisa diletante

Gonçalves foi para o silêncio misterioso e deixou uma obra de expressão historiográfica lavrada em cuidada pesquisa. Pesquisa com esmero e textos honestos.

Fonseca Neto

Sábado - 30/10/2021 às 15:32



Foto: Reprodução Academia Piauiense de Letras
Academia Piauiense de Letras

A pesquisa documental no proveito da historiografia é algo que a muitos apaixona. Certa mítica que a força do vivido nutre na sede consciente dos humanos.

Há poucos dias partiu e se tornou um traço memorial em nossa experiência, um desses apaixonados, o dileto companheiro na Academia Piauiense de Letras, Wilson Carvalho Gonçalves, vice longevo da centenária Casa. Completara os 98 anos de vida no ultimo dia 21 de abril.

Gonçalves foi para o silêncio misterioso e deixou uma obra de expressão historiográfica lavrada em cuidada pesquisa. Pesquisa com esmero e textos honestos.

Do muito que leio dele, vejo o grande filho das Barras do Marataoan num esforço intenso para achar, deslindar, clarear e partilhar a história de seu lugar natal – que todos temos um, que nos apaixona em crescendo, quanto nossa idade se dissipa no tempo que não para.

Sua predileção no labor escrevente foi a biografia, tanto que o primeiro livro que publica conflui na obra de outro notável barrense, Tito Filho, divulgando traços da vida e feitos administrativos de governadores do Piauí: Vultos de Barras. E organiza um Dicionário Histórico-Biográfico Piauiense. E nessa linha, uma Antologia da Academia Piauiense de Letras, com segunda edição integrando a Coleção 100 Anos, da própria APL. Mais estudos fez e publicou. E estava pesquisando e já com texto, que deixou inédito, tratando da história administrativa e política do Piauí.

Nada é à-toa: ele tinha gosto pela evidência de que Barras é uma espécie de “terra de governadores”. E apego ao memorial das Administrações, talvez por aquela experiência-maior que com certeza marcou sua vida laboral: farmacêutico por formação graduada, mas um agente público ligado à administração dos negócios fazendários, atividade tão antiga na vida da polis e civitas, que chega a sinalizar o que se entende por linha civilizante das sociedades.

Não há dúvida que um homem culto. Isso o habilitou ao tirocínio acadêmico, sucedendo na cadeira 12 da APL a José Maria Soares Ribeiro, em 1995.

Barras, novamente Barras, aproximou-me desse homem educado e curioso com pesquisas. Tempos atrás, declarando-se leitor de nossos textos dados em colunas de jornal e atencioso a nossas alocuções palestrais, disse que me vira escrever sobre um vigário oitocentista chamado Miguel Fernando Alves, ligado à paróquia da Conceição, das Barras. Logo disse-lhe que conhecia uma parte da história, mas não a outra parte da história dele – justo o vicariato barrano de Miguel. E logo me ofereceu as pistas certas para alcançar inclusive os familiares descendentes do dito. Dona Teresa de Castro, mãe de um colega professor, Melquisedeque de Castro Viana.

Uma graça! Padre com descendência? Boas risadas demos. Não mais paramos as boas  interlocuções, sobre Barras, e já boas conversas sobre o estado das pesquisas e quetais  temáticos da história/historiografia piauiense.  

Há uma certa margem de casualidade no amealhar fontes de pesquisa. Nesse caso, eu sabia muito da história do padre que Gonçalves buscava, vigário colado da paróquia de São Sebastião de Passagem Franca, Maranhão, minha freguesia natal. Mas eu não sabia quase nada do longo vicariato sucessivo de Miguel, nas Barras. Justo o que o barrense ilustre e atento sabia e podia me ajudar. E me ajudou. E nos ajudamos. Hoje a família do pároco-pai está mais bem esclarecida, inclusive para a família, cuja descendência, em quinta geração, sabia apenas vagamente o lugar original de seus avoengos maranhenses.

Além da APL, membro da Academia de Letras do Vale do Longá, sediada em Barras, e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

Deixa muita saudade o valoroso Wilson Gonçalves. De suas filhas, uma é artista consagrada, Josefina Gonçalves, que, nos inventários da saudade, continuará a luzir, pintando, a imortalidade do pai.           

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Fonseca Neto

Fonseca Neto

FONSECA NETO, professor, articulista, advogado. Maranhense por natural e piauiense por querer de legítima lei. Formação acadêmica em História, Direito e Ciências Sociais. Doutorado em Políticas Públicas. Da Academia Piauiense de Letras, na Cadeira 1. Das Academias de Passagem Franca e Pastos Bons. Do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.

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