Olhe Direito!

Desejos presidenciais e a Constituição


Por Álvaro Fernando Mota

Dois candidatos, de espectros políticos e ideológicos dispares, vão ao segundo turno da eleição presidencial. Há uma corrente de incertezas sobre o que os dois podem fazer ou não podem fazer ou ainda um mar de dúvidas sobre até onde podem ir para implantar ideias que boa parte dos eleitores nem sabe se eles têm.

Essas formulações precisam ser entendidas sob o aspecto da Constituição Federal e das leis infraconstitucionais, as quais orientam as políticas públicas, a atuação do Estado. Não se pode esperar que um presidente seja eleito e no dia seguinte dê um cavalo de pau na gestão pública, mudando tudo a canetadas.

Os tempos em que as medidas administrativas e econômicas de um presidente deixavam a direita perplexa e a esquerda indignada perdem-se nos desvãos da história, são uma frase na memória dos que acompanharam os primeiros tempos de Fernando Collor de Mello na Presidência.

Um presidente pode muito, mas não pode tudo, como já dito aqui neste mesmo espaço, no começo de agosto, em artigo intitulado “Cuidado, candidato prometendo!”, no qual se chamou a atenção para o fato de que nem tudo o que se promete fazer em campanha eleitoral poderá ou deverá ser realizado, pelo simples fato de que podem haver impedimentos constitucionais e legais à execução das medidas propostas.

Naquele texto publicado em agosto, advertiu-se para o fato de existirem promessas que dependem de reformas na lei ou na Constituição; há propostas que não cabem no orçamento; há projetos que carecem de estudos sobre viabilidade socioambiental e econômica etc. e tal. Ou seja, uma política pública depende bem mais das condições institucionais, econômico-financeiras e orçamentárias do que da vontade de quem promete.

Temos pela frente, assim, um embate de ideias e propostas para um segundo turno presidencial que certamente serão melhores detalhadas agora que cada um dos concorrentes terá igual espaço no rádio e na TV. Cabe prestar atenção no que vão dizer os postulantes, de modo a compreender o que realmente cada um poderá fazer dentro das condições já citadas.

Grupos corporativos os mais variados devem entrar no debate e no embate para um lado e para outro. Cada um na defesa de suas ideias, por absurdas ou incabíveis que possam parecer. Neste sentido, pois, é conveniente que as pessoas se atentem à impossibilidade de alterações profundas em políticas públicas, notadamente as mais essenciais, bem assim em riscos imediatos ao edifício democrático.

Sempre convém que lembremos regras elementares como a necessidade de autorização do Congresso para uma série de medidas que resultem em mexidas grandes demais na gestão pública. Mais apoio ainda se faz preciso quando se pretenda alterar norma constitucional, que carece, como sabemos, de quórum qualificado de 3/5 dos senadores (49) e dos deputados federais (308), em dois turnos de votação. Ou seja, não é tarefa fácil alterar a Constituição Federal.

Então, antes do alarmismo que se instala pela existência de dois concorrentes com ideias “reformistas” quanto a políticas públicas e à Constituição Federal, convém que lembremos das naturais dificuldades existentes para isso. Fruto, essas dificuldades, aliás, de uma espécie de vacina institucional contra alterações feitas de qualquer modo.  Quer dizer, como já posto aqui também, a Constituição tem em seu tecido os anticorpos contra ações contrárias ao Estado de direito.

Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Procurador do Estado. Ex-Presidente da OAB-PI. Mestre em Direito pela UFPE. Atual Presidente do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil.

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Álvaro Mota

Álvaro Mota

É advogado, procurador do Estado e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Álvaro também é presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.
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