Política

Renan almoça com governo e janta na oposição

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), voltou do recesso parlamentar com uma postura op

Quarta - 05/08/2015 às 12:08



Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil Dilma Rousseff com Renan Calheiros
Dilma Rousseff com Renan Calheiros
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), voltou do recesso parlamentar com uma postura oposta à que adotou no primeiro semestre, quando se alinhou à oposição, principalmente depois da inclusão de seu nome entre os políticos investigados na Operação Lava Jato.

No retorno às atividades parlamentares, Renan prometeu neutralizar a “pauta-bomba” de votações contra o governo preparada pelo presidente da Câmara, o agora autodeclarado oposicionista Eduardo Cunha (PMDB-RJ), almoçou com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, a quem prometeu apoio ao que até recentemente chamava de “capenga” ajuste fiscal, e pautou projetos que, entre outros efeitos, contribuem para o equilíbrio das contas públicas.

Um dos políticos investigados na Operação Lava Jato, Renan se reaproxima da presidente às vésperas do julgamento da prestação de contas de Dilma pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O PMDB indicou três dos nove ministros do tribunal, dois dos quais com forte apoio do senador: os novatos Bruno Dantas e Vital do Rêgo Filho. Uma eventual condenação por crime de responsabilidade no tribunal por causa das chamadas “pedaladas fiscais” representa o pior dos mundos para a petista, pois abre caminho para o seu impeachment no Congresso.

Enquanto o futuro da presidente passa pelo TCU, o do peemedebista está pendurado no Supremo Tribunal Federal (STF), onde é aguardada para os próximos dias a primeira leva de denúncias do procurador-geral da República contra parlamentares que atualmente respondem a inquérito na Lava Jato. Renan é alvo de três investigações. Da atual composição do tribunal, apenas os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes, os mais antigos da corte, não foram indicados pela atual presidente ou pelo ex-presidente Lula. Nos bastidores, a influência exercida pelo PMDB no TCU e pelo governo no TCU é vista com esperança, tanto por Dilma quanto por Renan, para escapar das confusões em que se meteram.

Fiel aliado do governo nos primeiros quatro anos de Dilma, Renan estava determinado a contrariar o Executivo, como este site tem mostrado desde março. Chegou a classificar como “capengas” o ajuste fiscal e a aliança entre PT e PMDB. Agora, diante de ameaças de impeachment da presidenta Dilma, o peemedebista tem sido visto pelo Planalto e aliados como o “fiel da balança” quando o cerco se fechar contra o governo. O próprio senador tem sinalizado que pode voltar a colaborar com a “governabilidade”, mas, segundo interlocutores, cobrará “faturas” nas áreas política e econômica.

“Não haverá ‘pauta-bomba’ no Congresso Nacional. Pelo contrário, nós estamos preocupados em desarmar a bomba que está posta na economia. Vou me pautar, sempre, como presidente do Congresso, um Poder independente e autônomo que quer colaborar, com o olhar da sociedade”, discursou Renan.

Foi esse o tom que o peemedebista imprimiu à primeira sessão de votações do Senado na volta do recesso. Entre outras decisões, os senadores aprovaram o Projeto de Lei 302/2015, que permite a consórcios públicos a contratação de mão-de-obra sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Na justificativa do projeto, defende-se que a natureza temporária dos consórcios impõe a necessidade de contratação por meio da CLT, uma vez que empregar servidores efetivos exige previsão orçamentária e, consequentemente, gera gastos extras.

Outras matérias no sentido de colaborar com o governo já foram pautadas por Renan para os próximos dias, a exemplo do Projeto de Lei 298/2015. Com urgência de votação já aprovada, a proposta promove a repatriação de dinheiro remetido ao exterior sem a devida declaração à Receita Federal. A medida é considerada essencial pela equipe econômica do governo, por captar mais recursos úteis tanto para o ajuste fiscal quanto para os esforços do pacto federativo – este, outro assunto com o qual Renan tem se comprometido no Senado.

“Nós estamos olhando para o Brasil, querendo que o país saia dessa crise. Vejo Renan na mesma posição de firmeza de termos um pós-ajuste, uma luz pós-ajuste. Não queremos ser irresponsáveis com o Brasil”, disse ao Congresso em Foco o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), ao ser questionado sobre a mudança de postura de seu correligionário.

Segundo o jornal O Estado de S.Paulo, Renan cobrará mudanças em troca do auxílio à governabilidade de Dilma. Começará pelo pedido de substituição do chamado “núcleo duro” do governo, o que implicaria na troca do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, com quem Renan não tem boa relação, por um nome como Jaques Wagner (Defesa). Em outra frente, o senador cobraria do governo mais auxílio financeiro para Alagoas, estado em sérias dificuldades orçamentárias governado por seu filho e herdeiro político, Renan Filho (PMDB). Renan quer também mais participação na política econômica e cortes na estrutura do governo, de acordo com o jornal.

“Coisas por trás”

A pauta favorável ao governo, segundo interlocutores de Renan, inclui também projetos como o que promove a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o que cria o Fundo de Desenvolvimento Regional e o que define a repartição de contribuições sociais. Tanta ajuda ao Planalto por parte de Renan, no entanto, está longe de ser mero comprometimento institucional ou responsabilidade com o futuro país. Foi o que disse à reportagem um experiente senador aliado, ao ser indagado sobre a guinada governista do peemedebista. “Está [governista]. Ele não é bobo. Quando você vê esse tipo de coisa, é porque há outras coisas por trás”, disse o parlamentar da base, sob condição de anonimato.

Um dos principais aliados de Renan, Romero Jucá (PMDB-RR) discorda. Questionado sobre o que significa o fato de o presidente do Senado ter voltado do recesso mais disposto ao diálogo, Jucá foi enfático. “Nada. Aliás, significa fazer política. O diálogo tem que ser aperfeiçoado”, sentenciou o senador, que tem posição de independência em relação ao governo e chegou a apoiar a eleição de Aécio Neves (PSDB-MG) nas eleições presidenciais de 2014.

Enquanto Renan espera amparo do Planalto, o governo se preocupa com o avanço da 16ª fase da operação, deflagrada na última semana, sobre irregularidades no setor elétrico. Essa etapa da Lava Jato atingiria aliados do peemedebista e estragaria, em tese, a reaproximação.

“Quem conhece Dilma sabe que ela não toparia [o acerto]”, contesta um líder da base em declaração ao Congresso em Foco.

Já um senador oposicionista, que também preferiu não se identificar, diz que as complicações de Dilma vão além do TCU, uma vez que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julga ação do PSDB contra a petista e, com menos implicação direta, a própria investigação da Lava Jato desgasta a imagem da presidenta. Nesse sentido, diz o parlamentar, o entendimento entre Dilma e Renan pode ter algum fundamento.

“O governo tem alguma chance no TCU. São ministros indicados pelo governo; eles devem ao governo essa indicação. Além disso, alguns desses ministros do TCU estão enrolados [em investigações]”, disse. “Já em relação ao STF, não acredito que alguém ainda conte com a generosidade dos ministros”, acrescentou.

Conversação estratégica

Embora insista na tese de responsabilidade institucional, a atuação de Renan não se limita ao diálogo com o governo. Ontem, o senador investiu nas movimentações de bastidor e promoveu convescotes com aliados e membros da equipe econômica – como o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, com quem almoçou. Até a oposição entrou no pacote, com o anúncio de um jantar com a bancada do PSDB.

Nessa linha de diálogo, a atividade legislativa durante a manhã de ontem se limitou a uma reunião da Comissão de Ciência e Tecnologia. Outros quatro colegiados cancelaram suas tarefas em meios aos desdobramentos da Lava Jato, em que pese a prisão do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, e as implicações da crise política: as comissões de Assuntos Econômicos; de Meio Ambiente; de Educação; e a que foi criada para discutir projeto de José Serra (PSDB-SP) sobre modelo de exploração da Petrobras.

Mas as características do retorno ao trabalho, segundo o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), conotam que Renan ainda preserva a veia oposicionista do primeiro semestre. “Até acredito que, com o retorno de suas bases eleitorais, todos aqui vieram mais apreensivos no sentido de que esse governo não goza da menor credibilidade. Isso é patente, as pessoas estão totalmente pessimistas”, declarou Caiado à reportagem.

Alvaro Dias (PSDB-PR) diz não acreditar na eficácia de uma eventual “troca de favores” entre Dilma e Renan. “O Supremo não é refém de ninguém. Seria um tiro n’água tentar convencer o STF a adotar uma posição política”, observou o tucano, acrescentando que governistas têm buscado “tábuas de salvação”, no momento errado, já em meio à crise. Para Alvaro, oposição e sociedade querem o impeachment de Dilma. “A fase do diálogo passou. Qualquer aproximação da oposição com o governo repercutiria de forma dramaticamente negativa na opinião pública, que deseja mudança”, concluiu o senador, para quem seria um “abraço de afogados”.

Líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE) concorda com Alvaro apenas no que diz respeito ao suposto acordo entre Renan e Dilma. Para o petista, os desdobramentos de escândalos de corrupção não estão diretamente relacionados à aparente reaproximação entre ambos.

“Não há a relação de uma coisa com a outra. Não é isso [crise] que aproxima ou deixa de aproximar o presidente do Senado e a presidenta Dilma, mas o interesse do país. As investigações vão continuar e se aprofundar. É importante que o país não sofra com o fato de as investigações estarem acontecendo”, avaliou. “É o interesse do país que está em jogo, e é isso o que reaproxima.” 

Fonte: Congresso em foco

Siga nas redes sociais

Compartilhe essa notícia: