Registrada oficialmente como firma de vigilância, a Lopes & Galvão Ltda. aparece como pagadora de serviços de parqueamento e atendimento para a aeronave PR-AFA, prestados pela Líder Táxi Aéreo.
O GLOBO localizou Genivaldo Galvão Lopes e Luciene Lindalva Lopes, donos da empresa, na casa onde vivem há pelo menos uma década e que funciona como sede da empresa, no bairro Tiúma, antiga vila operária da cidade. Primeiro, os dois negaram ter pagado despesas da aeronave, dando a entender que a firma deles poderia ter sido usada indevidamente.
Nesta segunda-feira, por meio de um advogado, Genivaldo mudou a versão e informou que “pode ter realizado pagamentos a pedido de outras pessoas”. No entanto, preferiu não identificá-las, sob a alegação de que o fará apenas quando for “intimado por autoridades competentes para prestar esclarecimentos”.
— A gente não tem nada a ver com isso, somos pessoas decentes — disse Luciene, ainda na tarde de domingo.
— Eu não gosto nem de avião — completou o marido, na ocasião.
EMPRESA NÃO É CADASTRADA
Embora registrada oficialmente como empresa de atividades de vigilância e segurança privada, a Lopes & Galvão não é cadastrada na Delegacia de Controle da Segurança Privada, da Polícia Federal, como determina a legislação. O casal afirmou que a empresa atua na terceirização de funcionários de serviços gerais, como copeira, diarista e faxineira, para firmas de Recife. E negou qualquer relação política com políticos ou partidos.
— É uma empresa pequena. Resume-se a uma pessoa só, que sou eu — disse Genivaldo.
Uma de suas filhas, Sylney Lopes, de 29 anos, disse não fazer sentido a empresa do pai bancar despesas operacionais de uma aeronave avaliada em US$ 8,5 milhões (R$ 19 milhões).
— Você acha que, se tivéssemos esse dinheiro todo, eu moraria aqui em Tiúma? Longe de tudo, nessa rua... — afirmou, mencionando o bairro onde mora com a família, na periferia de São Lourenço da Mata.
O GLOBO teve acesso ao registro do contrato da Lopes & Galvão com a Líder Táxi Aéreo, para a prestação de serviços no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Antes de a empresa assumir o contrato, os serviços eram pagos pela AF Andrade, antiga proprietária da aeronave, com sede em Ribeirão Preto (SP). O gasto mensal com parqueamento e atendimento de um avião como o usado pelos candidatos do PSB gira em torno de R$ 30 mil mensais. Dependendo dos serviços contratados, a despesa no mês pode alcançar R$ 40 mil, segundo empresas do setor.
O avião foi comprado em maio de 2014 pelo empresário João Carlos Lyra, em sociedade com Apolo Santana Vieira e Eduardo Freire Bezerra Leite, também empresários, para ser usado na campanha de Campos e Marina. O próprio candidato testou a aeronave antes de a compra ser oficializada. Parte dos pagamentos para a AF Andrade foi feita por empresas fantasmas e sem lastro financeiro para quitar o negócio, como mostrou o “Jornal Nacional” na última semana.
O uso do mecanismo levou a PF a suspeitar que os empresários podem ter sido usados como laranjas para a compra do Cessna por alguém ligado diretamente ao PSB, a Eduardo Campos ou próximo a ele. O pagamento de despesas operacionais da aeronave por meio de uma empresa pequena e de outro ramo de atuação só reforça a tese da PF.
Oficialmente, a polícia afirma não ter recebido, ainda, pedido formal de investigação do caso, por parte do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele já determinou a abertura de procedimento para apurar possíveis irregularidades na utilização do jato.
Na primeira declaração de gastos da campanha, o PSB não declarou o uso da aeronave. Depois do acidente, o partido alegou que até o fim da campanha pretendia contabilizar as horas de voo e emitir recibo eleitoral de doação recebida dos empresários João Carlos Lyra e Apolo Santana. Os dois teriam doado ao partido na condição de pessoa física.
Nesta segunda-feira, O GLOBO perguntou ao PSB quem pagou pelas despesas operacionais do avião, se o partido ou os empresários que supostamente o doaram à campanha. Por meio da assessoria, o partido informou que não vai se posicionar sobre o assunto e que todos os esclarecimentos estavam em nota oficial divulgada na última semana. O texto não responde à pergunta.
O advogado indicado por Genivaldo Galvão Lopes para apresentar sua versão para o caso é o criminalista Ademar Rigueira, o mesmo contratado pela viúva de Eduardo Campos, Renata Campos, para acompanhar, em nome da família, as investigações sobre o acidente que matou o ex-governador de Pernambuco e outros seis assessores em 13 de agosto, em Santos (SP).
ATÉ ADVOGADO ESTRANHA
Perguntado sobre a coincidência, Rigueira afirmou não ser advogado constituído de Genivaldo, e apenas ter sido procurado por ele para obter uma orientação.
— Ele pode ter lido meu nome em jornais, sou um profissional conhecido em Recife — disse o defensor.
Rigueira disse considerar estranho que despesas da aeronave tenham sido pagas por uma empresa do porte da Lopes & Galvão.
— Eles vão ter que explicar. Eu não sei (por que a empresa pagou). Você tem razão em estar questionando isso — afirmou o advogado.
A Força Aérea Brasileira está investigando as causas do acidente. A Polícia Civil de SP e a Polícia Federal também abriram inquérito sobre o desastre. As duas polícias têm como outra tarefa identificar devidamente os verdadeiros donos do jato. A informação é importante para nortear ações e pedidos de indenização de moradores de Santos que tiveram algum tipo de prejuízo com o acidente. Pelo menos 50 pedidos de indenização já foram apresentados à polícia. (Especial para O GLOBO)
Fonte: O Globo