Dino reage a "fogo amigo": autocritica do PT seria inútil

Flávio Dino reagiu às críticas de Jaques Wagner e Cid Gomes ao PT


Governador reeleito do Maranahão, Flávio Dino (PCdoB)

Governador reeleito do Maranahão, Flávio Dino (PCdoB) Foto: Divulgação

Reeleito para seu segundo mandato, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), criticou o "fogo amigo" de aliados de Fernando Haddad (PT) neste segundo turno e disse que não é momento de levantar hipóteses para uma eventual derrota, mas sim, de continuar em campanha para reverter a vantagem de Jair Bolsonaro (PSL) sobre ele. No Ibope, divulgado na terça-feira, o deputado tem 59% dos votos válidos contra 41% do petista. Já o Datafolha indicou Bolsonaro com 58% e Haddad com 42%.

"Eu acho que é totalmente fora de hora, fora de lugar, é absurdamente inadequado esse tipo de debate agora", disse, ao ser questionado sobre as recentes falas dos eleitos senadores aliados Jaques Wagner (PT-BA) e Cid Gomes (PDT-CE). Na manhã de segunda (15), Wagner disse que Ciro Gomes era a melhor estratégia para vencer Bolsonaro. À noite, Cid se irritou com vaias de petistas durante ato pró-PT e chamou os manifestantes de "babacas", dizendo que o "PT vai perder feio a eleição".

Em entrevista exclusiva ao UOL nesta terça-feira (16), Dino afirmou que uma autocrítica pública do PT, como pediu Cid, é algo sem sentido e que não traria qualquer voto a Haddad. "Na minha cultura política, a autocrítica você faz é na prática, mostrando mudanças de comportamento. Não existe esse momento de se autoflagelar, se autochicotear", pontuou.

Para o governador, as pesquisas de opinião do segundo turno são reflexo da campanha feita com mentiras de Bolsonaro. "Acho que o elemento surpresa foi a força de uma virulenta campanha de ataques nas redes sociais, algo claramente muito organizado, muito profissionalizado, que acabou por gerar um inesperado, que foi o crescimento da rejeição do Haddad", comentou.

Dino disse que é possível reverter a vantagem de Bolsonaro com a inclusão de um debate sobre propostas reais contra fake news e não esconde que teme um eventual governo do militar reformado seja autoritário, ruim para a economia e "trágico" para o desenvolvimento regional.

Confira a íntegra:

UOL: As pesquisas ao final do primeiro turno indicavam um segundo turno com Fernando Haddad (PT) empatado tecnicamente com Jair Bolsonaro (PSL), mas agora aparece bem atrás. O que ocorreu para tamanha mudança?

Flávio Dino: Acho que o elemento surpresa foi a força de uma virulenta campanha de ataques nas redes sociais, algo claramente muito organizado, muito profissionalizado, que acabou por gerar um inesperado, que foi o crescimento da rejeição do Haddad. Acho que a questão central da eleição foi essa hegemonia que o bolsonarismo conseguiu estabelecer de sua agenda por intermédio da fake  news. Não é uma coisa feita pelo Bolsonaro, é algo claramente feita por empresa, fala-se até de consultores estrangeiros, não sei afirmar isso, mas é algo muito organizado e planejado e que até aqui tem desequilibrado a eleição.

Como ex-juiz, o senhor vê ilegalidade passível de punição?

Claro que há uma brutal ilegalidade. Infelizmente há de um lado muita dificuldade no diagnóstico dos ataques e muita lentidão nos procedimentos jurídicos de repressão dessa ilegalidade. Veja que o tal falado kit gay demorou duas semanas até ser determinada a retirada, mas o dano já foi feito. Nós estamos diante de uma forma nova de ilegalidade, difícil de ser combatida. A Justiça Eleitoral vai ter de refletir sobre isso, porque com esse longo tempo, numa eleição de primeiro turno mais curto, se você deixa uma mentira, uma calúnia prosperar por semanas, a decisão judicial é quase que totalmente ineficaz. Nesse sentido é uma eleição contaminada por essa ilegalidade inédita nessa proporção. Isso que explica uma mudança tão profunda nos números. Vamos lembrar que, no primeiro turno, a rejeição do Bolsonaro era muito maior e, duas semanas depois, isso mudou radicalmente. E por que mudou? Por causa da rejeição ao PT? Não é verdade, senão teria se manifestado desde no primeiro turno, todos sabiam que ele era do PT. O que pegou e levou a rejeição foi sem dúvida a imposição de agenda de mentiras, ataques, calúnias, invenções, manipulações de declarações.

É possível reverter uma diferença tão grande?

Nós temos ainda 10 dias, e muito provavelmente precisa tentar mudar a agenda da eleição. A tentativa principal hoje é conseguir fazer com que o debate eleitoral não seja presidido por esse tipo de agenda, como tem sido, e seja colocada uma agenda real, sobretudo de emprego, de trabalho, políticas públicas. Talvez das eleições presidenciais que acompanho, a que me lembro que teve um debate similar de nível tão rebaixado foi de 1989, entre Lula e Collor. Com os candidatos do PT e PSDB havia um certo debate sobre votou contra e a favor do Plano Real, sobre privatizações, sobre a dívida do pais; agora está zerado.

Mas nesse cenário tem chance de reverter?

Olha, uma eleição em que todos os institutos de pesquisa não conseguiram captar os resultados do primeiro turno, a gente vê que há uma volatilidade muito grande e muito rápida do voto, com movimentos surpreendentes e que só foram captados na pesquisa boca de urna praticamente. Considerando isso considero que ainda tem jogo, é muito precoce dizer que a eleição está decidida.

Recentemente os ex-ministros Jaques Wagner (PT) e Cid Gomes (PDT) fizeram uma espécie de fogo amigo. Como o senhor avalia essas falas?

Eu acho que é totalmente fora de hora, fora de lugar, é absurdamente inadequado esse tipo de debate agora. Acho que ele é válido posteriormente. Agora não há mudança possível em relação a esse desenho, então é lutar com a situação tal como ela está posta. Eu não participo desse tipo de debate, nem que concordo ou discordo do discurso, só que acho que é um absurdo colocar esse debate nesses termos nesse momento. Não ajuda em nada diante da gravidade do que temos em curso. Não é uma eleição qualquer. A eleição do Bolsonaro sinaliza com uma possível ruptura da Constituição e da ordem democrática. Então, como é momento grave, acho que você não deve dispersar energia com coisas que nesse momento são secundárias, acessórias. Hoje é absolutamente desnecessário discutir se deveria ser candidato A, B ou C. O que é crucial hoje é impedir a vitória do Bolsonaro e tudo que ele representa de conteúdo antipopular, antidemocrático e antinacional.

O que o senhor acha da cobrança de uma autocrítica do PT? 


Eu acho que sinceramente é indiferente, porque se fosse por esse ponto, Dilma não teria ganho 2014. Acaba sendo um falso debate esse da autocritica. Em 2014 já tinha começado a operação Lava Jato e não houve essa coisa de autocritica, de ajoelhar no caroço de milho em praça pública, se autoflagelar. E a Dilma ganhou. Novamente é um desvio do debate principal e é desnecessário. Na minha cultura política, a autocrítica você faz é na prática, mostrando mudanças de comportamento. Não existe esse momento de se autoflagelar, se autochicotear. Essa cobrança acaba enfraquecendo a candidatura do Haddad.

Como o senhor avalia um eventual governo Bolsonaro para o Nordeste? Acha que o fato dos governadores (re)eleitos até agora não o apoiarem vai afetar?

A questão é que o Nordeste faz parte do Brasil, e com certeza a agenda econômica que ele apresenta é de destruição de instrumentos fundamentais para o desenvolvimento brasileiro. Por exemplo: a Petrobras, os bancos públicos; ele fala de privatizações, de fechamento de órgãos públicos. Para o Nordeste é muito ruim não ter o Banco do Nordeste, por exemplo. É um retrocesso gigantesco, diria de décadas. Assim como Banco do Nordeste, a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) também é para o desenvolvimento regional. Então essa agenda de menos serviço serviço, de menos estado, de privatizações, fechamento de empresas pública é contrária ao Brasil e contra o desenvolvimento. Ela atrapalha quem mais precisa. Para o desenvolvimento regional é uma tragédia.

O senhor vislumbra Bolsonaro presidente de bom lido com gestores e parlamentares?

Até aqui, considerando a trajetória política dele dessas décadas no Congresso, não é alguém que se notabiliza pela aglutinação e diálogo. É claro que em um eventual governo dele, é dever de todos os governadores --e eu vou cumprir esse dever-- dialogar com o governo federal. Claro que se essa for a decisão popular, da minha parte eu não me recuso ao diálogo. Agora o perfil dele não é muito animador, pelo contrário: ele tem sido um político de rompantes, mais de atitudes intempestivas, muito parecido com o Collor nesse sentido.

Muitos falam em risco a democracia com uma eventual eleição de Bolsonaro. O senhor vê esse risco?

Eu vejo riscos reais, infelizmente, porque quando você vê o que Bolsonaro fala, o que o vice dele fala, e você prospecta o nível de instabilidade que esse governo terá --de conflitos muito agudos, um governo de caos, periga até os democratas desse pais terem saudade de Michel Temer. Digo isso porque a agenda econômica que ele vai implantar --pelo que ele diz e pelo que o mago econômico dele (Paulo Guedes) diz-- vai rapidamente destruir a popularidade do governo, como a reforma da Previdência nos termos que eles dizem. Então, na medida em que popularidade desse hipotético governo cairia muito rapidamente, se amplia a instabilidade. E na medida em que amplia a instabilidade com esses personagens que são inconsequentes, que não medem as palavras e as atitudes, realmente é um risco agudo. São pessoas imprevisíveis e incontroláveis. Há uma ilusão da classe dominante brasileira de que Bolsonaro e Mourão vão entregar o país a esse Paulo Guedes, que vai fazer o quer o tempo todo e vão só ficar comendo churrasco. Isso é uma grande bobagem. Uma parte da elite brasileira está torcendo para entregar o poder do país a uma pessoa que não tem compromisso democrático, a uma pessoa intempestiva, imprudente, inconsequente como ele mostrou a vida inteira. Inclusive com riscos de conflitos graves entre brasileiros com a agenda econômica que ele propõe.

O senhor teme um governo autocrático?
Até aqui a atitude deles é profundamente autocrata. Portanto, não vejo de onde extrair otimismo desse hipotético governo.

Os Sarney tiveram mais uma derrota nas urnas e ficam fora do poder executivo e de Brasília depois de décadas. Inclusive, eles apoiam Bolsonaro. Como o senhor avalia a sua vitória e o futuro da família?

 

Eles estão muito enfraquecidos. Na verdade, eles sempre tiveram força local porque tiveram força nacional, aplicaram a cartilha do coronelismo com muita precisão, apoiaram todos os governos ferais desde [Juscelino] Kubitschek [1956-1961] para ter poder e hegemonia a política aqui no Maranhão. Na medida em que o espaço nacional deles hoje é zero, eles têm muita dificuldade de se posicionar. Roseana anunciar seu apoio ao Bolsonaro só vem a confirmar aquele que disse esses anos todos: a relação dela com o lulismo era oportunista. Quando aparentemente o lulismo pode ter uma derrota, ela é a primeira a pular do barco e se alinhar a um eventual novo governo. Só confirma que eles se alinham a qualquer governo, o negocio deles é se dar bem. Eles devem estar atrás de franjas de poder, de migalhas desse banquete, mas na conjuntura atual é muito difícil porque eles estão muito pouco a oferecer.

O PCdoB foi um dos partidos que não atingiu a cláusula de barreira e pode perder o fundo partidário. O que se planeja a partir de agora?

O PCdoB vai fazer o debate após segundo turno, já falamos inicialmente e vamos ver quais são as alternativas legais. Por exemplo: fusão com outros partidos. Esse é o caminho provável, de buscar articulação com outros partidos que permitam nossa bancada a funcionar lá na Câmara.

Por falar em partido, nessa eleição é comum ouvir o termo comunista como uma crítica a políticos e eleitores de esquerda...

[Risos] Isso é uma distorção histórica no Brasil em torno no sentido dessa palavra. Por conta dessas ditaduras que o pais teve, especialmente a de 1964, estigmatizou-se muito fortemente esse termo, e até deu uma força que os comunistas nunca tiveram. Qualquer pessoa que pensasse em termos de liberdade, como artistas, jornalistas, padres etc. eram classificados de comunista. Qualquer pessoa que incomodasse o regime dominante, os poderosos, era etiquetado como se fosse comunista, a encarnação do mal. É muito triste de um lado, e ridículo de outro, imaginar que um partido pequeno como o nosso é responsável pelos males da nação. Ao contrário disso, temos colaborado muito para essa nação avançasse. Isso é um retrato da nossa direita troglodita, militarista, saudosa da ditadura. Apenas isso.

Fonte: Uol

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